BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Quase um ano após as denúncias contra o ex-presidente da Caixa Pedro Guimarães, o caso ainda tem desdobramentos na esfera criminal e trabalhista e é cercado de sigilo por investigadores, advogados e o próprio banco.

Guimarães é réu por assédio sexual e importunação sexual, e terá que responder pelos casos também na Justiça do Trabalho. De acordo com informações obtidas pela Folha, o ex-executivo também é réu por assédio sexual e moral na ação movida pelo MPT (Ministério Público do Trabalho).

O ex-presidente recusou um TAC (termo de ajuste de conduta) para encerrar o caso, mas ainda não respondeu à proposta de acordo no âmbito trabalhista. Uma audiência de conciliação estava marcada para esta terça-feira (11), mas foi suspensa.

Já a Caixa entrou em acordo com o MPT e escapou da indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 305 milhões -conseguindo baixar o valor para R$ 10 milhões. A expectativa é de que a Justiça homologue o documento -já assinado- nos próximos dias.

De acordo com dados do acordo aos quais a Folha de S.Paulo teve acesso, a Caixa se comprometeu a receber e encaminhar as denúncias dos funcionários em até 30 dias, e concluir as investigações internas em até seis meses -prazos que há até pouco tempo não existiam.

Além disso, o banco concordou em facilitar o recebimento de denúncias. Antes, segundo relatos, empregados não conseguiam formalizar a queixa em alguns casos, sobretudo quando queriam se manter em sigilo.

Com o acordo, a expectativa é de que a empresa já inicie investigações internas sobre novos casos mesmo com o menor número de informações possível, como um relato do episódio e o nome dos supostos envolvidos, sem empecilhos formais.

Outro ponto do acordo prevê a realização de pesquisas de clima organizacional. A avaliação é de que as informações levantadas podem indicar ao banco que determinado setor, por exemplo, demonstra ter problemas.

Com o compromisso da Caixa com uma "efetiva política de prevenção e enfrentamento ao assédio sexual, ao assédio moral e à discriminação", o MPT aceitou reduzir o valor da indenização.

O MPT também queria a condenação dos ex-integrantes do Conselho de Administração do banco, mas o pedido foi negado pela Justiça. Um dos alvos era a atual presidente, Maria Rita Serrano, que à época era representante dos funcionários.

Apesar do acordo com o MPT, a Caixa ainda enfrenta outros processos da época de Pedro Guimarães. No mês passado, a empresa pública foi condenada a pagar R$ 3,5 milhões pelo episódio de 2021 em que o ex-presidente coagiu funcionários a fazerem flexões.

Para a juíza, o pedido de Guimarães foi embaraçoso, vexatório e humilhante, e não pode ser visto "como comportamento normal e aceitável, especialmente quando considerado o contexto de subordinação em que se desenvolvem as relações de trabalho".

O processo foi movido pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região e ainda cabe recurso. Questionada pela reportagem, a Caixa disse apenas que não comenta ações em curso e não informou se irá recorrer.

A Fenag (Federação Nacional das Associações dos Gestores da Caixa Econômica Federal) também processa a Caixa por uma série de denúncias de assédio moral e sexual. A ação foi movida em 2020, muito antes de o escândalo vir à tona.

O presidente da Fenag, Pedro Sérgio dos Santos Barbosa, afirma que uma audiência está prevista para o mês que vem. A federação processou o banco em nome de 31 associações de gerentes e gestores de todo o país, mas a Justiça limitou o caso a Brasília.

"A gente entrou [com a ação] para que se mudasse o comportamento. Isso não pode acontecer novamente. Então tem que ter algum instrumento que não permita que assediadores voltem à gestão da Caixa. Tem que ter algum instrumento de proteção", diz Barbosa.

Além da preocupação com a exposição das vítimas, pessoas envolvidas nos processos contra Guimarães relatam que as informações têm sido tratadas de forma extremamente reservada para não dar munição à defesa do ex-executivo.

A advogada que defende as mulheres que denunciaram Guimarães por assédio sexual, Soraia Mendes, foi procurada pela reportagem, mas não quis se manifestar.

Já os advogados José Luis Oliveira Lima e Ana Carolina Piovesana, que defendem o ex-presidente no âmbito criminal, afirmam em nota que ele não praticou nenhum crime.

"Pedro Guimarães sempre declarou ser inocente das acusações apresentadas. Pedro recusou a realização de qualquer acordo uma vez que não praticou nenhum crime. Pedro tem quase 30 anos de atividade profissional com comportamento irretocável."

Com os dois principais processos sob sigilo, funcionários da Caixa desconhecem os termos do acordo negociado pelo banco com o MPT, mas defendem que a empresa pública cobre de Guimarães os valores a serem pagos -e que a Justiça também o obrigue a tirar dinheiro do próprio bolso.

O presidente da Fenae (Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal), Sergio Takemoto, afirma que qualquer prejuízo financeiro para a Caixa é também um prejuízo para toda a sociedade.

"Ônus para a empresa significa ônus para a sociedade. A responsabilidade pelo pagamento deve ser de quem causou isso. A Caixa tem que cobrar os responsáveis por essa pena", afirma o presidente da Fenae.

"Na questão do assédio sexual, o que todo mundo espera é que haja justiça. Que a justiça seja feita e que haja punição dos culpados. Essa é a expectativa de todos os empregados", completa.

Takemoto diz que, com a chegada da nova gestão, a mudança foi "total" na questão do assédio moral, e que "há um ambiente muito mais saudável dentro da empresa". Ele cobra, no entanto, participação dos empregados na formulação e acompanhamento de medidas de combate ao assédio.

"Uma coisa que a gente está pleiteando é que a Caixa faça esse acordo, mas que as medidas implementadas, que todos os programas que venham a ser implementados, que haja a participação das entidades no acompanhamento e formulação", diz.

Em nota, a Caixa afirma que fortaleceu a governança do banco para apurar denúncias, proteger denunciantes e empregados, além da própria instituição. O banco disse que, além das medidas judiciais, reforçou e implementou ações de combate às práticas de assédio sexual e moral.

"O banco fortaleceu seu canal de denúncias, que é operado com garantia de sigilo por profissionais especializados e instituiu o canal de acolhimento aos empregados vítimas de assédio", afirmou em nota.

"A Caixa também implementou política específica de prevenção e combate ao assédio moral e sexual e à discriminação e realizou ações de aculturamento sobre o tema para empregados e dirigentes."


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