SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Aproximadamente, uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil. Uma média de 4.200 mulheres são assassinadas a cada ano. Em mais de 70% desses casos, o suspeito é seu parceiro. [...] Nós sentimos vontade de rasgar o cara ao meio, baixando-lhe o sarrafo." Os dados, que chamam a atenção para o feminicídio, foram apresentados em uma rede social por Thiago Brennand Fernandes Vieira, 42, em 2019.

Brennand é o empresário que ficou conhecido no mês passado após agredir a modelo Alliny Helena Gomes, 37, durante discussão em uma academia de ginástica na zona oeste de São Paulo. Ele também é investigado sob a suspeita de 11 crimes sexuais pelo Ministério Público de São Paulo, que começou na segunda (26) a ouvir as mulheres que o acusam.

A defesa de Brennand afirma que as agressões verbais na academia foram iniciadas pela modelo e que ele pediu desculpas por "qualquer excesso cometido ao reagir às ofensas". Ele nega ao menos um caso de agressão sexual e diz que a acusação é "absolutamente inverossímil".

No Facebook, ele costuma postar fotos de viagens, opiniões políticas, desabafos sobre a vida e comentários sobre jiu-jítsu e hipismo, seus hobbies --na conta, o post mais recente é de 2020.

A maioria das publicações é dividida em duas partes, uma em inglês e outra em português. Desde que seu nome entrou no noticiário, usuários passaram a postar comentários com xingamento a ele na página.

Ainda sobre violência contra mulher, o empresário fez uma postagem na qual lista como as pessoas devem lidar com essas situações. Entre as orientações estão "não banque o herói e tente quebrar o cara. Muitas vezes, você pode ser tornar o vilão" e "só interfira se tiver uma chance clara de evitar um assassinato".

Nos posts políticos, ele faz algumas críticas ao presidente Jair Bolsonaro (PL), como no início da condução da pandemia e no caso de Fabrício Queiroz, pivô da acusação contra o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no caso das "rachadinhas". Em outros momentos, porém, o elogia.

Brennand já escreveu que os ataques que o presidente sofre são a repetição da sua vida: "fake news, haters, traições [...]." Em outro, de maio de 2020, afirma não ter "político de estimação", poucos dias após o ex-juiz Sergio Moro pedir demissão do Ministério da Justiça e deixar o governo. E afirma: Bolsonaro "é o melhor presidente que já vi nos meus tempos'' [...] Infelizmente, seu perfil engasga a máquina, engessa o sistema".

Até 2019, o nome completo dele era Thiago Fernandes Vieira. Porém, após um processo, ele adicionou sobrenomes e se tornou Thiago Antonio Brennand Tavares da Silva Fernandes Vieira. O motivo da mudança ele explica também em um post.

"Nasci sem nenhum sobrenome das famílias de minha mãe. Agora, o que eu fiz foi tomei a medida de pedir judicialmente para adicioná-los ao meu nome", escreveu. Apesar do comentário, sua mãe na verdade também não tem Brennand no sobrenome.

O suspeito de crimes é de uma família tradicional do Recife, e, segundo o primo Jason Vieira, nunca trabalhou. De acordo com advogados, seu patrimônio é avaliado avaliado em R$ 200 milhões.

Jason explica que a família é de origem paraibana e que o avô "fez dinheiro comprando terras, gado, vendendo leite e investimentos imobiliários". Os filhos foram estudar no Recife, e o avô passou a investir em hospitais.

A família, por meio do Grupo Fernandes Vieira, vendeu em 2016 o hospital Santa Joana ao UnitedHealth Group, que faz parte do Americas Serviços Médicos, e o Memorial São José para a Rede D'Or.

"Todos os filhos do meu avô estão muito bem de vida e todos têm um padrão altíssimo de vida. A única questão obscura da minha família é esse herdeiro profissional, que ganhou dinheiro da parte do pai e da família que ele tanto despreza", disse Jason à reportagem.

Apesar da fortuna, Brennand responde a processos por inadimplência. Um deles é o de um clube de elite de São Paulo, que o acusa de não ter pago a mensalidade por sete meses em 2013.

Na ação, a defesa argumenta que o motivo foi a mudança de Brennand para a Suíça "por motivos pessoais, relacionados à segurança pessoal". Por isso, ele não teria recebido as cobranças.

Brennand tem, ao menos, um CNPJ em seu nome, da TFV Administradora de Imóveis, cuja principal atividade é a gestão e administração da propriedade imobiliária e encontra-se com a situação cadastral ativa.

ESPORTE E CONFUSÃO

Nas redes sociais, Brennand também compartilhava reclamações sobre hipismo e jiu-jítsu.

Em um momento, ele admitiu que usava cavalos de forma contraindicada. "O cavalo não deve saltar mais de 2 a 3 vezes na semana (eu muitas vezes quebrei essa regra)", escreveu ele, que ainda reclamou que os profissionais do meio "têm várias maneiras de ganhar dinheiro".

Já sobre o jiu-jítsu, ele escreveu, em 2019, que tinha quase 25 anos de prática com o esporte e reclama das academias de em São Paulo. "Aqui e acolá, estou eu, vez após vez envolvido em confusão, puto com algum professor lixo desses por aí ou com algum grupelho de alunos sem caráter."

No mesmo post em que admite se envolver em confusões, ele diz ainda que sempre se torna o vilão de histórias em que, na verdade, "foi o herói".

Em outro momento, ele pede desculpas pela demora para agradecer àqueles que lhe desejaram feliz aniversário. E, diz, que andou um pouco fora do ar. "Estive empenhado em uma série de assuntos, sendo um deles assunto de filho, o que nos toma de assalto."

O post é feito seis dias depois da ex-mulher de Brennand, Andressa Goes Agra Marques, declarar em 2020 à Justiça que o relacionamento deles era abusivo e que ele a agrediu fisicamente.

Na ocasião, ela afirmou que o filho deles, que hoje tem 16 anos e vivia com o pai, a procurou por meio das redes sociais para pedir socorro. O jovem afirmou à época que Brennand batia nele constantemente desde os quatro anos.

Procurado, o Ministério Público de Pernambuco informa que, poucos dias depois, a queixa foi retirada pelo denunciante. Por isso, o procedimento tramitou apenas na delegacia, não tendo sido encaminhado inquérito policial sobre o caso.

A Folha tentou contato com os dois novos advogados que representam Brennand, Ricardo Sayeg e Ronaldo Oliver, porém ambos disseram que não comentariam os casos envolvendo o empresário.

Para além de críticas políticas, esportivas e questões familiares, ele também alimentava a página com posts enigmáticos, caso de um texto em que ele reflete sobre a mudança da personalidade das pessoas ao longo da vida.

"Como a mentira vai sendo disseminada para os que não têm sabedoria dos bastidores. [...] Viver é realmente difícil, como bem notou [Oscar] Wilde. A maioria apenas existe."


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