SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com Estados Unidos e Europa concordando que a paz na Ucrânia está mais próxima do que nunca em quase quatro anos de guerra, tanto Moscou como Kiev subiram o tom nesta terça-feira (16), visando manter uma posição de força nas negociações promovidas por Donald Trump.

No goveno de Vladimir Putin, a palavra de ordem é inflexibilidade: tanto a chancelaria quanto o Kremlin rejeitaram ceder em seus termos centrais: a cessão das quatro regiões que a Rússia anexou ilegalmente no vizinho em 2022 e a neutralidade militar de Kiev.

Já o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, aproveitou a sua vez à mesa com os negociadores americanos, em duas rodadas no domingo (14) e na segunda (15), e falou grosso. Disse que a Rússia "tem de aceitar que há regras no mundo", que "o agressor tem de pagar" e que "criminosos não mudam em um dia".

Ele discursou no Parlamento da Holanda, país que visitou após os dois dias de negociação com americanos e europeus em Berlim, encerrados com um jantar na noite de segunda. Nas conversas, ele fez sua contraproposta às demandas maximalistas de Moscou.

Pressionado por Trump, Zelenski admitiu perdas territoriais, "um tema doloroso" e impopular: 75% dos ucranianos são contrários, segundo pesquisa publicada na segunda, à entrega dos 20% que restam da região de Donetsk (leste) para os russos.

Além disso, o ucraniano disse que renunciaria à pretensão de ingressar na Otan, a aliança militar ocidental, desde que haja garantias de seguranças robustas contra uma nova invasão russa.

Os europeus se dispuseram a montar uma força de paz, e o monitoramento da trégua seria feito pelos americanos. Há outros detalhes circulando: nesta terça, o premiê polonês, Donald Tusk, disse que a proteção dos EUA inclui a promessa de agir militarmente contra a Rússia se o pacto for quebrado.

"[O negociador Steve] Witkoff deixou claro que os EUA fornecerão garantias de tal forma que os russos não terão dúvidas de que a resposta americana será militar. Então, de certa forma, é semelhante ao artigo 5, mas eu não me referiria diretamente a ele porque isso só poderia complicar futuras negociações", disse.

O polonês, que participou do jantar na segunda, se referia ao mecanismo da Otan que exige defesa mútua em caso de agressão. Como bem notou, a terminologia é tóxica em Moscou.

O vice-chanceler Serguei Riabkov afirmou à agência Tass que a presença de forças internacionais no vizinho é inaceitável para Moscou, até porque forçar a neutralidade de Kiev era um dos "casus belli" de Putin em 2022.

Ele e o porta-voz Dmitri Peskov ressaltaram, contudo, que ainda não há uma comunicação oficial dos EUA sobre os termos na mesa, então seria prematuro discuti-los. Mas Peskov voltou a dizer que a Rússia não aceitará uma "trégua temporária" até o Natal. "Nós queremos a paz definitiva", disse, ou seja, com seus termos contemplados.

Na Holanda, Zelenski disse que "todos os detalhes importam" na negociação. "Se o agressor receber um prêmio, ele começará a acreditar que a guerra vale a pena. O agressor tem de pagar", disse, ressaltando que o debate sobre as garantias é tão importante quanto o cessar-fogo em si.

Na véspera, Trump e líderes europeus haviam dito que o fim do conflito estava próximo, sugerindo com isso que Zelenski havia feito concessões e que a bola estaria agora com Putin.

O anfitrião do ucraniano nesta terça, o premiê Dick Schoof, reforçou esta linha. "Agora vamos ver se Putin quer mesmo a paz, e veremos isso nos próximos dias", disse, antes de instalar uma comissão de reparações de guerra para o caso da trégua.

O tema é controverso. Nesta quinta (18), a União Europeia irá definir se usa as reservas russas congeladas em seu território para lastrear um meagempréstimo a Kiev. A Rússia já disse que vai a cortes internacionais contra o que chama de roubo, e não há consenso entre os europeus sobre o tema.

Já o rearmamento do continente, ante o anunciado desengajamento de Trump da defesa da Europa, segue de vento em popa. Os líderes do flanco leste da Otan se reuniram em Helsinque para definir projetos militares conjuntos sob o guarda-chuva da UE, algo que também não é unânime no bloco.