SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um dia após acusar a Ucrânia de atacar uma residência de Vladimir Putin com drones e colocar em dúvida o processo de paz conduzido pelos Estados Unidos, a Rússia deu nesta terça-feira (30) um recado nada sutil ao divulgar as primeiras imagens do primeiro regimento dos supermísseis Orechnik.

A arma foi testada contra a cidade ucraniana de Dnipro em novembro do ano passado, e Putin sugeriu à época que ela poderia ser "usada contra os centros de decisão em Kiev".

Até aqui, na guerra iniciada em 2022, os russos não atacaram diretamente edifícios governamentais centrais do rival, como o Parlamento ou a sede do Executivo.

Na segunda (29), o governo de Volodimir Zelenski negou ter atacado a residência de verão de Putin no lago Valdai, no norte russo. O presidente ucraniano disse que a acusação visava justificar "ataques a prédios do governo" e minar as negociações ocorridas na véspera entre ele e Donald Trump.

Na manhã desta terça, o Kremlin reafirmou a autoria presumida da ação, o direito a retaliação e a disposição de "endurecer a posição russa" na discussão sobre a paz, como Putin havia dito ao colega americano por telefone na segunda.

Nas imagens divulgadas pelo Ministério da Defesa, há uma cerimônia em uma base em local desconhecido na vizinha Belarus e os lançadores móveis do míssil são mostrados em estradas no meio de uma floresta. Ele são operados por soldados russos.

O míssil, cujo nome em russo significa a árvore aveleira, em si não é visto. Ele é um modelo balístico de alcance intermediário, de 550 km a 5.000 km, desenhado para guerras nucleares: emprega ao menos seis ogivas independentes, cada uma com seis submunições, como foi possível ver no ataque a Dnipro.

Naquela ocasião, não houve uso aparente de explosivos, e sim a força cinética do projetil descedo de fora da atmosfera a uma velocidade 11 vezes superior à do som, ou 13,5 mil km/h. É uma arma para a qual a Ucrânia não tem nenhum sistema capaz de interceptar.

Não fica claro de quando são as imagens divulgadas como sendo desta terça. O ditador de Belarus, Aleksandr Lukachenko, havia dito que o regimento estava ativo no dia 17 passado, sem comentários por parte da Rússia. É um balé destinado a confundir e intimidar os adversários, particularmente na Europa.

Em relação à Ucrânia, por exemplo, não faria sentido empregar o Orechnik a partir de Belarus, pois a distância entre o país e os alvos é muito curta. No ataque de 2024, ele foi lançado de uma base a mais de 1.200 km da fronteira ucraniana.

Nem Rússia, nem Belarus dizem se o regimento irá operar o míssil com ogivas nucleares, como já foi testado em exercícios. Em 2023, Putin anunciou o envio de modelos táticos, para uso supostamente limitado a campos de batalha, na ditadura vizinha.

O processo é opaco: não se sabe se elas equipam mísseis balísticos de curto alcance Iskander-M, cuja versão convencional chove sobre a Ucrânia com regularidade, ou são bombas de gravidade a serem lançadas por aviões de ataque Su-25.

Desta forma, além de gerar tensão em Kiev, como já era visível em grupos de observadores militares após a divulgação das imagens, a colocação em serviço do Orechnik também se insere na pressão da Rússia para que Trump aceite negociar a extensão por mais um ano do último tratado de controle de armas nucleares vigentes.

O chamado Novo Start expira em fevereiro, e até agora o americano não respondeu à proposta de Putin, que visa elaborar um novo texto ao longo de 12 meses, talvez incluindo outras potências nucleares.

É incerto o efeito da imagem dos caminhões com os lançadores do Orechnik em florestas escura. Quando a Rússia passou a desenvolver um míssil que os EUA consideravam violar outro tratado do fim da Guerra Fria, em 2017, Trump simplesmente abandonou o acordo.

Os dois países são as maiores potências nucleares do planeta, com cerca de 90% do arsenal de mais de 12 mil ogivas. A China vem num distante terceiro lugar, mas acelerando sua produção.