SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Pesquisadores de Inglaterra, França, Alemanha, Holanda e Itália propõem um método para subdividir as pessoas com TEA (transtorno do espectro autista). Em estudo publicado na última quarta-feira (17) na revista científica Science Translational Medicine, o grupo sugere que avaliar a maneira como o cérebro reage a rostos pode ajudar a prever o desenvolvimento das habilidades sociais e a diferenciar grupos de pacientes.

Atualmente, o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), documento da Associação Americana de Psiquiatria utilizado como padrão por profissionais de saúde, divide o TEA em três níveis de gravidade, de acordo com a capacidade de comunicação e com os padrões de comportamento. Os pesquisadores querem ir além e oferecer uma classificação que ajude a antever o prognóstico.

"Nossa capacidade de predizer como as habilidades irão se desenvolver em uma pessoa autista é muito limitada. A subdivisão apresentada no DSM reflete as necessidades atuais de cuidado, então tem uma boa utilidade clínica por determinar como a pessoa está no momento da avaliação. Contudo, esses níveis não indicam como suas habilidades e dificuldades vão mudar no decorrer do tempo", afirma Emily Jones, pesquisadora da Universidade de Londres e uma das autoras do trabalho.

"Em nosso estudo tentamos encontrar marcadores de prognóstico, sinais que possam ajudar a predizer como a pessoa provavelmente estará no futuro. Isso pode ajudar no planejamento do tratamento", complementa.

Uma em cada 160 crianças tem transtorno do espectro autista, segundo a Opas (Organização Pan-Americana da Saúde), enquanto o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) americano estima uma em cada 44. No Brasil, o total de casos na população poderá ser conhecido após a análise dos dados do Censo 2022, já que pela primeira vez o IBGE inclui uma questão sobre o transtorno no questionário.

Trata-se, na definição do Ministério da Saúde, de um distúrbio caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interac?ão social, assim como padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados.

Tais características, porém, variam entre os pacientes. Enquanto alguns podem viver de forma independente, outros necessitam de cuidados, daí a importância de estratificar o conjunto em subgrupos mais homogêneos ?algo que os pesquisadores sugerem fazer a partir da resposta neural a rostos.

Os cientistas avaliaram a maneira como o cérebro das pessoas reagia a ser exposto a fotos de rostos. Foram utilizados os dados de 436 participantes entre 6 e 31 anos, sendo 246 com autismo e 190 sem o transtorno.

A partir de eletroencefalogramas, eles mediram e compararam o N170, pico de atividade elétrica que indica a resposta cerebral a estímulos visuais. Como indicavam estudos anteriores, eles verificaram que o tempo de resposta das pessoas com transtorno do espectro autista é maior, ou seja, que elas têm reações mais lentas quando expostas a rostos.

O grupo então combinou esses resultados a medições de ressonância magnética, pontuações de risco genético e aplicações de escala de comportamento. Foi observado que a latência no N170 está associada a diferentes padrões de ativação de uma região do cérebro chamada giro fusiforme e a um maior risco poligênico para transtorno do espectro autista.

Os cientistas também notaram que a variação na resposta aos rostos está associada a diferentes pontuações em um teste que analisa a socialização, permitindo identificar um subgrupo com respostas sociais mais lentas e prognóstico social desfavorável, que poderia se beneficiar com estratégias de cuidado diferenciadas.

"Descobrimos que um marcador cerebral específico, o N170, que reflete a velocidade de resposta do cérebro aos rostos, estava relacionado a mudança nas habilidades sociais cotidianas ao longo de 12 a 18 meses", diz Jones. "Descobrimos ainda que essa relação era particularmente forte em um subgrupo de pessoas autistas que apresentavam um padrão particular de respostas cerebrais a rostos."

Segundo Jones, essa resposta poderia ser usada como parte de uma avaliação para fornecer ao indivíduo mais informações sobre como suas habilidades sociais cotidianas podem mudar naturalmente com o tempo e para ele decidir se deseja se envolver em intervenções destinadas a ajudar na dinâmica social diária.

Os pesquisadores defendem que o N170 atende aos critérios básicos para consideração como um fator de estratificação para o transtorno. Eles ressaltam, contudo, que são necessárias mais pesquisas para reforçar esse entendimento e para aplicar a medição em uma classificação que permita estratégias de cuidado direcionadas.

"Precisamos confirmar os resultados em outras amostras e trabalhar para compreender por que as diferenças nesse marcador estão relacionadas ao comportamento social", diz a pesquisadora. "Por fim, precisamos trabalhar com pessoas autistas para delinear melhores formas de medir seus 'resultados' e garantir que o que estamos medindo é importante para a comunidade."


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