SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - No dia seguinte à determinação de Donald Trump para bloquear petroleiros sob sanção ao redor da Venezuela, em mais um ato em direção a uma guerra entre Washington e Caracas, as Forças Armadas do país sul-americano divulgaram nota nesta quarta-feira (17) em que reafirmam lealdade ao ditador Nicolás Maduro e dizem que não se sentem intimidadas diante das ameaças feitas pelo presidente americano.

O documento foi assinado pelo ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino López, e publicado nas redes sociais do comando estratégico operacional militar das Forças Armadas. O texto reforça o tom de confronto adotado pelo regime de Caracas diante da medida anunciada por Washington e faz críticas duras a Trump.

"As Forças Armadas Nacionais Bolivarianas rejeitam categoricamente as declarações delirantes feitas ontem, terça-feira, 16 de dezembro, pelo presidente dos EUA, Donald Trump, nas quais ele ameaçou insolentemente nossa nação com ação armada e ordenou um suposto bloqueio naval total para confiscar navios que transportam petróleo venezuelano ?ato que equivale a pirataria descarada", diz trecho da nota.

O comunicado ainda chama de "fantasiosas e incoerentes" as acusações feitas por Trump de que a Venezuela teria roubado petróleo, terras e outros bens. Segundo a nota, as Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB) sustentam que essas afirmações expõem o que chamam de narrativa implausível de combate ao narcoterrorismo, que serviria de pretexto para justificar uma política agressiva contra Caracas.

Na avaliação dos militares venezuelanos, a ofensiva americana faz parte de um plano mais amplo, em curso desde meados deste ano, com o objetivo de forçar uma mudança de regime no país e de se apropriar de seus recursos estratégicos, especialmente o petróleo. O comunicado afirma que essa postura representa um ressurgimento da Doutrina Monroe, interpretada como uma tentativa de impor uma dominação neocolonial dos Estados Unidos sobre a América Latina.

"Nunca antes na história do nosso país um presidente dos EUA nos ameaçou com tanta veemência. Portanto, hoje, ao comemorarmos o 195º aniversário da morte de Simón Bolívar, dizemos ao governo dos EUA e ao seu presidente que não nos deixamos intimidar por suas ameaças grosseiras e arrogantes; que o próprio Bolívar, e muitos outros heróis da emancipação americana, nos ensinaram a lutar e derrotar impérios poderosos, e que a dignidade desta nação não é negociável nem facilmente derrotada", diz.

As FANB também acusam Washington de violar princípios fundamentais do direito internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas, as normas do comércio internacional e as Convenções de Genebra relativas ao alto-mar. Segundo o texto, o bloqueio ultrapassa limites e representa uma afronta à soberania dos Estados e à obrigação de resolver disputas por meios pacíficos.

O texto apela às organizações multilaterais para que se posicionem e ajam contra o que descreve como uma atitude belicista que ameaça não apenas a Venezuela, mas a estabilidade de toda a América Latina e do sistema energético global.

Na prática, o bloqueio anunciado por Trump deve impedir a entrada ou saída de águas venezuelanas de quase todos os cargueiros de petróleo não ligados à americana Chevron. Apesar de sanções americanas contra o setor petrolífero venezuelano, a empresa opera no país latino-americano com anuência de Washington ?medida adotada pelo governo Joe Biden com o objetivo de reduzir o preço de gasolina nos EUA e mantida pelo governo Trump.

A determinação ocorreu num contexto de tensão na América Latina impulsionada por uma mobilização sem precedentes de militares dos EUA na região do Caribe e do Pacífico. Segundo analistas, a medida visa pressionar a ditadura de Maduro, acusado por Washington de tráfico internacional e de corrupção, o que o ditador nega.

Maduro afirma que Trump busca mudar o regime na Venezuela, mas sustenta que a população e as Forças Armadas barrarão qualquer iniciativa para removê-lo do poder. O dirigente chavista assumiu neste ano um terceiro mandato presidencial, mesmo após organizações internacionais independentes apontarem que a oposição venceu as eleições no ano passado.