Entrevista com a compositora e cantora Lucina
Daniela Aragão: Como começou a descoberta do som em sua vida?
Lucina: Eu não tive gênese nenhuma. Um dia, quando eu tinha oito anos de idade escutei tocar na rádio “Chega de Saudade”. Naquela época as rádios tinham um bom gosto danado. Fiquei louca por aquele som. Sabe quando você fica besta? E eu era muito criança. Cantar “te darei muitos beijinhos e carinhos sem ter fim” me deixava com uma espécie de vergonha, uma coisa. Aquilo me tocou muito.
Daniela Aragão: A letra e o som?
Lucina: Tudo. A letra e o som me tocaram de um jeito forte. Daí fiquei atormentada, eu queria tocar violão e efetivamente acabei ganhando um. Comecei então a tocar. Depois tive algumas aulas, mas fui desenvolvendo o violão sozinha.
Daniela Aragão: Então o João Gilberto foi o seu inaugural?
Lucina: João Gilberto abriu a minha percepção para um som que me cativou inteira e que me motivou a buscar sonoridades que abrissem um portal para eu ser feliz. E a música faz isso, em mim fez e faz. A voz de minha mãe era tão bonita que quando moça, mesmo sem ser profissional, foi convidada para cantar na rádio de Cuiabá. Segundo ela, eram músicas interpretadas por Carmem Miranda. Em casa eu vivia mergulhada numa sonosfera que ela criava, pois cantava lindamente o tempo todo. E era Tom Jobim rolando, Silvinha Telles, Maysa, Dolores, todas aquelas coisas lindas. Ao mesmo tempo eu voltava sempre para Cuiabá, pois sou de lá. Adorava aquelas rodas de música na fazenda. Eram sempre ritmos ternários, com violão, viola e acordeom. Músicas de fronteira.
Daniela Aragão: Interessante, pois o João Gilberto é uma espécie de norteador de todos. Você já entra de sola nele. Boa parte dos músicos começaram e quando ouviram o João Gilberto mudaram a direção.
Lucina: Eu não tive esse “quero fazer essa vida”. Eu quis tocar violão e aí fui tocando e eu cantava para me acompanhar. Eu não sabia que eu cantava direito, não tinha a menor ideia de que eu tinha algum dom ou sequer que eu fosse afinada. Eu não tinha nenhum sonho, desejo, expectativa de virar uma profissional. Imagina, eu era extremamente tímida. Então o violão foi o passaporte para a libertação de minha timidez. Peguei aquela época de festas, ou eram festas de dança, ou era reunião de todo mundo cantando, todo mundo tocando junto. Então comecei a ir para as festas e pediam que eu tocasse. Eu tocava a noite inteira, música do Chico, Edu Lobo. Um repertório de acordo com a época e que fazia a festa dos outros. Até o dia em que rolou o lance do Colégio São Paulo em que eu estudava. Lá eles tinham um auditório e de vez em quando promoviam alguns shows e lá comecei a me apresentar. Ali fui conhecendo pessoas até que rolou o “Grupo Manifesto”.
Daniela Aragão: Poderia falar um pouco sobre o Grupo Manifesto ?
Lucina: O Grupo Manifesto nasceu na minha casa no Leme, bairro carioca que concentrava uma turma de compositores iniciantes e muito bons. Nessa época, eu, Gracinha Leporace, que era uma das colegas do Colégio São Paulo, que também se apresentava nos shows e seu irmão Fernando Leporace, compositor e violonista, costumávamos nos encontrar para cantar. O Renato, meu vizinho, rapaz cheio de ideias. veio nos propor a montagem de uma peça de teatro e música. Ele convidou mais dois vizinhos: o Mariozinho Rocha e o Guto Graça Mello, que também compunham. Começamos a ensaiar e logo chegou o Augusto e em seguida o Amaury Tristão.
Os ensaios eram concorridos e havia uma moçada que assistia e vibrava. A essa altura, o Paulo Graça Mello assistiu ao ensaio e nos convidou para fazer um programa de TV.
Daniela Aragão: Você entra definitivamente na música a partir do Grupo Manifesto?
Lucina: O programa de televisão O MUNDO É NOSSO ganhou notoriedade. Lá, levantávamos a bandeira do resgate da MPB, que por conta da ditadura, já não havia espaço nas mídias e começava a ser delegada a um segundo plano pelas multinacionais. O curioso é que o programa era gravado ao vivo e tinha as portas abertas; possuíamos nosso roteiro e não sabíamos quem mais iria chegar. Então tivemos presenças do Quarteto em Cy, o MPB4, o Edu Lobo, Marcos Valle e muitos outros. Cantávamos música dos outros e autoral. Quando apareceu por lá a Elis Regina, quase desmaiamos! Ela se apaixonou pela música ʺManifestoʺ e a gravou. Assim nasceu o GRUPO MANIFESTO.
Quando a TV Continental fechou, a Tv Excelsior, que era o must do momento, nos contratou. O Taiguara tinha um programa lá, a Eliana Pitman, Elis Regina com “O fino da Bossa”. Mas a gente não se adaptou, pois nossa concepção era espontânea e amadora. E cativante por conta disso.
Foi quando o Gutemberg Guarabira apareceu chegado da Bahia e nos convidou para cantar com ele a música “Margarida” no Festival da Canção. E...Ganhamos! De súbito, virei profissional.
Daniela Aragão: A composição chegou então mais tarde.
Lucina: Eu nessa época não compunha ainda e nem sabia que tinha também essa capacidade.
Daniela Aragão: Era exigido de vocês uma performance cênica?
Lucina: Na Excelsior sim.
Daniela Aragão: Qual foi o saldo do grupo?
Lucina: Pra mim a coisa mais importante do grupo foi o contato com o Oscar Castro Neves. Ele foi contratado pela Philips para fazer os arranjos vocais do grupo para a gravação do LP. Com isso, a escola vocal que tive foi uma das mais maravilhosas desse mundo. Escola mesmo, aprendi tudo o que eu podia em relação a vocal.
Daniela Aragão: Ali então você passou a ter consciência de sua voz.
Lucina: Tomei consciência das minhas potencialidades. O “Grupo Manifesto” tinha acabado, mas a Philips quis ficar comigo como cantora. Fui contratada para gravar músicas de Festival, composições de Dori Caymmi e Nelson Motta, Durval Ferreira, cantei junto com Edu Lobo. Era a música popular brasileira de altíssima qualidade.
Um dia fiz um tema e o estava tocando no bastidor de um programa de televisão, quando se aproximou um cara e me perguntou: “Que música é essa? posso colocar uma letra?” Falei, pode e ele escreveu ali mesmo. Era o Luiz Vieira e por conta dessa parceria, acabei entrando no festival da Record. Eu não sabia que ele era tão famoso.
A primeira música que fiz foi uma parceria com a Joyce e a gravação desapareceu.Não consegui a recuperar.
Daniela Aragão: Vocês não tem registro ?
Lucina: Não.
Daniela Aragão: Vocês fizeram juntas letra e música?
Lucina: Joyce sempre foi toda organizada. Tinha a hora de compor, aí ela estava lá a postos (risadas). Era uma música bem legal, moderna mesmo. Nessa época, o Egberto Gismonti já tinha se tornado conhecido. Tinha composto “Sonho” e trazido outras sonoridades para a música, o que me inspirou.
Neste mesmo período começaram as reuniões na casa da Joyce.
Daniela Aragão: As famosas casas criativas rendem um bom livro. Desde a Casa da Tia Ciata, o apartamento da Nara, a casa do Cacaso, a da Joyce...
Lucina: Certamente. Tinham esses pólos todos. A música carioca toda naquele momento ia pra casa da Joyce. O Danilo Caymmi, Momento 4, formado por Zé Rodrix, David Tygel e Maurício Maestro. Todos eles viraram outros grupos vocais. Luiz Carlos Sá, o Milton, que tinha chegado das Minas Gerais, o Novelli, Nelsinho Angelo, a própria Nana, Paulinho Jobim. A gente ficava a noite inteira cantando. Sabíamos as músicas uns dos outros. Tinha também reunião na casa do Hélcio Milito, que era do Tamba Trio. Aconteciam também reuniões na casa do Luiz Eça, imagina a riqueza!
Daniela Aragão: Uma riqueza e diversidade consideráveis.
Lucina: O Tom Jobim, por causa do Paulinho que adorava reunir a moçada.
Daniela Aragão: O Paulinho gostava de levar para o outro andar da casa a turma.
Lucina: Exatamente. Imagina que tempo gostoso. Tempo das reuniões de som. Porém, durante o último festival da Record em 67 convivíamos já com o clima de arrocho da ditadura e nós todos estávamos envolvidos na resistência. Todo mundo ia pra passeata, contestávamos o sistema. Amigos foram presos, outros sumiram. Era perigoso se encontrar. O Ricardo Villas estava com a gente tocando, no dia seguinte fomos a uma reunião na casa dele falar sobre a situação política. Três dias depois prenderam o Ricardo, estouraram a casa dele. Ricardo voltou ao Brasil na troca pelo embaixador Elbric. Os anos de 67 e 68 arrebentaram com a gente. E a música nunca mais aconteceu no Rio de Janeiro em termos de encontro. Ficou cada um por si e Deus por todos.
Daniela Aragão: E como você prosseguiu a partir daí?
Lucina: No Festival da Record tive muito contato com o Rogério Duprat e Reginaldo Cavalero. Ele seguia numa linha do Duprat, era do Piauí e um arranjador maravilhoso. Ele escreveu o arranjo da minha música Cantoria. A banda que tocou comigo ʺO BANDOʺ era tão pesada que tinham duas bateras, guitarra,baixo, vocais, mas tudo com arranjos modernos que na realidade não combinavam muito com a música que era bonita, mas muito simples e que pedia flautas e acompanhamento leve como, aliás, foi a gravação com arranjo de Dori.
Fiz amizade com Gil, Caetano, o pessoal da Tropicália e fui acompanhando tudo dos bastidores.
Após o Festival fui contratada pra ser cantora da TV Record e me pagavam um salário para eu ficar à disposição. Até no programa do Roberto Carlos eu cantei.
Daniela Aragão: No filme Yorimatã você comenta que o fato de se recolher era também um ato político.
Lucina: Com certeza Daniela. Também cruzar os braços, não compactuar com a loucura do poder é atitude política.
Com toda essa vivência, tive uma crise muito grande, sem saber de fato quem eu era. Não sabia direito o que queria, me vi perdida nesse cenário todo. Resolvi parar de cantar. Voltei pro Rio, larguei tudo e voltei a estudar. Foi quando na faculdade bolamos um encontro de artes em que fui atrás dos compositores. Aí conheci a Luhli.
Daniela Aragão: Fale sobre o encontro com a Luhli.
Lucina: A gente teve um encontro impactante. Ela mostrou suas músicas e fiquei apaixonada. Então mostrei as minhas e num mês já tínhamos composto juntas vinte músicas. Tivemos uma empatia imensa e a partir daí começamos a cantar juntas. A Luhli era muito original e tinha algo muito interessante na composição. A gente se encontrou e nossa linguagem acoplou. A gente se permitiu ter de tudo na nossa música.
Aí, Luhli entrou no Festival da Canção com uma música dela que era “Flor Lilás” e seguimos.
Daniela Aragão: Como era a casa da Luhli em Santa Tereza?
Lucina: A casa da Luhli em Santa Tereza reunia também o pessoal do cinema por conta do Luiz Fernando: Paulinho Mendonça, Tânia Scher, Reginaldo Faria (que toca alaúde bem demais, além de violão clássico). Então a turma do cinema se juntava com a turma da música. Ah! E tinha o Ney, artesão que cantava lindo! E que se transformou no Ney Matogrosso, grande artista que mudou conceitos e quebrou barreiras comportamentais.
Daniela Aragão: Imagino que essa confluência de pensamentos artísticos te enriqueceu sobretudo no senso estético e plástico, veio possivelmente te dar uma noção maior da performance no palco por exemplo. Antes, no momento do Grupo Manifesto, não era a hora de você estar tão exposta diante dos holofotes da televisão. De repente você vai conviver com esse pessoal do universo da imagem. O cinema que lhe trouxe toda a capacidade de exploração das possibilidades performáticas. Toda a amplitude de sua expressividade corporal.
Lucina: Sim. Com certeza essa convivência me trouxe elementos cênicos e liberou minha atuação de palco.
Daniela Aragão: Apareceu nessa época também o Itamar Assunção?
Lucina: Não, Itamar chega depois já em 81 quando fomos para São Paulo, cantamos no “Lira Paulistana” e deu o maio pé. As portas se abriram e a cidade nos abraçou.
Daniela Aragão: Vocês trazem uma marca identitária muito forte, fora o passeio pela ancestralidade. O flertar com a música cigana, o experimentalismo expresso na linguagem contemporânea. De onde vem o ciganismo?
Lucina: A Luhli tem uma descendência de ciganos e também espanhola. O violão dela e a concepção dos baixos é única. O meu violão tem silêncios e muita corda solta e as melodias são complementares. Nosso som somou nossas influências pessoais.
Eu ainda garotona mergulhei no jazz. Adorava David Brubeck e estudava todas aquelas sonoridades. Depois parti para escutar muito erudito. Então fiz uma salada na minha cabeça: Beatles, Rolling Stones, Peter, Paul and Mary, The Animals, coisas incríveis de vocal.
A Luhli tinha muito conhecimento erudito, música do mundo e mandava bem no samba.
Daniela Aragão: Não tem um jogo racionalizado. É sentido e orgânico.
Lucina: É orgânico. Flora Purim foi assistir um show que fizemos juntas com orquestra à Base de Cordas, na oficinas de Curitiba. Ela estava na plateia e falou: “ O jeito como vocês constroem o vocal, faz parecer que são muitas pessoas cantando”. A gente ficou rindo e ficamos pensando até em fazer um workhop, mas sempre foi orgânico.
E foi pesquisando nossa própria maneira de criar e arranjar canções que fizemos nossa primeira Oficina de criatividade. Foi um sucesso e com o correr dos anos pesquisamos muito ritmos, sonoridades curativas e processos de composição. Fizemos das oficinas um caminho paralelo aos palcos. Me especializei nas frequências sonoras e caminhos do ritmo e a Luhli na composição, na fabricação dos tambores e no poder das pedras.
Daniela Aragão: Falamos da composição, das vozes, dos violões. E os tambores?
Lucina: Nos primeiros shows que fizemos no Projeto ʺMeia Noiteʺ, do Teatro Opinião eu gostava de tocar uns ritminhos, pegava um tambor e batucava.
Quando frequentamos um terreiro de Umbanda ficamos impactadas pela força dos tambores e os toques e pedimos pra tocar e assim aprendemos dentro do ritual. Um dia o dirigente da casa, o pai José falou : ʺ -é hora de vocês deitarem para Ogãʺ. Assim, fizemos as mãos para louvar os Orixás
Daniela Aragão: O que seria “deitar pra Ogã”?
Lucina : É um ritual de 3 dias de deitada, onde a gente tem as mãos preparadas pra tocar no ritual. Todo um percurso energético.
Daniela Aragão: Vocês tiveram a permissão para sair do contexto do ritual da umbanda para tocar nos palcos.
Lucina: Perguntamos se poderíamos levar os nossos tambores para o palco. “Pode, mas nunca se esqueçam de uma coisa, quando vocês tocam tambor a mão de vocês está virada para baixo, mas na realidade suas mãos vão estar sempre pra cima implorando”, conforme nosso mestre guia nos orientou.
Daniela Aragão: A pulsação rítmica é muito vigorosa. Suponho que o trabalho com os tambores modificou a sua existência e a da Luhli.
Lucina: É mais do que vigoroso. Eu tenho consciência absoluta do trabalho energético que eu faço. Os toques do tambor direcionam coletivamente o emocional das pessoas. É muito comum escutar aquela frase “parece que tomei um banho de cachoeira”. Esse feedback vinha e vem direto.
Daniela Aragão: O que Coltrane fez com a música dele era a elevação para as energias superiores. Ele alcançou através da sonoridade e vocês por meio dos tambores fizeram um trabalho de elevação espiritual.
Lucina: Sim, certamente. A partir do momento em que você tem essa consciência, você tem uma responsabilidade proporcional. É um ato que deve ser feito com seriedade. As pessoas que se sentem tocadas pela minha música, vibram na mesma frequência, são amigos em potencial.
Tenho grandes amigos que conheci após o show, gente que chegou pra conversar um papo tão gostoso que ao convite “Será que vocês tomam uma cerveja com a gente?” gerou uma amizade profunda que seguiu vida afora.
A minha música só chama quem tem tudo a ver. É corpo a corpo demais, não tem jeito.
Daniela Aragão: É corpo, mas há também um trabalho depuradíssimo com os versos, a palavra. Uma metalinguagem “ A vida da vida”. Uma ourivesaria poética o seu trabalho com a palavra. Há uma pulsação corporal, rítmica, melódica. Por isso certamente você se liga em parceiros preciosos no ofício da palavra como Alzira E e Alice Ruiz
Lucina: Tem uma poética muito forte, você está certíssima em sua percepção Daniela. Tenho grandes poetas parceiros e tive a honra e alegria de conviver com Luhli. Como morávamos em tribo, assim que nascia um tema, ela já vinha colocar rápido a letra. A produção da gente tem mais de mil músicas. Com os parceiros então eu tenho umas 1500 músicas.
Daniela Aragão: Uma característica que você não tem e que percebo nos que conheço de sua geração. A espetacularização, se colocar como estrela inatingível.
Lucina: Sim, porque eu confio no que a minha música diz. Não vou abraçar todo mundo, não é bem assim. Eu olho no olho e vejo, a abordagem das pessoas segue uma onda. Se é confortável, o mito se esvai e fica aquela força do encontro. Não tem distância.
Daniela Aragão: Como você vê o fato de ser mulher no mundo da música?
Lucina: Hoje já mudou consideravelmente. A criação da mulher é presente, forte e relevante como concepção, texto e melodia. Somos muitas e construímos nosso lugar.
Daniela Aragão: De 80 pra cá, você pega todo o momento de ruptura. Por exemplo, antes a mulher nem assumia sua própria voz no discurso. As letras evidenciam a ausência da fala da mulher que se escondia sob a voz masculina. A mulher era dita pelo homem, ou até mesmo silenciada.
Lucina: Com certeza. A mulher era a porta voz do homem/compositor e se sentiu com algum conforto dentro disso. A própria mulher teve dificuldades em autorar seu pensamento, sua opinião sobre o mundo ou sentimentos. Muito lá atrás, na pesquisa da historiadora Carô Murguel sobre as compositoras brasileiras, é absurda a quantidade de músicas que a mulher não assinava. Muitas vezes ocultava-se a autoria feminina.
Daniela Aragão: A música de instrumentistas ainda é um universo em que predomina a engenharia masculina. A maior parte das mulheres se concentra no canto, enquanto os homens estão nos instrumentos. Você e Luhli adentraram com força numa época nada fácil e ousaram um disco independente.
Lucina: Quanto a engenharia masculina, realmente eles são excelentes músicos. Mas, como diz Luiz Tatit ¨a Canção brasileira é riquíssima, chega fluida e nasce da palavra.¨
Nós tínhamos uma expressão definida e simplesmente fizemos aquilo que queríamos. A produção independente no Brasil abriu passagem para uma música mais orgânica e diversificada. E abrimos os acessos para os meios de produção. Antes, os artistas nem imaginavam que seria possível um álbum auto-produzido.
Daniela Aragão: Todo esse envoltório fez parte do cenário o qual Elis Regina viveu.
Lucina: Elis foi uma cantora maravilhosa com personalidade forte e conseguiu dobrar
os diretores de gravadora, sendo artista de grande mídia, conquistou com seu prestígio o poder de gravar só o que ela queria.E ela corria atrás, queria o novo e assim lançou e revelou dezenas de compositores, a prova viva de que essa tal linguagem do sucesso é a coisa de manipulação e jabá.
Daniela Aragão: Você não deve nada as artimanhas e armadilhas do sucesso.
Lucina: Jamais. Eu fico completamente livre com uma música atemporal. Tem música que fiz há quarenta anos e ela soa fresca. Não é datada, os arranjos não são limitados a uma época. O arranjo mostra muito de que época você fez a música. Meus arranjos não se amarram, são livres. Minha música não tem rabo preso, sem rabo preso você faz o que quer. A imposição de ter que ser sucesso é muito chata.
Daniela Aragão: O que é a música para a sua vida?
Lucina: Vou te contar uma história engraçada. A AlziraE, minha parceira é muito figura. Ela me disse “Lucina, estou pensando porque é que eu gosto dos meus amigos, qual é a qualidade que me faz gostar dos meus amigos. ¨
Eu perguntei: e de mim, vc sabe?
Gosto de você pelo seu amor pela música”.
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