SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma mão imensa tenta pinçar os visitantes para suspendê-los na entrada da galeria Nara Roesler, na zona oeste de São Paulo. O cenário instagramável recebe as pessoas para a primeira exposição de JR na cidade com obras inéditas e também algumas das mais emblemáticas de sua carreira.
Do Egito ao Brasil, o artista francês ficou famoso pelas suas colagens monumentais em preto e branco, que desafiam a determinação dos espaços urbanos e costumam envolver a participação de locais em suas montagens.
O seu estúdio principal são as ruas, mas o homem que nunca tira o chapéu e os óculos escuros em público também leva obras de menor escala, desde os registros fotográficos de suas performances ao ar livre até colagens e litogravuras, às galerias pelo mundo.
Para citar destaques, uma impressão enorme no chão da Praça do Carrossel, em Paris, estimulou fantasias do que pode haver debaixo da pirâmide do Louvre. Já em frente à Ópera Nacional de Lviv, na Ucrânia, uma foto em grande escala da pequena Valeriie, refugiada ucraniana de apenas cinco anos, expõe os horrores da guerra e ganha a capa da revista Time.
Em 2017, o artista que prefere não revelar o seu nome real codirigiu o documentário "Visages Villages", fruto de uma viagem pela França rural ao lado de Agnès Varda, cineasta considerada mãe da nouvelle vague. O longa foi indicado ao Oscar e venceu o Olho de Ouro do Festival de Cannes.
Apesar do sucesso mundial o levar a, nas suas palavras, acordar todos os dias em um país diferente --como cita no documentário sobre sua jornada artística, "Paper and Glue", ou papel e cola--, JR quer homenagear, de alguma forma, sua origem enquanto artista, quando grafitava paredes pelo subúrbio parisiense.
Em suas novas obras, criadas especialmente para a exposição em São Paulo, há uma série de colagens de diferentes tamanhos utilizando fotos em preto e branco de sua própria mão.
"O grafite é também escrever seu nome nas paredes para dizer 'Eu estou aqui, eu existo'", diz JR à Folha, em entrevista na galeria, enquanto lembra do sentimento de urgência em deixar uma marca para atenuar a sensação de "não existir" em meio à enorme periferia da capital francesa.
Algo pouco comum em seus trabalhos, essas obras fazem referência à natureza para remeter ao primitivo, à origem. A ideia nasceu após uma visita à caverna de Chauvet, um dos sítios arqueológicos mais importantes do mundo.
Junto das pinturas rupestres, as marcas de mãos deixadas há cerca de 30 mil anos nas paredes da caverna relembraram ao francês o desejo de "deixar uma marca".
Foi assim que JR voltou ao seu estúdio e começou a reproduzir fotos de suas mãos, aplicando-as em pedaços de madeira de mesmo formato, para depois retirar o papel e deixar apenas a tinta na superfície. Esse método, segundo ele, garante diferentes texturas à impressão final, dando "vida à imagem".
Além das mãos, há a repetição de olhos de diferentes pessoas. Os olhos representam um laço importante do artista com o Brasil: em 2011, após o assassinato de três meninos da Favela da Providência pela polícia carioca, JR colou nos muros das casas da comunidade retratos dos olhos dos moradores.
A apresentação chamou a atenção pública para a violência enfrentada por quem vivia na região. "Eu estudei os olhos no Brasil. As casas eram pequenas para colar o rosto inteiro, então coloquei só os olhos. Vi ali como eles eram poderosos", lembra.
O novo trabalho parece refletir sobre o fazer do artista enquanto tentativa de retratar a vivência das pessoas e de suas realidades.
As camadas de olhos e mãos se sobrepõem, então, às camadas de prédios e gente da maior metrópole da América Latina, onde serão exibidas. O interesse pelo outro e a vontade de tornar atores do cotidiano protagonistas de suas próprias histórias se concretiza não só nas criações de JR, mas também na reação do público.
Essa, aliás, o ajudou a lidar com a efemeridade de suas obras ao ar livre. "Mesmo que as colagens desapareçam, elas permanecem na mente das pessoas. O poder da imagem para a mente é incrível", explica.
Ele lembra sua instalação no Louvre, "O Segredo da Grande Pirâmide", uma de suas obras mais emblemáticas e que está presente na nova exposição.
Quando a colagem começou a se despedaçar, as pessoas passaram a levar pedaços de papel para as suas casas. E, assim, o simples fato de a montagem ter ocorrido e ter sido vista já significou missão cumprida: "Para mim, a arte está no processo", conclui.
JR
Quando: Seg. a sex., das 10h às 19h; sáb., das 11h às 15h. Até 20 de maio
Onde: Galeria Nara Roesler - av. Europa, 655, São Paulo
Preço: Gratuito
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