Paula Medeiros Paula Medeiros 26/2/2011

Foco na transformação menina versus mulher garante intensidade para Bruna Surfistinha 

Tendo como fio condutor de todo o desenrolar da trama, o dilema de Raquel é o principal em Bruna Surfistinha. A própria Deborah Secco declarou em relação à história: "as pessoas não são o que querem ser, mas o que conseguem ser" e essa afirmação resume, de forma bem simples, a aura do filme. Ali está o retrato de situações limítrofes da pessoa/personagem, fundamentado pela transformação da menina jeca em uma "cobiçada" profissional do sexo.

Bruna Surfistinha, baseado na biografia (mais um diário) O Doce Veneno do Escorpião, conta a história de Raquel Pacheco (Deborah Secco), uma garota de classe média insatisfeita com sua família, com sua escola e com tudo mais que a rodeia. Como na transformação da lagarta em borboleta, ela abandona tudo para virar garota de programa. Na profissão, ela encontra a independência que tanto busca, mas para tal, paga um preço, às vezes, alto demais, por essa redenção.

Claro que Marcos Baldini iria acrescentar uma porção extra de fatalismo e vitimização à trama. Sem esses elementos, talvez ele não conseguisse atingir um grau de humanização e dor próximos à realidade da personagem. Muitas das cenas são incômodas de se ver, principalmente pela falta de conservadorismo adotada por Baldini. Aliás, essa ausência de pudor foi essencial para a criação desse desconforto latente imposto por Bruna Surfistinha.

É interessante notar também a aproximação criada entre personagem e espectador. É difícil atingir uma identificação tão afiada em uma história fadada ao preconceito. O filme consegue tirar um pouco do mito e mostrar que os anseios e dúvidas de Raquel são exatamente os mesmos de qualquer garota.

Fundamental para a execução do longa, Deborah Secco surpreende no papel. Com uma interpretação suave e forte ao mesmo tempo, ela conseguiu impor a dubiedade da menina que tem sentimentos, mas que precisa escondê-los o tempo todo. Seus vícios de interpretação – a atriz tem vários – foram minimizados ao máximo. É interessante notar a transformação pela qual a atriz também passa. O papel da menina grotesca nos tempos de escola, a sua ascensão à Lolita do bordel e a consolidação da profissional já experiente são uma sucessão de construções encaradas muito bem por Deborah.

Apesar de um final um pouco desnecessário, Bruna Surfistinha lidou bem com o desafio de assumir um roteiro tão complexo. Ali, não só uma história é contada. Sentimentos são colocados em xeque, medos são confrontados e limites são desafiados. Contudo, seu maior trunfo foi como a construção de uma pessoa em moldes pouco convencionais conseguiu atrair nosso olhar para realidades diferentes e, assim, nos tirar da nossa tão prezada zona de conforto.

Bruna Surfistinha
Brasil , 2010 - 109 minutos
Drama
Direção: Marcus Baldini
Roteiro: José de Carvalho, Homero Olivetto, Antônia Pellegrino
Elenco: Deborah Secco, Cássio Gabus Mendes, Drica Moraes, Guta Ruiz, Fabiula Nascimento, Cristina Lago

 



Paula Medeiros
é estudante de Comunicação Social com participação em Projetos Cinematográficos. 


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