SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - As negociações travadas entre o Japão e a Otan para que a aliança militar ocidental liderada pelos EUA abra um escritório de cooperação no país asiático voltaram a acirrar a tensão com a China.
A tratativa ainda está aberta, mas autoridades de Tóquio já sinalizaram que, após a Guerra da Ucrânia, que forçou o Japão a rever sua agenda de segurança, o diálogo com a Otan escalou -e que acolher um escritório da aliança é uma possibilidade cogitada em altos níveis.
O chanceler do Japão, Yoshimasa Hayashi, ao lado do secretario-geral da Otan, Jens Stoltenberg, durante entrevista coletiva em Bruxelas após encontro de ministros de países-membros da aliança e convidados Nesta quarta (24), durante entrevista coletiva em Pequim, a porta-voz da chancelaria chinesa Mao Ning, questionada sobre o assunto, disse que a região Ásia-Pacífico "não acolherá bem" uma disputa de blocos ou blocos militares. "Dado o histórico de agressões no Japão, o país precisa ser prudente em questões militares e de segurança e se assegurar de que suas ações colaborem para a paz regional."
Mao falou pouco após o premiê do Japão, Fumio Kishida, abordar o assunto durante fala no Parlamento. O primeiro-ministro descartou que o país tenha planos de se tornar membro da Otan, mas reconheceu os diálogos para a abertura de um escritório na capital do país.
A informação foi divulgada pela primeira vez no último dia 10, durante entrevista do chanceler japonês, Yoshimasa Hayashi, à rede CNN. Na ocasião, ele disse que o martelo ainda não havia sido batido, mas deixou claro que o plano tem boas chances de se concretizar em breve.
"O que está acontecendo no Leste Europeu [em referência à guerra] não se limita apenas à questão local, isso afeta diretamente a situação aqui no Pacífico. É por isso que uma cooperação entre nós, do Leste Asiático, e a Otan está se tornando cada vez mais importante."
A Otan está no centro da disputa narrativa e militar entre Rússia e Ucrânia. Além de países-membros da aliança serem os principais apoiadores de Kiev, com envio de dinheiro e equipamentos de batalha, Moscou também usa a proximidade da aliança com o país vizinho como um dos argumentos para a invasão.
Ainda que o governo de Kishida não tenha feito um anúncio formal, o jornal Japan Times, citando fontes do alto escalão do governo, informou que o premiê deve participar da cúpula da Otan na Lituânia em julho -data que marcará a entrada da Finlândia na aliança.
Espera-se que Kishida também se reúna com o secretário-geral da Otan, o norueguês Jens Stoltenberg, para esboçar um novo plano de cooperação na área de segurança. Em 2022, o premiê se tornou o primeiro líder do país a comparecer a uma cúpula da aliança ocidental.
Também nesta quarta-feira, o Ministério da Defesa japonês, durante cerimônia que contou com a participação do embaixador ucraniano no país, Sergii Korsunsky, prometeu doar cem veículos blindados para Kiev, além de mais ajuda alimentar. "Esperamos que a invasão [russa] termine o mais rápido possível", afirmou o vice-chefe da pasta de Defesa, Toshiro Ino. "Daremos o máximo de apoio possível."
Ainda que a abertura de um escritório da Otan em solo japonês não signifique o ingresso da entrada do país na aliança, o alargamento da presença militar ocidental na região acende o alerta de Pequim em especial em relação à ilha de Taiwan, hoje o ponto mais sensível da política externa do regime comunista.
A Constituição japonesa, datada do pós-guerra e imposta pelos Estados Unidos, é conhecida por seu caráter pacifista ao abrir mão do direito de guerrear e dos meios para fazê-lo. Isso não impediu, porém, que, no final do ano passado, o país aprovasse seu maior orçamento militar desde a Segunda Guerra Mundial.
O país argumentou que o plano de US$ 320 bilhões será usado apenas para sua estratégia de autodefesa e não para interferir em conflitos alheios. Parte do debate sobre a possibilidade, ainda que remota, de entrar na Otan, reside no fato de que Estados-membros da aliança, entre outras coisas, comprometem-se com um princípio de defesa mútua, que permite proteção militar coletiva a qualquer membro.
O acaloramento dos debates sobre a proximidade do país asiático com a aliança militar ocorre poucos dias após o Japão sediar, em Hiroshima, a cúpula do G7, grupo que reúne algumas das principais economias do mundo -o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve presente como convidado, ainda que o Brasil não integre o grupo.
O comunicado final do encontro, como era esperado, expressou o comprometimento de seguir enviando apoio a Kiev pelo tempo que for necessário. E também fez uma série de acenos à China de Xi Jinping.
O texto afirma, por exemplo, que os países-membros -e os convidados- não têm o objetivo de prejudicar o gigante asiático em seu progresso e desenvolvimento econômico, mas também reafirma o compromisso com "a paz e a estabilidade" em Taiwan, a ilha que Pequim considera uma província rebelde, e diz apoiar um Indo-Pacífico livre e "se opor a qualquer tentativa unilateral de mudar o status quo pela força ou pela coerção", em um claro aceno ao país de Xi.
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