Apenas o mínimo
Em Galiléia, há muito tempo, quando ainda não existia internet e nem TV a cores (e os aparelhos em preto & branco podiam ser contados nos dedos) sabíamos os resultados das partidas regionais pelos próprios jogadores. Não havia uma emissora de rádio - e mesmo se houvesse acredito que não se aventurariam a pegar a estrada para transmitir um jogo de futebol em territórios vizinhos. Então, restava a nós, meninos, ir para a entrada da cidade e aguardar. A espera era longa, mas recompensada quando o caminhão-caçamba surgia na esquina. Assim que nos viam, os atletas começavam a gritar: “2 a 0, 2 a 0” ou “3 a 2, 3 a 2”. Cabia a nós, os meninos, sairmos em desabalada carreira pelas ruas repetindo o placar: “2 a 0, 2 a 0” ou “3 a 2, 3 a 2” – como se fossemos Fidípides, o herói que correu 40 km para anunciar a vitória dos gregos sobre os persas na planície de Maratona. Era o mínimo que podíamos fazer.
Essa história estava perdida na memória (afinal Galiléia não existe mais em mim), mas tem me assombrado nos dois últimos sábados. Nunca pensei que voltasse à tona, na Juiz de Fora de hoje, tempos de internet, TV a cabo, tecnologia 3G, Twiter e outras facilidades. Mas... tem acontecido, quando percorro a pé os cerca de 5 km que separam o Estádio Municipal Radialista Mário Helênio de casa, após os jogos do Tupi.
As partidas do Galo na Série D têm atraído cerca de 1.100 pessoas. Talvez – não tenho nenhuma certeza disso – umas dez mil ouçam o jogo pelo rádio. Então, temos aproximadamente 488.900 juizforanos que não têm a mínima idéia do que se passou no estádio. Ate aí tudo bem, faz parte do futebol e da vida: cada um presta atenção no que quer – e viva o livre arbítrio!
Mas, o que me causa mesmo estranheza é que dois ou três cidadãos, por sábado, se acham no direito de (vendo-me com a camisa Carijó e o radinho grudado na orelha, ouvindo os comentários) parar-me na rua e perguntar: “Quanto foi o jogo?”. Com a paciência que Deus me deu respondo: “1 a 0, 1 a 0” ou “2 a 1, 2 a 1” – como se eu fosse uma versão moderna de Fidípides, percorrendo 5 km para anunciar para alguns o triunfo do Galo.
É o mínimo que posso fazer e faço com gosto, confesso, a não ser que o desinformado tenha o desplante de fazer uma segunda pergunta: “1 a 0 (ou 2 a 1) para o Tupi?” – Como se houvesse alguma chance, com a falta de educação que Deus me deu, de eu responder caso fosse o contrário, na hipótese remota de o Galo ter sido derrotado.
Mas... dou a informação e sigo adiante, em paz, ouvindo os comentários. Desligaria o rádio para dar atenção a quem quisesse mais detalhes. Diria que foi 1 a 0 contra o Paulista, gol de Hugo e o time jogou muito bem. Ou que foi 2 a 1 contra o Friburguense, gols de Bigu e Rafael, que o técnico foi muito ousado ao mudar a equipe ainda no primeiro tempo e outras coisas. Porém ninguém quer saber mais que o placar. Acho tudo isso muito estranho. Como pode alguém, quando se trata do Tupi, querer saber apenas o mínimo?
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Faltam 13 jogos e 103 dias para o Tupi ganhar seu primeiro título nacional.
Ailton Alves
é jornalista e cronista esportivo
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