BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O relator-geral do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), disse nesta quinta-feira (10) que a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição vai retirar as despesas com o Auxílio Brasil (que voltará a se chamar Bolsa Família) do alcance do teto de gastos -regra fiscal que limita o avanço das despesas à variação inflação.
A mudança, segundo ele, seria permanente. "A ideia é que seja permanente, que haja compromisso da sociedade brasileira com os mais carentes, mais pobres, que eles possam sentir que haja segurança, e que estejam excepcionalizados para sempre esses recursos", disse o senador após reunião sobre o tema na residência oficial do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), que coordena a equipe de transição do novo governo, e o senador eleito Wellington Dias (PT-PI), negociador do Orçamento, também participaram das conversas. O grupo também se reuniu com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
O anúncio ocorre após o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticar o teto de gastos, regra fiscal que limita o crescimento das despesas à inflação, e defender um "novo paradigma" que permita o foco no social, como pregado em sua campanha.
"Por que pessoas são levadas a sofrer para garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que toda hora as pessoas dizem que é preciso cortar gasto, que é preciso fazer superávit, que é preciso ter teto de gastos?", disse em discurso no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), sede do governo de transição. "Por que a gente não estabelece um novo paradigma?", questionou.
As falas do petista foram mal recebidas no mercado financeiro, que teme um descontrole das contas públicas e do endividamento na esteira do aumento das despesas. O vice eleito reagiu a essas críticas. "Se há alguém que teve responsabilidade fiscal, foi o governo Lula", afirmou Alckmin.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a ideia de retirar toda a despesa com Bolsa Família do teto de gastos já vinha ganhando força nos últimos dias. A mudança deixaria uma despesa de R$ 175 bilhões fora do teto, enquanto os R$ 105,7 bilhões atualmente reservados para o programa social seriam redistribuídos a outras áreas que correm risco de apagão.
O texto da PEC precisa ser apresentado logo para que possa começar a tramitar. É a partir dele que serão feitas as modificações na proposta de Orçamento de 2023. A proposta precisa estar pelo menos protocolada para que Castro possa incorporar mais despesas em seu relatório, ainda que elas fiquem condicionadas à aprovação da mudança constitucional.
A PEC da Transição é considerada necessária para garantir a continuidade do benefício mínimo de R$ 600 do Bolsa Família a partir de janeiro. A despesa para assegurar esse valor chega a R$ 157 bilhões. O PT também promete uma parcela extra de R$ 150 por criança de até seis anos no programa social, ao custo de R$ 18 bilhões.
Membros do novo governo preferem uma retirada permanente das despesas com o Bolsa Família do teto de gastos. Eles chegaram a ser alertados por integrantes da CMO (Comissão Mista de Orçamento) sobre o risco. A sugestão do colegiado foi limitar a medida a um prazo de até quatro anos.
Castro buscou minimizar os temores e disse que a aprovação da proposta não significará um "cheque em branco" para o novo governo. "Para que não haja nenhuma dúvida de que possa ser um cheque em branco para gastar com o que o governo quiser. Lá vai estar especificado claramente, tantos bilhões, por exemplo, para Farmácia Popular, saúde indígena, merenda escolar, Minha Casa, Minha Vida", disse.
"Houve boa receptividade de todos os líderes. De hoje para amanhã a equipe volta a falar comigo para apresentar oficialmente, me entregar o texto da PEC dizendo quais são as rubricas que estarão excepcionalizadas e o valor de cada uma", afirmou.
O relator do Orçamento disse ainda que está em discussão a possibilidade de permitir despesas fora do teto de gastos, desde que bancados com receitas extraordinárias -ou seja, acima das previstas. Ele citou como exemplo a arrecadação com bônus de leilões de petróleo. A despesa seria bancada por meio de crédito extraordinário, num montante limitado a 2% da RCL (receita corrente líquida).
"[Os 2%] Seriam permanentes também, pelo menos é o que estou entendendo. Tem que ver como isso virá escrito na PEC. Gastar até 2% da receita corrente líquida", disse Castro.
Mais cedo, Wellington Dias confirmou a discussão sobre tirar do teto uma parcela de gastos bancada com receitas extras, mas disse que essa é uma sugestão da Câmara e do Senado.
"Essa proposta não foi da equipe de transição, surgiu na Câmara e no Senado. Pedimos um esforço sobre destinação de emendas, para uma parte significativa ser priorizada como 'emendas para investimentos', para ajudar a integrar e ampliar investimentos privados, com melhores resultados na economia social e fiscal", afirmou.
Segundo o senador eleito, o novo governo quer chegar a um patamar de 1% do PIB (Produto Interno Bruno) em investimentos públicos já no primeiro ano de administração. Isso significaria um montante de cerca R$ 100 bilhões já na proposta de Orçamento de 2023.
Dias disse que a medida é "factível". Hoje, o Orçamento já reserva cerca de R$ 22 bilhões para obras públicas e demais investimentos.
Segundo o senador eleito, a ideia é negociar com os parlamentares a destinação de outros R$ 20 bilhões a partir das emendas -individuais, de bancada e de relator. Ao todo, as emendas somam R$ 38,8 bilhões, ou seja, se a articulação prosperar, isso consumiria metade dessas verbas.
O restante seria viabilizado por meio do espaço de R$ 105 bilhões aberto no teto de gastos por meio da PEC da Transição
A PEC deve começar a tramitar pelo Senado, onde o rito de votação de uma alteração constitucional é mais simples. Mesmo assim, o texto não irá direto ao plenário. Ele passará primeiro pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), informou Wellington Dias.
Castro é cotado para ser o relator da PEC, uma vez que ele também é o relator-geral do Orçamento de 2023. A acumulação das duas relatorias facilitaria as negociações.
Mais cedo, Castro disse que o trâmite no Senado é mais célere para a aprovação da PEC da Transição. Na Câmara, segundo ele, o texto aprovado pelos senadores seria apensado à PEC 24, que tem a deputada Tabata Amaral (PSB-SP) como relatora. A medida ajuda a ganhar velocidade, já que o trâmite normal exigiria apreciação pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e pela comissão especial.
A proposta, de autoria da deputada Luisa Canziani (PTB-PR), propõe aumentar a autonomia financeira das instituições federais de ensino, retirando as despesas delas do alcance do teto de gastos.
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