SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Polícia Civil de São Paulo realiza nesta sexta-feira (12) uma ação de busca e apreensão em endereços de lideranças do SindMotoristas (sindicato dos motoristas e cobradores de ônibus).

A investigação apura a possível infiltração da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) no sindicato. A operação busca justamente apreender materiais que sirvam de provas para reprimir a célula da organização que, supostamente, atua dentro da representação sindical. Um dos investigados é o deputado federal cassado José Valdevan de Jesus Santos, 53, o Valdevan Noventa (PL-SE).

Segundo a Polícia Civil, a investigação apontou que dentro do sindicato há várias práticas criminosas, entre elas ameaça, extorsão, apropriação indébita, lavagem de dinheiro e ocultação de bens e capitais.

Tais delitos não só prejudicariam o sindicato como acarretariam rombos aos cofres públicos, uma vez que o transporte da capital é subsidiado pela prefeitura.

"Eles exigiam dos empresários de ônibus de São Paulo, que são vítimas também de ameaças, que o fornecimento de cestas básicas, de planos de saúde, plano odontológico e outros benefícios dos trabalhadores fossem oferecidos por empresas escolhidas pelo sindicato", explicou o delegado Roberto Monteiro, titular da 1ª Delegacia Seccional Centro da capital.

"Essas empresas acabavam depois passando propinas para o presidente do sindicato, o Valdevan Noventa, e também para membros da diretoria do SindMotoristas", acrescentou o delegado.

A investigação da Polícia Civil já ocorre há dois anos anos, com levantamento de movimentações financeiras através de relatórios do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da Receita Federal.

A Polícia Civil informou ter apreendido uma lista de propinas, que cita nomes, cargos e valores que cada diretor deveria receber.

A reportagem procurou o SindMotoristas, que afirmou em nota que a entidade respeita e se coloca à disposição das autoridades para quaisquer atos que se fizerem necessários ao inquérito policial.

O sindicado se disse surpreendido com a notícia da operação e afirmou que seu departamento jurídico acompanha o caso.

"De modo preliminar, a entidade esclarece que tratam-se de apontamentos de eventuais indícios de um inquérito ainda em curso, o qual nem mesmo os investigados e seus advogados tiveram acesso. Portanto, tais respostas serão oportunamente apresentadas aos autos e aos veículos de comunicação."

Os dez mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça estão sendo cumpridos em endereços na capital e Taboão da Serra, na Grande São Paulo, e num haras em Arauá, em Sergipe, berço político de Vandevan.

Durante as buscas na residência de Valdevan, em Taboão da Serra, foram localizadas 40 cestas básicas, que deveriam ser destinadas para funcionários do sindicato. A Polícia Civil pretende ouvir o sindicalista com a intenção de saber por qual motivo os mantimentos estavam na casa dele. No local também foram localizados dinheiro, relógios e documentos.

Já no haras foram encontrados 50 cavalos de raça, sem qualquer tipo de documentação, conforme a polícia.

A operação denominada Chapelier é coordenada pela 1ª Delegacia Seccional Centro. O nome é uma referência à Lei de Le Chapelier, aprovada no início da Revolução Francesa, 14 de junho de 1791, com a intenção de proibir os sindicatos de fazerem greve ou ações que causassem dano à sociedade.

QUEM É VALDEVAN NOVENTA

Valdevan Noventa se tornou motorista de ônibus no fim da década de 1980 em São Paulo. Em 2000, foi eleito secretário-geral do SindMotoristas e, em 2003, assumiu a secretaria de finanças da entidade, onde ficou por uma década.

Em 2018, Valdevan foi eleito deputado federal por Sergipe e se licenciou da presidência do sindicato. Em março deste ano, foi cassado por suspeita de abuso de poder econômico durante a campanha eleitoral.

Segundo o processo que provocou a cassação do mandato, integrantes da equipe de Valdevan aliciaram dezenas de moradores de Estância e Arauá, em Sergipe, para simular doações ao então candidato.

"O perfil dos doadores era incompatível com o valor doado, uma vez que vários eram beneficiários do programa Bolsa Família e alguns deles confirmaram ter apenas emprestado o número do CPF para operação financeira", disse o TSE ao divulgar a cassação.

Foram feitas mais de 80 doações de R$ 1.050 na mesma agência bancária, o que despertou o alerta sobre a possibilidade de fraude. O Ministério Público Eleitoral ajuizou uma ação de investigação que confirmou a irregularidade.

Valdevan afirma ter sido o único deputado federal eleito por Sergipe a não receber recursos dos fundos partidários ou eleitoral. "Com isso, as doações realizadas após as eleições foram para cobrir as dívidas da campanha, sem qualquer intenção de ferir as regras eleitorais", disse.

Em junho deste ano, o ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu a cassação de Valdevan, alegando que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não havia publicado a decisão dos ministros da corte eleitoral, impedindo a defesa do deputado de apresentar recurso.

Mas a decisão de Nunes Marques foi revertida pela Segunda Turma do Supremo, mantendo a cassação.

EMPRESAS DE ÔNIBUS

Em junho, duas operações realizadas pela Polícia Civil de São Paulo no intervalo de uma semana revelaram a suposta ligação de duas empresas de transporte público da capital com criminosos da facção PCC. Elas não são, porém, as únicas companhias contra as quais pesam suspeitas.

De acordo com integrantes da Polícia Civil, do Ministério Público e do setor de transporte público ouvidos pelo jornal Folha de S.Paulo na ocasião, ao menos outras duas empresas, com contratos com o município, são suspeitas de terem elos com a quadrilha. Somadas, elas são responsáveis pelo transporte de cerca de 840 mil passageiros ao dia na capital, segundo dados da SPTrans de 2022.

Esse contingente representa cerca de 12% de todos os passageiros do sistema público na capital diariamente, de um total de cerca de 7,2 milhões ao dia, em média, e uma frota de 11.925 ônibus.

Procurada sobre a operação desta sexta, a Prefeitura de São Paulo, por meio da SPTrans, afirmou estar à disposição da polícia para colaborar no que for necessário.

Através de um comunicado, o SPUrbanuss (sindicato patronal da categoria) disse manter uma relação estritamente institucional com o sindicato dos motoristas, sem ter o que se pronunciar sobre o assunto.


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