Disciplina fiscal e estabilidade institucional vão ditar fluxo para o Brasil em 2023, diz gestor
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Ao longo dos últimos meses, o mercado brasileiro acabou sendo beneficiado por um ingresso de estrangeiros que foi motivado não tanto por méritos do país, mas por uma atratividade relativa maior em comparação aos pares, com a invasão russa à Ucrânia e a desaceleração econômica na China.
A avaliação é de Eduardo Figueiredo, diretor de investimento da gestora global abrdn, com cerca de US$ 469 bilhões (R$ 2,4 trilhões) em ativos sob gestão.
Ele afirma que a disciplina fiscal a partir de 2023, e a estabilidade institucional, estão entre os principais aspectos no radar dos estrangeiros que irão ditar os fluxos de capital direcionados à região.
"Os atores já são conhecidos, mas os personagens ainda não. O que quero dizer é que os investidores já lidaram com os dois candidatos à frente nas pesquisas. Mas a postura que eles vão adotar ainda é uma incógnita", afirma Figueiredo.
Segundo ele, os estrangeiros ainda veem os ativos brasileiros ainda como muito descontados. A esse atrativo se soma as dúvidas de muitos investidores em investir na Ásia em razão do cenário chinês.
"O Brasil é um mercado grande, líquido, em que você consegue expressar bem uma visão mais positiva a setores cíclicos, como commodities e energia. Claro que, conforme as eleições ficam mais próximas, elas se tornam mais importantes e começam a entrar no radar. Mas, frente aos níveis de valuation em que a Bolsa estava, tinha um prêmio de risco muito grande que, no final do dia, justificava esse movimento de entrada dos estrangeiros", afirma.
Eleições
Os fatores que o investidor estrangeiro vai monitorar para decidir se vai fazer uma alocação mais estrutural no Brasil são os mesmos, independente do candidato, até porque os atores já são conhecidos, mas os personagens ainda não. O que quero dizer é que os investidores já lidaram com os dois candidatos à frente nas pesquisas. Mas a postura que eles vão adotar, tanto em um cenário de reeleição, ou de volta do ex-presidente Lula, ainda é uma incógnita. À medida que essas dúvidas forem ficando mais claras nas vésperas e nas pós-eleições, então os investidores vão poder tomar uma posição um pouco mais clara.
Focos de atenção de estrangeiros
Uma disciplina fiscal é super importante para se ter uma visão mais clara de qual a taxa de desconto justa para o país, tendo em vista a saúde das finanças públicas.
Haver respeito aos contratos com o setor privado e estabilidade no ambiente regulatório vai ditar a atratividade de alguns setores, como as estatais, as empresas de infraestrutura, de utilidades públicas, como na área de saneamento. A estabilidade institucional, do ponto de vista da confiança nas instituições, e a percepção de respeito ao compliance com relação à corrupção, são aspectos também muito importantes.
É isso que vai ditar quanto desse capital que vimos entrando nos últimos meses vai se tornar permanente, e até atrair uma alocação mais estrutural dos investidores estrangeiros. Mesmo porque, o que a gente viu de fluxo para o Brasil neste ano não foi necessariamente mérito do Brasil, foi mais um mérito relativo, pela posição que o país se colocava em termos relativos versus os pares.
Apostas da abrdn
Dado o ambiente que a gente tem de incerteza em relação ao cenário econômico, e também eleitoral e político, a gente prefere ter empresas de setores domésticos que dependem muito pouco de regulação e mesmo dos ciclos econômicos, como, por exemplo, a RaiaDrogasil. É um negócio de qualidade, com potencial de crescimento independentemente do que acontecer com a economia no médio prazo.
Também temos a Totvs, que atua no segmento de softwares para pequenas e médias empresas e tem um espaço muito grande de expansão, com aumento da participação de mercado e consolidação no setor, sem precisar necessariamente de um ciclo de mercado a favor.
Gostamos também dos bancos brasileiros, que consideramos que estão com os valuations muito descontados e são relativamente resilientes, principalmente o Bradesco. No segmento de infraestrutura, gostamos de empresas como a Rumo, que se beneficia de ciclos mais longos de investimento na economia e da demanda por commodities.
Desde o início do ano temos privilegiado empresas com capacidade de repassar preços e com maior proteção inflacionária. É o caso de empresas como a Arezzo, que atua no segmento de consumo focada na alta renda, ou da Multiplan, no setor de shoppings, que vemos com valuations atrativos e que proporciona um posicionamento mais defensivo em relação ao cenário econômico.
Raio-X | Eduardo Figueiredo, 36 anos
Eduardo Figueiredo é diretor de investimentos e responsável pela área de análise de ações da abrdn no Brasil, onde está desde 2011. Antes atuou por cinco anos na Mauá Investimentos, como gestor e analista de renda variável. Ele é formado em admnistração de empresas pela FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado).