SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto a inteligência artificial (IA) se expande e catapulta a receita de empresas ligadas ao setor de tecnologia, companhias aéreas voltaram sua atenção para a ferramenta como forma de agilizar suas operações. Há quem fale até da possibilidade de os aviões passarem a ter somente um piloto num futuro não tão breve.
A Azul, por exemplo, decidiu utilizar um serviço que, por meio da inteligência artificial e de câmeras, monitora objetos e funcionários ao redor de suas aeronaves quando elas estão estacionadas na área de embarque no aeroporto de Viracopos e indica possíveis falhas.
A ferramenta foi contratada em setembro do ano passado, mas precisou de aproximadamente cinco meses de treinamento com imagens do local para começar a funcionar efetivamente neste ano. A companhia, que diz realizar de 180 a 200 decolagens por dia em Viracopos em certas épocas do ano, considera o terminal no interior paulista o mais importante para sua malha aérea.
Com a nova infraestrutura, desenvolvida pela startup WeSafer, cada elemento no entorno do avião é notado: veículos que transportam combustível, balizadores e caminhões, por exemplo. São 26 câmeras disponíveis em 13 portões do aeroporto, e a expectativa da empresa é que o número chegue a 40 câmeras até o fim do ano.
Daniel Tkacz, vice-presidente de operações da Azul, diz que o monitoramento permite evitar atrasos e economizar custos com combustível, por exemplo.
Um problema muito comum era a demora para o balizador se posicionar e conduzir o avião ao portão de embarque e desembarque -contratempo reduzido em 80%, segundo Tkacz.
"Ele tem que estar ali de três a cinco minutos antes [da aeronave chegar] para evitar que o avião tenha que parar. Toda vez que ele para, precisa acelerar de novo. Isso gasta mais combustível, perde tempo. Pense em um pit-stop de Fórmula 1, mas em um tempo maior", diz Tkacz.
Também neste ano, a Latam anunciou uma tecnologia semelhante, testada e desenvolvida por cerca de doze meses, para o aeroporto de Guarulhos, maior centro de conexões da empresa. Assim como a ferramenta da Azul, o equipamento da companhia acompanha processos como a acoplagem ao portão de embarque e o fornecimento à aeronave de recursos de solo, como ar condicionado e energia elétrica.
Já a Gol disse, em nota à reportagem, que utiliza machine learning, braço da inteligência artificial, para determinar o tempo de solo requerido para realização do turnaround --o pit-stop das aeronaves-- e a probabilidade de atraso de um voo, entre outras aplicações.
A discussão sobre os usos da inteligência artificial não é de hoje e vem se fortalecendo no setor recentemente, ao passo que a tecnologia ganha mais visibilidade.
Questionado por uma jornalista sobre a possibilidade de o piloto e o copiloto serem substituídos por inteligência artificial, o presidente da Emirates, Tim Clark, afirmou em entrevista a um canal de televisão americano, em maio, que uma aeronave poderia ser conduzida com apenas um piloto. Segundo ele, no entanto, isso vai levar tempo.
"Você poderia ver uma aeronave com apenas um piloto. Mas, mesmo isso, provavelmente vai levar tempo. O avião poderia voar totalmente no piloto automático? Sim, poderia. A tecnologia está aí e poderia ser melhorada com IA. Isso é uma percepção, mas sempre haverá alguém no voo. Mas eu estou em 2023. O que haverá em 2050 ou depois disso eu não tenho ideia", disse.
Apesar de não citarem especificamente o uso de inteligência artificial, entidades e agências ao redor do mundo já debatem o tema. A Easa (Agência de Segurança da Aviação da União Europeia), por exemplo, afirma que está avaliando com maior intensidade as operações eMCO, termo utilizado para voos com somente um piloto no controle, mas apenas durante o período menos crítico -ou seja, ainda exigiria auxílio de mais profissionais na decolagem e no pouso.
É diferente de uma operação SiPo, cujo voo permanece com um único piloto durante toda a sua duração. Em nota, a Easa diz que há alguma consideração sobre o SiPo, mas apenas para aviões cargueiros.
"Até mesmo aviões de geração recente, como o Airbus A350, precisariam de aprimoramentos e características de design ou sistemas que não são necessários atualmente para garantir que possam ser operados com segurança em uma operação eMCO. As aeronaves futuras poderiam ser projetadas levando em consideração tais operações desde o início", escreveu a agência em resposta à reportagem.
Em nota, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) disse que, por ser uma ferramenta em ascensão, com novas aplicações surgindo em um ritmo acelerado, a inteligência artificial precisa ser "avaliada cuidadosamente para que os resultados de sua implementação sejam perenes a longo prazo, garantindo adequação a todos os requisitos regulamentares e possibilidades de ampliação". A agência disse estar atenta a esses desenvolvimentos.
Daniel Tkacz, da Azul, diz que, apesar dos avanços, as chances de algo do tipo ganhar espaço no setor aéreo no curto e no médio prazo são remotas. Ele afirma que a presença de mais de um piloto é crucial para momentos inesperados, como quando o comandante passa mal.
"Talvez [aconteça com] aviões pequenininhos, cargueiros. É a mesma discussão dos carros autônomos. Ainda é bem embrionário", diz.
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