SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A desistência do ex-presidente argentino Mauricio Macri (2015-2019) de concorrer às eleições presidenciais de outubro abriu novo contexto para a disputa, que ocorrerá em meio à deterioração da economia, hoje com inflação de mais de 100% ao ano e contas públicas descontroladas.
Macri disse ter "vencido o ego" ao abrir mão de concorrer, desbastando o caminho para que sua frente Juntos por el Cambio decida entre dois principais nomes: Horacio Larreta, prefeito de Buenos Aires, e Patricia Bullrich, ex-ministra da Defesa no governo Macri.
Pesquisa de opinião realizada pela consultoria D'Alessio/Berensztein depois do anúncio do ex-presidente mostrou que 67% o apoiam. Para 50%, a decisão favorecerá Bullrich; para 30%, Larreta.
A pouco mais de seis meses da eleição, o movimento de Macri aumenta a pressão para que o principal grupo adversário, a Frente de Todos, também limpe o terreno para que seus eleitores fechem o foco nas candidaturas.
A Frente de Todos é o grupo que hoje governa a Argentina. Entre os possíveis candidatos constam o presidente da República, Alberto Fernández, a vice-presidente, Cristina Kirchner, e o atual ministro da Economia, Sergio Massa.
O incumbente Fernández e a popular (para o bem e o mal) Cristina seriam os candidatos naturais. Mas, com a economia derretendo, ambos --sobretudo Cristina-- temem uma vergonhosa derrota do peronismo.
Nesse contexto, Massa, que assumiu a Fazenda em julho do ano passado, corre por fora. Tem como trunfo um ótimo relacionamento com o Fundo Monetário Internacional, que mantém um pacote de empréstimos de US$ 45 bilhões à Argentina.
Não fosse essa relação amistosa e de confiança com Massa, o fundo já poderia ter cancelado parcelas de desembolso de dólares ao país pelo não cumprimento de metas, estrangulando ainda mais a economia.
Dificilmente, porém, a ajuda do FMI dará conta de conter a deterioração. A Argentina sofreu uma seca histórica na atual safra, o que deve diminuir à metade a entrada de dólares neste ano, pressionando o câmbio e a inflação. Algumas consultorias já projetam queda de até 3% no PIB deste ano.
Sem confiança de investidores, o governo não consegue se financiar vendendo apenas títulos no mercado. A solução tem sido imprimir pesos, recurso altamente inflacionário e insustentável.
Com as chances da Frente de Todos comprometidas e a economia jogando cada vez mais pessoas na pobreza --dados oficiais consideram pobres 19,7 milhões dos 45 milhões de argentinos--, o risco é o país se voltar para um voto de protesto, tanto contra o atual governo quanto contra o grupo de Macri, que já governou, sem sucesso, a Argentina.
É nesse sentimento que o pré-candidato radical e deputado Javier Milei aposta. Vendendo-se "contra tudo e contra todos", a figura exótica e meticulosamente descabelada de Milei pode dar à Argentina um radicalismo que o país ainda não experimentou; e que EUAe Brasil vivenciaram com Donald Trump e Jair Bolsonaro.
Até aqui, pesquisas eleitorais mostram o grupo Juntos por el Cambio com cerca de 38% das intenções de voto, o governista Frente de Todos com 34%, e Milei com cerca de 20%.
Embora seis meses pareçam pouco tempo até as eleições, o período certamente é longo demais para o novo ritmo de descontrole que a economia argentina vem ganhando. Mais do que qualquer outra coisa, é isso que deverá definir o voto em outubro.
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