SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Ao longo do ano passado e também durante os primeiros meses de 2023, uma categoria de investimento ainda pouco conhecida no mercado brasileiro começou a cair no gosto dos investidores.

Os fundos de investimento em infraestrutura (FI-Infra), que investem nas debêntures incentivadas de infraestrutura, viram o número de cotistas mais que triplicar desde o final de 2021.

Dados da plataforma TC/Economatica apontam que, em dezembro de 2021, a classe dos FI-Infra somava cerca de 26,6 mil cotistas, número que subiu para 81,5 mil em março de 2023, um aumento de cerca de 206% no intervalo.

Na mesma base de comparação, o patrimônio gerido por esses fundos avançou 20%, passando de R$ 4,85 bilhões para 5,79 bilhões.

Tendo suas cotas negociados na Bolsa de Valores assim como uma ação ou um fundo imobiliário, os fundos de infraestrutura têm a vantagem de oferecer à pessoa física a isenção tributária tanto sobre os rendimentos distribuídos periodicamente como também sobre o ganho de capital, no caso de o investidor vender o fundo por um valor mais alto do que ele comprou.

As debêntures incentivadas são títulos privados de renda fixa isentos de IR (Imposto de Renda), emitidos por empresas para financiar grandes obras de infraestrutura em setores como energia elétrica, transportes e saneamento.

Para despertar o interesse dos investidores, as debêntures precisam oferecer uma remuneração superior às taxas dos títulos públicos emitidos pelo governo, que hoje pagam um juro real acima de 6% ao ano, no caso dos papéis indexados à inflação.

Segundo Victor Tâmega, gestor de crédito e renda fixa da Rio Bravo Investimentos, tem sido possível encontrar no mercado debêntures incentivadas indexadas ao IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) com taxas que variam entre 7% e 10% ao ano, a depender do risco da empresa emissora dos títulos e de cada projeto.

A Rio Bravo lançou em junho de 2022 o fundo de infraestrutura RBIF11, que na sexta-feira (17) era negociado a R$ 99 na Bolsa. O fundo tem patrimônio de cerca de R$ 30 milhões, com uma taxa média de retorno de IPCA mais 8,25% ao ano.

O fundo da Rio Bravo, que cobra uma taxa de administração de 0,80% ao ano, tem a classificação IS (investimento sustentável) da Anbima, com o mandato de investir em projetos verdes, como parques eólicos e de geração solar.

O fundo detém ainda uma participação marginal, em torno de 1% da carteira, em debêntures da Light. A avaliação da Rio Bravo é que o mercado teve uma reação exagerada em relação à companhia, talvez por que o caso Americanas ainda esteja muito recente na cabeça dos investidores.

"O setor de infraestrutura vai continuar pujante, como já tem sido nos últimos anos. Vários projetos que foram leiloados nos anos anteriores devem vir a mercado", afirma Tâmega.

Mais recentemente, no último dia 14, o governo paulista realizou o leilão do trecho norte do Rodoanel, vencido pela gestora Starboard.

Entre 2021 e 2022, leilões de portos, aeroportos e rodovias também foram realizados, com investimentos contratados para a realização das obras de algumas dezenas de bilhões de reais, estimam gestores do mercado.

Questionado sobre a previsão de investimentos contratados com base nos últimos leilões realizados, o ministério da Infraestrutura não retornou até a publicação da reportagem.

Gestoras lançam novos fundos indexados ao CDI Além de atrair cada vez mais investidores, a categoria dos fundos de infraestrutura também começa a atrair gestoras interessadas em lançar novos fundos.

Hoje são 12 os fundos de infraestrutura listados na B3, sendo um dos mais recentes o SNID11, da Suno Asset, lançado em fevereiro de 2023, com R$ 35 milhões de patrimônio e taxa de administração de 0,95% ao ano. Na sexta-feira (17), o fundo era cotado a R$ 100,75 na B3.

Diretor de investimentos da Suno Asset, Vitor Duarte afirma que, em vez de ter como indexador o IPCA, o novo fundo trará uma novidade para a categoria, adotando como índice de referência o CDI.

Como as debêntures incentivadas são emitidas tendo como indexador o índice de preços, a Suno Asset vai comprar os papéis, e, por meio de contratos de derivativos negociados na B3, alterar o benchmark para o CDI.

Segundo Duarte, a decisão decorre do fato de o CDI ter, historicamente, uma volatilidade menor que a do IPCA. "Com isso, a estratégia resultará em uma distribuição de proventos também mais estável, sem sobressaltos de um mês para o outro", diz o especialista. A meta de retorno do fundo será de CDI mais 2% ao ano.

A gestora Sparta Fundos de Investimento, por sua vez, que já conta com um fundo de infraestrutura dedicado às debêntures incentivadas indexadas à inflação desde dezembro de 2021, o JURO11, também lançou em fevereiro um fundo que terá o CDI como índice de referência.

O novo fundo da Sparta, o CDII11, soma cerca de R$ 30 milhões de patrimônio e tem taxa de administração de 1% ao ano. A meta de retorno também será de CDI mais 2% ao ano.

Analista da Sparta, Caio Palma também diz que a volatilidade mais baixa do CDI em comparação ao IPCA foi a principal motivação que levou a gestora a optar pelo lançamento do novo fundo. "Recebemos demanda de uma série de investidores por um fundo indexado ao CDI."

Palma diz que o fundo já foi listado na Bolsa, mas ainda precisa cumprir um prazo 90 dias para começar a ser negociado por causa de regras estabelecidas pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), o que deve ocorrer em meados de maio.

O analista da Sparta diz que o momento é bastante atrativo em termos de remuneração para os gestores investirem em títulos privados, seja pela alta recente dos juros pelo BC (Banco Central), seja pelos problemas envolvendo empresas como Americanas e Light.

Isso porque, com uma série de investidores buscando se desfazer dos títulos de crédito no mercado ao mesmo tempo, eles precisam vender os papéis com uma taxa de retorno mais alta do que a média recente para conseguir encontrar compradores, afirma Palma, que aponta o juro real em torno de 8% ao ano das debêntures como uma boa oportunidade para travar um ganho expressivo em uma janela de longo prazo, uma vez que são papéis que costumam ter prazo de vencimento acima de 10 anos.

"Estamos vendo um pipeline bem grande de infraestrutura pela frente. Tivemos leilões nos anos passados de portos, rodovias, transmissão de energia, e provavelmente vamos ter uma quantidade relevante de ofertas", afirma o analista da Sparta, que cita Equatorial e Energisa entre as emissoras que tiveram títulos adquiridos recentemente pelo fundo.

Duarte, da Suno Asset, acrescenta que, pelas regras dos FI-Infra, os fundos têm um prazo de até 180 dias para alcançar uma exposição de dois terços da carteira em debêntures incentivadas, com o terço restante livre para investir em outros títulos de renda fixa. Após dois anos, esse espaço para ativos que não sejam debêntures incentivadas cai para 15%.

Até lá, os gestores têm liberdade para investir em títulos de renda fixa que não necessariamente são debêntures incentivadas. Por isso, afirma Duarte, os primeiros 12 investimentos realizados pelo SNID11 até aqui foram em debêntures convencionais, que costumam oferecer uma taxa de retorno mais alta do que as incentivadas.

Debêntures de empresas como das locadoras de veículos Localiza e Movida, da empresa de saneamento Aegea e da 3R Petroleum, de óleo e gás, foram adquiridas pelo fundo com uma taxa de juro real em torno de 8% além da inflação. "Gostamos da diversificação, e quero ter o máximo possível de setores na carteira."

Financiamento do Rodoanel desperta interesse dos gestores O trecho norte do Rodoanel, última etapa do anel viário que circunda São Paulo que foi leiloado no último dia 14, é um negócio que, caso venha a buscar financiamento no mercado via títulos de dívida, tende a despertar grande interesse no mercado.

Tanto o gestor da Rio Bravo como o da Suno afirmam que, se chegarem ao mercado debêntures incentivadas para financiar a conclusão das obras do trecho Norte do Rodoanel, eles devem investir nos títulos.

"Sem dúvida desperta interesse. As obras estão em uma região com um tráfego de veículos bastante conhecido e resiliente, e que tem uma pujança econômica forte no estado de São Paulo", diz Tâmega, da Rio Bravo.

Ele acrescenta que, frente ao nível de investimento necessário para concluir a última etapa do anel viário, de R$ 3,4 bilhões, "muito provavelmente" nos próximos meses emissões cheguem ao mercado para financiar parte do projeto. "Mas, para termos interesse, é muito importante avaliar os aspectos ambientais, se todas as licenças serão emitidas."

Na mesma linha, Duarte, da Suno Asset, também diz que teria interesse na emimssão de títulos de dívida relacionados à construção do Rodoanel. "Com certeza despertaria o interesse. Estamos falando de uma obra viária na principal cidade do estado com o maior PIB do país, que deve ter um fluxo de veículos muito grande", diz o diretor de investimentos da gestora.


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