LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - Uma portaria publicada pelo governo brasileiro abriu caminho para a regularização de cidadãos dos Estados-membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que já estejam em território nacional, permitindo que eles requisitem uma autorização de residência "independentemente da condição migratória" de ingresso no Brasil.

A previsão inicial é de que cerca de 10 mil imigrantes do bloco lusófono --formado por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste-- sejam contemplados.

A comunidade angolana, que atualmente vive uma onda de crescimento no país, será a principal beneficiada pelo mecanismo, respondendo por até 80% das regularizações previstas.

"Não é uma anistia migratória, que só pode ser concedida pelo Congresso Nacional. Estamos falando da promoção da regularização migratória da comunidade imigrante aqui no Brasil", afirma Bernardo Laferté, gerente de projeto da Secretaria Nacional de Justiça, ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Segundo ele, a portaria mira sobretudo a atual diáspora africana. "[A norma] implica ter um documento emitido pelo Brasil de que aquela pessoa está regular no país. Isso abre muitas portas na obtenção de serviços e na garantia de direitos. Facilita colocar um filho na escola, conseguir emprego e ter acesso ao sistema de saúde. É um ponto essencial, porque estamos falando de cidadania", diz.

Professor de direito de FGV-Rio, Felipe Fonte destaca a simplicidade de regularização trazida pela portaria. "Acaba criando uma regra bastante benevolente para os estrangeiros dessa comunidade, que vão poder agora requerer autorização de residência sem precisar estar no país de origem e sem grandes burocracias."

O novo texto, no entanto, não isenta automaticamente os migrantes da multa por tempo de permanência irregular no Brasil, atualmente de R$ 100 por dia excedido, até um limite de R$ 10 mil.

Pessoas que comprovem situação de "hipossuficiência econômica", mostrando que não dispõem de recursos para pagar esse montante, podem pedir isenção.

A nova portaria também regulamenta os vistos temporários previstos no acordo de mobilidade assinado pelos países da CPLP em 2021. Também conhecido como visto de residência CPLP, o documento poderá contemplar algumas categorias profissionais, como professores, cientistas, empresários, estudantes, agentes culturais e técnicos de alta qualificação. A validade inicial é de um ano.

Tanto os vistos quanto as autorizações de residências poderão ser requeridos a partir do dia 2 de outubro. Em Portugal, os pedidos poderão ser feitos nos três consulados brasileiros no país (Lisboa, Porto e Faro), enquanto, na África, a responsabilidade será das embaixadas nas capitais.

Entre as exigências do governo brasileiro estão a apresentação de documento de viagem válido, atestado de antecedentes criminais e comprovante de renda ou equivalente. No caso dos profissionais, é necessário comprovar que exercem uma das atividades abrangidas pela regulamentação.

Outros países do bloco também estão em processo de adequação de suas legislações nacionais ao acordo de mobilidade lusófono, assinado em julho de 2021, após três anos de debates.

A ideia de criar um sistema para assegurar a circulação de pessoas, porém, era quase tão antiga quanto a própria CPLP, que em julho completou 27 anos. Nos últimos anos, em meio à necessidade de mão de obra imigrante, Portugal foi um dos principais incentivadores do acordo.

Também no âmbito do pacto de mobilidade, o país europeu implementou uma autorização de residência automática para cidadãos de países de língua portuguesa. A comunidade brasileira foi a mais beneficiada, com mais de 100 mil pedidos de regularização desde o lançamento do mecanismo, em março.

Ainda que o documento assegure acesso aos serviços de saúde e de segurança social do país, muitos beneficiários têm se queixado das dificuldades de circulação dentro da União Europeia.

A autorização de residência da CPLP, que tem o formato de um papel A4 e deve ser acompanhada sempre do passaporte, não é reconhecida pelos demais membros da UE, ao contrário do documento padronizado para os imigrantes na região, que é um cartão especial de identificação. A situação tem gerado divergências de interpretação, com diversos casos de brasileiros impedidos de embarcar por companhias aéreas.


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