SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - No ano em que celebrou 20 anos desde que começou a jogar tênis de mesa, Hugo Calderano teve a melhor temporada de sua carreira, embora o final de 2025 tenha ligado um alerta no caminho para Los Angeles.

Maior atleta brasileiro na história da modalidade, Calderano conquistou a Copa do Mundo, um dos torneios mais tradicionais do esporte, e chegou à final do Mundial, em performances que o consolidaram como um jogador de patamar muito elevado, visão corroborada pelo público e também por adversários de peso.

Além do desempenho em competições de enorme prestígio, ele venceu neste ano a Copa da Alemanha e a Bundesliga, triunfos que marcaram sua despedida do Liebherr Ochsenhausen, clube que defendeu por nove temporadas. Na final da liga alemã, ainda aproveitou a chance de estragar a festa de Timo Boll, ex-número 1 do ranking mundial e considerado uma lenda do tênis de mesa, que encerrava sua carreira após 30 anos.

Já em torneios do WTT (World Table Tennis), o circuito mundial, Calderano viveu altos e baixos. Começou o ano com derrotas seguidas para jogadores asiáticos, sem conseguir avançar além das quartas de final em quatro competições. O próprio Calderano diz que a fase ruim era fruto do momento de transição após a decepção de sair sem uma medalha das Olimpíadas de Paris, em 2024, quando chegou às semifinais, uma marca por si só histórica ?ele se tornou o primeiro atleta de fora da Ásia e da Europa a atingir essa etapa.

O abalo com tamanha frustração fez o mesa-tenista realizar grandes mudanças em sua preparação. Trocou toda a equipe técnica, rompendo a parceria de 15 anos com o francês Jean-René Mounie, e decidiu deixar o Ochsenhausen para focar só o circuito mundial, o que, com menos jogos, deve poupar seu desgaste físico.

A virada começou em abril, com o ouro na Copa do Mundo, a maior conquista de sua carreira até aqui. Em Macau, diante dos torcedores chineses, derrotou os atletas que naquele momento ocupavam o topo do ranking mundial: o japonês Tomokazu Harimoto, então número 3, nas quartas, o chinês Wang Chuqin, número 2, nas semifinais, e o também chinês Lin Shidong, número 1, na final, vencida com autoridade.

O ineditismo do triunfo, já que o brasileiro foi o primeiro não asiático e não europeu a vencer o campeonato, deu um impulso à sua temporada, e na sequência ele chegou à decisão do Mundial, competição de muita história e que, assim como a Copa do Mundo, é dominada por chineses. Apenas o fato de ter furado a bolha da elite e alcançado a final, com partidas memoráveis, como a das semis contra Liang Jingkun, é admirável.

Na sequência, ganhou o WTT Star Contender de Liubliana, na Eslovênia, batendo o seu carrasco na disputa do bronze em Paris, o francês Felix Lebrun, e cumpriu o roteiro esperado ao conquistar campeonatos WTT de menor expressão, em Foz do Iguaçu e Buenos Aires, onde de longe era o melhor. Foi na Argentina, aliás, que ele consolidou a parceria com Bruna Takahashi nas duplas mistas, iniciada em outubro de 2024.

Na capital argentina, venceram um torneio pela primeira vez, após disputarem uma final na Eslovênia. No Pan-Americano, levaram o ouro, com o contexto de que o nível geral dos participantes é inferior ao do circuito. O desempenho no geral foi positivo, com um triunfo animador contra Wong Chun Ting e Doo Hoi Kem, par número 5 do mundo, e derrotas para duplas consolidadas, o que é esperado para uma parceria formada há tão pouco tempo. O casal já ocupa a sexta posição do ranking mundial, o que aponta para uma oportunidade em Los Angeles.

As Olimpíadas, claro, são o objetivo maior do brasileiro, e para ter um caminho mais viável nos Jogos até as semis, precisa continuar entre os quatro primeiros do ranking até a metade de 2028 ?hoje é o terceiro. Por isso, a performance após agosto, quando foi superado nos seis torneios WTT que disputou, ligou um alerta.

Fora o WTT Champions de Macau, em que foi até a decisão contra Wang Chuqin, atual número 1 do mundo, Calderano perdeu nas outras competições para atletas que costuma vencer e, pior, sem superar as quartas.

Também é notável que outros rivais de nível semelhante, como Harimoto, Lebrun e o sueco Truls Moregard, por exemplo, estejam em ascensão, com bons resultados em torneios grandes. Moregard, medalha de prata em Paris depois de eliminar Calderano na semifinal, tornou-se neste ano, na Suécia, o primeiro não chinês a conquistar um WTT Smash, considerado os Grand Slams do tênis de mesa. Hoje ele é o quinto do mundo.

Fora dos torneios, Calderano inaugurou no final deste ano sua primeira academia de tênis de mesa, no Rio, ajudando a fortalecer a prática no país e o seu próprio nome. Mais midiático em 2025, participou, mesmo tímido, de diversos vídeos e brincadeiras da Cazé TV, que transmitiu as principais competições. A pegada descontraída e ufanista do canal, aliás, ajudou a fazer de Calderano uma espécie de celebridade esportiva.

No calendário até 2028, o primeiro ano do atual ciclo olímpico já acabou, e ele foi excelente. Mas seu final inspira cuidados para que o brasileiro não saia do patamar que ele próprio conquistou em duas décadas.