LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - Com a menor abstenção em mais de uma década, os portugueses foram às urnas neste domingo (10) em eleições antecipadas para escolher seu novo Parlamento. Com a apuração perto do fim, o cenário mostrava uma disputa apertada entre a AD (Aliança Democrática), coligação dos partidos da direita tradicional, e o Partido Socialista, no poder desde 2015. O grande destaque foi a legenda de ultradireita Chega, que se consolidou como terceira força e se tornou peça-chave para a definição do próximo governo.
Com 218 das 230 cadeiras da Assembleia definidas até as 21h de Brasília, a AD tinha conquistado 77 assentos contra 74 dos socialistas. O Chega, que tinha apenas 12 deputados na legislatura atual, já havia pulado para 46. Dos 21 restantes que já haviam sido apurados, as siglas de esquerda levaram 12, a direita 8, e uma ficou com uma sigla independente.
Se confirmada, a vitória apertada da Aliança Democrática, contudo, não significa automaticamente que seu líder, Luís Montenegro, presidente do PSD (Partido Social Democrata), será o novo primeiro-ministro.
No sistema eleitoral luso, vota-se no partido, e não diretamente no candidato. Após a definição dos assentos parlamentares, as bancadas podem fazer acordos e coligações que sustentem outros arranjos governativos. Por isso, a composição total do Parlamento importa para a formação do Executivo.
Tradicionalmente, o partido mais votado indica o premiê, mas isso não é obrigatório. Em 2015, o Partido Socialista chegou ao poder mesmo tendo ficado na segunda colocação, graças a uma inédita união pós-eleitoral dos partidos de esquerda, apelidada pejorativamente de geringonça devido à aparente fragilidade do entendimento.
Por isso a importância do Chega, legenda populista com discurso antissistema e contra a imigração. Luís Montenegro, líder da AD, contudo, repetiu durante a campanha que não pretendia governar com o apoio da ultradireita. No entanto, o resultado nas urnas leva a crer que um arranjo sem essa terceira força seria improvável.
Primeiro líder partidário a comentar os resultados preliminares, André Ventura, presidente do Chega, afirmou que o desempenho de sua sigla indica o fim do bipartidarismo entre PSD e PS em Portugal.
O deputado expressou que o resultado "permite ao Chega negociar um governo" e deixou claro que irá pressionar Montenegro para a formação de um arranjo à direita que inclua o partido.
"Estamos disponíveis para formar um governo", adiantou. "Os portugueses manifestaram-se claramente e disseram que querem um governo de dois partidos: da AD e do Chega", disse Ventura, para quem seria irresponsável não aproveitar a maioria atribuída nas urnas às duas siglas.
Fundado em 2019, o partido elegeu seu primeiro deputado no mesmo ano: o próprio André Ventura, um advogado e comentador esportivo que ganhou projeção nacional por falas controversas, como a associação da comunidade cigana ao recebimento irregular de benefícios e a afirmação de que havia "excessiva tolerância com alguns grupos e minorias étnicas".
Um dos assentos já garantidos pelo Chega na próxima legislatura é de um brasileiro, o professor de artes marciais Marcus Santos, pelo distrito do Porto.
Mais cedo, a ministra de Assuntos Parlamentares do atual governo, Ana Catarina Mendes previu um cenário dos socialistas na oposição. "A confirmarem-se essas projeções, o Partido Socialista e seu secretário-geral deverão fazer uma oposição fortíssima àquilo que aí vem, que já se antevê que não será bom para os portugueses."
Diante do resultado apertado entre PS e PSD, porém, a composição final do Parlamento e as possibilidades de arranjo governativo ainda podem demorar alguns dias para serem conhecidas e depender da definição dos 4 deputados eleitos pelos portugueses residentes no exterior.
Esse cenário foi admitido, no fim do dia, pelo primeiro-ministro demissionário António Costa. "Neste momento, os resultados quase finais são menos claros do que aquilo que eram as previsões iniciais. Em termos de mandatos, há quase um empate entre PS e AD. Em termos de votos, há uma proximidade grande", afirmou.
"A única certeza que podemos ter é que, tendo em conta o volume de votos que chegarão nos próximos dias dos círculos da emigração, provavelmente não será hoje que teremos o resultado das eleições."
Previsto para acontecer apenas em 2026, o pleito foi convocado de forma antecipada após a renúncia de Costa, em novembro, quando uma investigação de corrupção em negócios do setor de transição energética atingiu o núcleo de seu governo.
A inesperada crise política pegou os próprios partidos de surpresa, uma vez que a confortável maioria absoluta dos socialistas, com 120 dos 230 assentos parlamentares, poderia levar à conclusão da legislatura sem sobressaltos.
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