SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - **Este texto contém spoilers importantes do episódio 3 da terceira temporada de "Succession"**
Raros são os personagens de ficção recentes que deixam marca tão forte no público quanto a do milionário boca-suja à frente de um conglomerado de mídia interpretado por Brian Cox na saga familiar "Succession". Após o episódio deste domingo (9), estamos todos órfãos de Logan Roy: desconcertados como Kerry, intrigados e temerosos como Tom, perdidos como Connor.
Ponto para o roteirista Jesse Armstrong, essa memória será encrustada de vez graças aos 40 minutos de angústia que passamos ao lado de Ken (Jeremy Strong), Rome (Kieran Culkin) e Shiv (Sarah Snook) tentando digerir a notícia, entregue sem nenhuma pompa ou possibilidades de ação.
Em uma série que nos apresenta roteiro e atuações de nível incomum, trata-se de uma das sequências mais geniais, esplêndida e vulgar a um tempo: jaz o magnata irascível, aquele que acabara de selar destinos alheios, entre a vida e a morte, após um mal súbito no banheiro minúsculo em pleno ar, sem nada que o ajude, nem médico, nem aparelhos, nem amor, nem bajulação, nem poder, nem conhecimento, nada.
A não ser uma triste massagem cardíaca, inócua, "porque a tripulação é obrigada a seguir o protocolo". Para uma série cujo pano de fundo é a vida dos ultrarricos à luz de certo exotismo, não deixa de ser uma ruptura e tanto.
Nós, espectadores, somos deixados no mesmo estado de abandono e incredulidade de seus filhos. Estes, mais uma vez, ficam obrigados a parar as próprias vidas sem pista do que fazer para atender ao pai, seu desejo maior. Como se, sem ele, qualquer gesto para comandar a empresa (e mesmo a empresa em si) fosse agora inútil, já que a validação paterna não pode mais ser conquistada.
É claro que em uma produção intitulada "Succession" é esperado que o patriarca morra, pois sem isso não há sucessão. Mas tão cedo?, perguntam-se fãs e comentaristas que pareciam esperar de Logan uma saída de cena digna de "Rei Lear": a morte do patriarca, sim, que afinal é pivô da trama, porém precedida pela de toda a prole.
A desordem que se põe em curso parece suficiente para segurar os sete episódios restantes, assim como o tamanho de seus coprotagonistas, os filhos. As interpretações de Strong, Culkin e Snook em seu recém-experimentado luto são assombrosas, nada menos que isso.
Ficam palpáveis em cada inspiração ofegante, cada tremer de mãos, cada palavra faltante, a ponto de nos jogarem no limbo familiar que são os Roy sem que haja pausa lógica, "mas essas pessoas não são reais", porque naquele momento elas são, e eis a grandeza dessas interpretações.
Se daqui por diante "Succession" for essa montanha-russa que foi o último episódio, nos quais os coadjuvantes (Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, Alan Ruck e J. Smith-Cameron principalmente) também competem por nossa atenção como competiam pelas graças de Logan, e na qual o roteiro não deixa sobrar uma frase, uma cena, uau, que série teremos visto.
Para isso, era preciso que Logan/Cox saísse de cena, com sua imensidão shakespeariana, com sua sombra que a todo mundo sorve. Os herdeiros (e os espectadores) esperaram 31 episódios por este momento, e ainda assim nada nos preparou para ele. Que roteiro.
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