SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A equipe técnica do TCU (Tribunal de Contas da União) encontrou possíveis irregularidades no modelo de negócio de empresas que criam fazendas de painéis solares e alugam cotas desses painéis para consumidores, incluindo residenciais. Nesse caso, as empresas vendem uma espécie de assinatura para consumidores, que passam a receber benefícios da geração distribuída.
Entre esses benefícios estão descontos totais no pagamento de encargos e taxas de transmissão e distribuição na conta de energia. Por isso, a conta de quem assina esse tipo de serviço chega a ser até 30% mais barata que a de um consumidor do mercado cativo.
Segundo o TCU, esse modelo de negócio desvirtua a finalidade de geração de energia solar para consumo próprio e contorna a vedação de comercialização de créditos de energia exposta em regulamentações da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).
O Marco Legal da Geração Distribuída, instituído em 2022, define que a microgeração e a minigeração distribuídas se caracterizam como produção de energia elétrica para consumo próprio -a primeira é aquela produção com potência instalada menor ou igual a 75 kW (kilowatts), e a segunda até 3 MW (megawatts), em caso de painéis solares.
Na quarta-feira passada (13), o ministro do TCU Antonio Anastasia determinou que Aneel deve se manifestar, em até 15 dias, sobre os indícios de irregularidades apontados pelos técnicos do tribunal. Anastasia, que é ex-governador e ex-senador por Minas Gerais, também determinou que a agência elabore, em até 60 dias, um plano de fiscalização para identificar e eventualmente sancionar os casos de descumprimento da lei. Procurada, a Agência disse aguardar a notificação oficial a respeito.
A Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica) afirma que, ao se referir a "consumo próprio", a lei diz respeito à titularidade de uso e não necessariamente à necessidade de o consumidor ser proprietário daquele sistema de painéis solares. Assim, como as empresas donas de fazendas solares transferem parte daquela energia solar para os cotistas, o negócio, na visão da associação, seria legítimo.
De modo geral, essas empresas compram dezenas de hectares de terra em áreas rurais não muito distantes dos centros urbanos e instalam painéis solares que geram constantemente energia. Esses painéis são, então, divididos em cotas, que são alugadas para pessoas físicas e jurídicas instaladas na mesma área de concessão de onde os painéis estão fixados (exemplo: uma empresa instalada na área de concessão da Enel, em São Paulo, só pode ser assinante de uma serviço instalado nessa área de concessão).
No final do mês, o cliente que adere a essa modalidade paga a mensalidade para a empresa de fazenda solar mais a diferença entre o seu consumo de energia e o quanto aquela cota do painel injetou no sistema elétrico. Esse último valor é pago às distribuidoras. Caso não haja diferença entre consumo e produção, o consumidor precisa pagar uma taxa mínima para as distribuidoras. Já se a produção for maior do que o consumo, o consumidor pode ficar com um crédito.
Hoje, segundo a Absolar, há 4.720 mil usinas de geração compartilhada (nome técnico para esse modelo de negócio de assinaturas) no Brasil, sendo que juntas elas têm capacidade de gerar quase 700 MW. Há também quase 382 mil usinas remotas onde só uma empresa consome toda a energia produzida -elas somam mais de 5 GW em capacidade instalada. Geralmente, uma usina de 3MW tem 12 hectares.
Esse modelo de negócio se iniciou há cerca de dez anos e hoje já conta com várias empresas especializadas. Entre as maiores estão, por exemplo, Origo, Cemig e (re)energisa, essa última do mesmo grupo da distribuidora Energisa. Minas Gerais é hoje o estado com maiores usinas geradoras.
Os técnicos do TCE argumentam que o crescimento desse modelo de negócio resulta no aumento de encargos para o restante dos consumidores e contribui com a "espiral da morte", termo dado pelas distribuidoras e especialistas do setor para a saída constante de consumidores do mercado cativo de energia, o que na prática deixa a conta mais cara para quem permanece.
De acordo com a Aneel, os incentivos para a geração distribuída somaram mais de R$ 7 bilhões no ano passado. Esse valor é repassado para os consumidores de energia de outras modalidades, principalmente aqueles do mercado cativo, onde a maioria dos consumidores residenciais está.
O marco legal do tema define que aqueles proprietários de painéis solares que solicitaram conexão nas distribuidoras até janeiro de 2023 receberão os subsídios até 2045. Nesse caso, como a data limite é referente à solicitação de conexão e não ao consumo, aquelas pessoas que aderiram ao plano de assinatura após janeiro de 2023 também recebem esse benefício.
A Absolar argumenta que a Aneel precisa considerar os eventuais benefícios da geração distribuída para o sistema elétrico do país. Entre eles, de acordo com um estudo feito pela associação, estão a menor perda de energia (já que os painéis estão próximos dos centros de demanda) e a menor necessidade de acionamento de termelétricas.
"Desde 2022 o setor aguarda uma portaria do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) que vai estabelecer diretrizes para a Aneel calcular os benefícios da energia solar em GD para o sistema elétrico. Quando a gente olha só para a conta, a gente olha que esse modelo traz uma conta de X reais para o consumidor, mas essa perspectiva é incompleta. Seria a mesma coisa de no orçamento a empresa considerar só as despesas e excluir as receitas", diz Bárbara Rubim, vice-presidente da Absolar.
Em nota a Origo disse que segue rigorosamente a legislação e todas as regulamentações do setor onde atua. A (re)energisa tamém reiterou que segue a legislação e regulamentação vigente, e a Cemig informou que que acompanha a análise do TCU sobre o tema. Todas anunciaram, recentemente, planos de expansão de seus negócios.
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