CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - A busca por limites saudáveis no trabalho vem sendo chamada de quiet quitting, termo em inglês que significa demissão silenciosa. Ao contrário do que o nome sugere, trabalhadores que defendem a tendência não querem ser demitidos, mas desejam equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
Para que a imposição de limites não comprometa o emprego ou a própria saúde mental do trabalhador, especialistas recomendam cuidado com a forma de comunicá-los e de se relacionar com a organização.
Leonardo Berto, gerente da operação da empresa de consultoria em recursos humanos Robert Half no ABC e Baixada Santista, explica que o trabalhador deve ponderar o ambiente, o momento e a estrutura da empresa para verificar a melhor forma de estabelecer fronteiras.
"Às vezes [o problema] não é nem o fato de eu querer ter um limite, mas a forma como eu comunico isso, e o desprendimento ou o comprometimento que vou mostrar nas relações do dia a dia", explica.
Entender a cultura organizacional, incluindo demandas, necessidades e formas de mensurar resultados na empresa pode ajudar a saber quando e como agir para manter o equilíbrio, assim como em que momentos e de que forma podem haver mais barreiras.
Enquanto limites podem ser benéficos e combater o adoecimento, em excesso podem se traduzir em perda de sentido e engajamento com as atividades.
Sergio Guimarães, psicólogo e professor universitário na área de saúde mental no trabalho, diz que é importante manter um nível de engajamento saudável com o emprego, sem deixar de ver nele algum sentido.
"Uma vez que o sujeito está ali puramente para cumprir protocolo, perde sentido das suas funções laborais e está ali só para cumprir tabela, isso pode ter um horizonte de adoecimento."
Guimarães diz que isso pode levar a uma performance robótica, sem envolvimento subjetivo e sem laços de confiança e de cooperação, aumentando o risco de desenvolver processos patológicos como a síndrome de Burnout.
O psicólogo também destaca que a ideia do quiet quitting não pode ser generalizada, pois nem todos têm condições de adotá-la. "Sem dúvida, em categorias profissionais de trabalho mais precarizado é sempre mais difícil colocar limite. Então essa questão do quiet quitting também fica um pouco comprometida."
TERMO É CRITICADO POR ADEPTOS DA TENDÊNCIA
A gerente de projetos Bianca Rati diz que há quem associe o quiet quitting com apatia ou corpo mole, o que não condiz com a realidade. Ela relata que tenta priorizar sua saúde física e mental, tirando tempo para si, mas que isso não significa não se dedicar às funções.
"Eu dou meu melhor no trabalho, busco soluções, trago ideias, estudo e procuro criar um bom ambiente para todos."
Para ela, o quiet quitting é sobre impor limites no trabalho, e neste sentido a gerente de projetos se considera adepta da tendência. "Não é necessariamente não fazer horas extras, mas é exigir ser compensado de modo justo por elas, ou que não seja algo tão frequente que você não tem mais vida pessoal."
"Quando eu entendi que o meu valor enquanto pessoa não está associado única e exclusivamente ao meu rendimento no trabalho e passei a dedicar tempo de qualidade a outras áreas da vida, me tornei um ser humano mais feliz, uma gestora mais empática e também uma funcionária melhor", conclui.
Empresas tradicionais se adaptam com maior facilidade O quiet quitting acontece em meio a número recorde de demissões e alta nas taxas de Burnout, o que vem sendo associado a efeitos da pandemia. Para alguns, o trabalho remoto diluiu os limites entre casa e trabalho; para outros, piorou as condições trabalhistas.
Mas Berto diz que, apesar de ser um termo recente, a busca por limites entre trabalho e vida pessoal já era frequente nas empresas. Lugares tradicionais com processos bem delimitados têm maior facilidade em se adaptar, sendo que alguns até desejam profissionais com este perfil, como nas áreas fiscal e de atendimento ao cliente, segundo o especialista.
Mas há locais com maior dificuldade em atender a esta demanda. "Se estou em uma startup que está triplicando de tamanho todo mês, é natural que essas barreiras possam sofrer alguma dificuldade de ser respeitadas, porque a demanda está crescendo todo dia e não necessariamente conseguimos contratar gente na mesma velocidade", diz Berto.
O especialista diz que ter diferentes perfis e formas de trabalho deve ser cada vez mais comum dentro das organizações.
"O que a gente enxerga é mais uma tendência onde o colaborador está trazendo uma necessidade e as empresas estão buscando se adequar, embora no mercado não sejam tão simples essas adaptações."
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