PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) - Após evento em que representantes de vinícolas, autoridades e entidades do setor assinaram um protocolo de intenções de boas práticas trabalhistas, o gerente-geral da vinícola Aurora, Rodrigo Arpini Valério, disse acreditar que a empresa será lembrada "pelo resto dos tempos" sobre o episódio em que mais de 200 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão, em fevereiro de 2023.
Os trabalhadores, quase em sua totalidade prospectados na Bahia, eram contratados pela empresa Fênix e prestavam serviços para as vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton. Em março, as três empresas firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta junto ao Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul.
Valério, da Aurora, disse que enxerga a empresa como "corresponsável" pela "falta de gestão sobre um terceiro". Ele comparou a forma como o consumidor recebeu o episódio a uma traição amorosa.
"Marcas como a Aurora as mães colocam na mesa para os filhos. Tinha uma relação de amor aí. Quando alguém trai em uma relação de amor, como um casal, sempre vai ficar um machucado. Fica na história. A Aurora vai ficar lembrada pelo resto dos tempos", disse.
Valério, todavia, acredita que a empresa pode reconstruir sua marca se conseguir mostrar que fez uma transição completa em sua cadeia produtiva. Entre outras medidas, a empresa divulgou uma cartilha chamada Guia de Implementação de Trabalho Digno aos seus cooperados e diz ter revisado todos os contratos em vigor.
"Com certeza a próxima safra da uva vai ser a mais coberta do mundo [pela imprensa]. E nós temos que estar aptos para mostrar que o trabalho digno vai ocorrer desde a colheita, até a industrialização. A gente vai monitorar até o sono dos caminheiros", diz Valério.
A fala ocorreu após o executivo receber das mãos do ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, um certificado de adesão a um "Pacto pela Adoção de Boas Práticas Trabalhistas da Vitivinicultura no Rio Grande do Sul" em evento realizado na Assembleia Legislativa gaúcha, nesta quarta-feira (24), em Porto Alegre. Sentados na primeira fileira, os representantes das três vinícolas não discursaram.
Maurício Salton, diretor-presidente da vinícola Salton, recusou pedido de entrevista da reportagem alegando pressa para deixar o evento. Alexandre Angonese, diretor executivo da Garibaldi, disse que a adesão ao protocolo é "mais uma demonstração" de que a empresa está assumindo sua "responsabilidade social".
"Deixando claro que nada do que aconteceu foi nas vinícolas, mas que nos comprometemos em termos de imagem e responsabilidade que temos socialmente falando em atender a legislação e principalmente respeitar os direitos trabalhistas", disse Angonese.
Antes de distribuir os certificados, o ministro Luiz Marinho recebeu um relatório da Comissão de Representação Externa da Assembleia Legislativa que investigou o caso ocorrido na Serra Gaúcha.
Conforme um dos representantes, o deputado estadual Matheus Gomes (PSOL), um dos problemas identificados pelo grupo de trabalho foi o desmonte das ações de erradicação do trabalho escravo, que teriam perdido orçamento e esforços desde 2015.
Em seu discurso na Assembleia, Marinho enfatizou a necessidade de prever em contrato a responsabilização de quem contrata empresas terceirizadas sobre toda a cadeia produtiva. Disse também que a sociedade brasileira precisa se insurgir contra o problema.
"A nossa missão não é resgatar trabalhadores, é eliminar essa condição. É evitar que ela aconteça. E nós não vamos resolver só com ação governamental. [...] Nós só teremos sucesso se a sociedade brasileira assumir essa missão. Nós precisamos de indignação, de um basta. Nós não aceitaremos mais a escravidão", disse.
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