BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A secretária de Comércio da Espanha, Xiana Méndez, defendeu à Folha de S.Paulo que eventuais preocupações sobre sustentabilidade, no âmbito do acordo comercial da União Europeia com o Mercosul, não podem "servir como desculpa para uma atitude protecionista".
Ela também disse que o protocolo adicional sobre sustentabilidade atualmente em negociação entre as duas partes "não tem uma base protecionista".
Méndez, que tem um cargo equivalente ao de vice-ministra, realizou viagem de trabalho ao Brasil nesta semana e participou de encontros empresariais e reuniões com autoridades do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Na União Europeia temos muito claro que o objetivo [do acordo] é cooperar para mitigar os efeitos adversos sobre meio ambiente; que as mudanças climáticas são um desafio global que necessita soluções globais baseadas na cooperação; e também está claro para nós que essa proteção [ambiental] não pode servir como desculpa para uma atitude protecionista, no sentido de evitar o desenvolvimento econômico da nossa contraparte. O objetivo fundamental de qualquer acordo comercial é compartilhar a prosperidade", disse a secretária espanhola.
O acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul foi fechado em junho de 2019, no início do governo Jair Bolsonaro (PL). À época do anúncio, foi estimado pela equipe econômica que o acordo representaria um incremento de US$ 87,5 bilhões em 15 anos para o PIB brasileiro, podendo chegar a US$ 125 bilhões.
Apesar de as partes terem chegado a um entendimento político, a tramitação do acordo pouco avançou desde 2019. A principal razão foi a retórica antiambiental de Bolsonaro e os índices de desmatamento na Amazônia, que levaram governos europeus a considerarem politicamente inviável prosseguir com o tratado naquele momento.
Agora, Méndez vê as objeções relacionadas ao meio ambiente como tema superado.
"Não temos nenhuma dúvida do compromisso do atual governo [com meio ambiente], assim como não temos nenhuma dúvida de que a legislação ambiental brasileira é rigorosa", afirmou.
Ela enxerga ainda uma "janela de oportunidade" para fazer o acordo avançar com a presidência rotativa da Espanha no Conselho da União Europeia no segundo semestre. Também acredita que é possível concluir as negociações sobre o protocolo adicional de sustentabilidade em julho, com a meta de assiná-lo na cúpula da União Europeia e da Celac (Comunidade de Estados da América Latina e do Caribe) em Bruxelas.
Caso isso aconteça, ela prevê que os Executivos da União Europeia e dos quatro países do Mercosul podem assinar o acordo comercial no fim deste ano -o que enviaria o texto para referendo nos respectivos parlamentos.
Sobre o protocolo adicional atualmente em negociação, ela diz que o objetivo do texto em elaboração é garantir o cumprimento de compromissos internacionais como o Acordo de Paris e normas da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Méndez rechaça que esse protocolo adicional reabra temas já negociados no capítulo de sustentabilidade do próprio acordo UE-Mercosul.
"Tendo em conta que o acordo tem como consequência um crescimento da atividade industrial e agrícola, é legítimo que o texto tenha todos os mecanismos de cooperação e de informação cruzada para poder mitigar qualquer potencial efeito adverso que possa ocorrer. E mesmo no caso de que algum efeito adverso ocorra relacionado à essa expansão econômica, é importante que tenhamos os mecanismos para poder cooperar e mitigar os efeitos sobre o meio ambiente e sobre os padrões trabalhistas".
Dentro da UE, a Espanha sempre foi um dos países que mais defendeu o acordo. As resistências, por sua vez, são encabeçadas pela França, a segunda maior economia do bloco europeu.
"A Espanha é uma forte defensora desse acordo e nós nunca consideramos que ele possa não ser assinado. Sempre pensamos no quando e como, mas com a certeza de que esse acordo em algum momento será uma realidade. É certo que uma janela de oportunidade foi aberta. Primeiro, pelo compromisso do atual presidente do Brasil com a proteção do meio ambiente. E, em segundo lugar, porque a presidência espanhola no Conselho da União Europeia pode ajudar a colocar a América Latina na agenda da UE no segundo semestre, com o objetivo de avançar de forma definitiva todos os acordos comerciais que estão pendentes com a região: além do Mercosul, o do Chile e também o do México", complementou.
A autoridade do governo da Espanha também avaliou que é muito difícil reabrir pontos já negociados do acordo, uma vez que ele é fruto de conversas que envolvem e afetam 31 países.
"É complicado porque [o acordo] é um produto fruto da concertação de muitas vontades e portanto precisamos ter em conta que a intenção de um estado de modificar algo pode reabrir completamente o debate".
O documento firmado em 2019 prevê que mais de 90% das exportações do Mercosul terão tarifas zeradas em até dez anos. O restante das exportações terá reduções parciais das tarifas atualmente impostas pela União Europeia, com cotas de importação.
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