Ailton Alves Ailton Alves 1/3/2010

As fontes luminosas

Jogo Democrata X TupiElas, as fontes luminosas, eram muito comuns nas cidades mineiras, nos anos 60 até meados da década de 70, século passado. Inauguradas com pompa e circunstância, agradavam demais aos de tenra idade e também aos idosos. Pontualmente às 6 da tarde, na Hora do Angelus, eram ligadas por algum mágico (na verdade, um funcionário da prefeitura), jorrando água colorida. Todos os moradores davam um jeito de passar por perto: os adultos com um pouco de pressa; as meninas fazendo charme e nós, os meninos, encantados, com elas e ela, a fonte.

Sei que interessa a ninguém, mas vi minha primeira fonte luminosa em Governador Valadares, quando morava por lá, e o impacto só não foi maior nas reminiscências infantis porque foi o dia também que pela primeira vez fui ao cinema - um filme de Tarzan, com o Johnny Weissmuller vivendo aventuras inacreditáveis numa colina que tinha a sombra da morte.

Lembrei da fonte luminosa da minha infância porque não foi outra senão a mesma sensação após o término do primeiro tempo do jogo do Tupi contra o Democrata, neste domingo, na mesma Governador Valadares de outrora. 2 a 0 no placar e uma sensação de êxtase, quase inacreditável e única. Tinha a sombra de vida. Principalmente porque o segundo gol (aquele que daria uma teórica vantagem definitiva) lembrou muito o jorro da água: bola vinda do escanteio, já na descendente, e alguém golpeia a pelota elevando-a levemente até que ela toca a rede e provoca nos presentes (torcedores Carijós, no caso) um sentimento parecido com a visão do espetáculo das fontes luminosas.

Mas, elas, as fontes luminosas, desapareceram por completo das cidades mineiras assim que a década de 80, século passado, começou. As novas gerações já não achavam graça naquilo e sempre tinha um chato – alguém da oposição ou brigado com a vida - que dizia que aquela era a única obra do prefeito (como se fosse proibido fazer coisas que embelezassem a cidade).

Interessa a ninguém, eu sei, mas vi minha última fonte luminosa em Santa Bárbara, mais ou menos nessa época do crepúsculo da atração, e realmente não teve o mesmo impacto (já tinha perdido, em função da idade avançada, o romantismo e até mesmo Tarzan não tinha mais graça – a busca já era por filmes proibidos).

Pensei nisso, no desdém com as fontes luminosas da minha juventude, depois do segundo tempo da partida entre Tupi e Democrata, quando o placar apontava 4 a 2 para o adversário. Uma sensação de frustração, de algo que estava na mão e se perdeu, escorreu entre os dedos. Tinha, como no filme do Tarzan, o espectro da morte.

Agora, nessa altura do futebol e da vida, findada as coisas boas do domingo – as lembranças e a expectativa de vitória - acho que não cabe procurar culpados. Não fará bem a ninguém e nenhum sentido criticar os prefeitos de Minas que não fazem mais fontes luminosas e muito menos o goleiro Carijó que cometeu aquele pênalti infantil.

A culpa, se existe, é daqueles que não veem mais beleza nas fontes luminosas e dos que esqueceram que o futebol é um esporte coletivo.



Ailton Alves é jornalista e cronista esportivo
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