SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Duas operações desencadeadas na região da cracolândia do centro de São Paulo resultaram nesta semana na detenção de 53 pessoas que consumiam crack na rua, das quais cinco aceitaram ser internadas. A estratégia é criticada pela Defensoria Pública, que vê violação de diretos nas ações.
A Polícia Civil e a GCM (Guarda Civil Metropolitana) efetuaram as operações na quarta (5) e na quinta-feira (6). Em ambas, os agentes levaram os dependentes para o 77° DP (Santa Cecília), onde registram-se termos circunstanciados, uma espécie de boletim de ocorrência para casos de menor potencial ofensivo.
A reportagem acompanhou, no final da tarde de quarta, a operação efetuada no fluxo -como é chamada a concentração de dependentes químicos- da rua Helvétia, a poucos passos da delegacia.
Naquele dia, 42 homens e mulheres foram parar no DP. Segundo a prefeitura, quatro pessoas aceitaram ser encaminhadas para o Hospital Cantareira, na zona norte da capital, onde seriam internadas para o processo de desintoxicação. As demais foram liberadas após a assinatura do termo circunstanciado.
No dia seguinte, quinta-feira, outras 11 pessoas foram submetidas ao mesmo processo: passaram pela delegacia e, depois, seguiram para o centro de atendimento da prefeitura. Após avaliação, uma delas aceitou ser internada.
Segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), depois de ser detido, o usuário de drogas tem como destino o Caps (Centro de Atenção Psicossocial) localizado em frente à praça Princesa Isabel, no centro da cidade. Lá, realiza-se uma avaliação clínica para definir se a pessoa será encaminhada para atendimento de urgência ou emergência, ambulatorial ou internação.
A fase da Operação Caronte de concentrar-se em viciados que utilizam drogas pelas ruas do centro de São Paulo teve início em 20 de setembro. Desde então, 149 pessoas abordadas foram encaminhadas pela Polícia Civil para avaliação dos profissionais da prefeitura.
De acordo com o município, desde agosto, 71 pessoas foram internadas por meio do programa Redenção no hospital da zona norte. Duas delas de forma involuntária. No entanto, menos da metade dos pacientes continua em tratamento. Atualmente, há 33 pessoas internadas no Hospital Cantareira.
O secretário-executivo de Projetos Estratégicos do município, Alexis Vargas, celebrou os números, no que considera uma nova forma de atendimento.
"Os resultados são muito positivos, pois é mais uma porta de entrada para as pessoas receberem tratamento. 100% dos casos são avaliados pelas equipes de saúde e são encaminhados para tratamento, seja internação ou atendimento ambulatorial nos Caps Álcool e Drogas", afirmou ele.
"O número de internações dos casos encaminhados pela Polícia Civil varia conforme o dia, pois depende da avaliação clínica das pessoas encaminhadas. Teve dias em que esse percentual atingiu 62%", acrescentou Vargas.
Entidades e profissionais que atuam na cracolândia criticam a medida. Para eles, o método utilizado, com uso da força policial, com agentes portando armas de grosso calibre, não é a forma correta para abordar viciados.
"Acho que é mais uma estratégia de gerar 'dor e sofrimento' para forçar as pessoas a aderirem ao tratamento", afirmou a defensora pública Fernanda Balera, do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos. "Na nossa visão, viola direitos. Qual a voluntariedade de uma internação cuja abordagem é feita pela polícia? Há um procedimento específico para intervenções como essa na área da saúde, e ela não deve ser feita por agentes de segurança pública."
O psiquiatra e palhaço Flávio Falcone, que atua há mais de 15 anos com trabalhos na área de redução de danos, com foco na cracolândia, segue a mesma linha de raciocínio, ao afirmar que as ações de triagem feitas pela Polícia Civil afastam os usuários do tratamento. Ele relatou que nunca tinha visto uma ação semelhante.
"O mais importante para eficácia do tratamento é o vínculo que se cria com os profissionais da saúde. Esse é um vínculo perverso. Não vejo como dar certo", disse.
Falcone, inclusive, foi detido em 1° de setembro enquanto realizava atividades no fluxo da Helvétia com seu projeto Teto, Trampo e Tratamento. Uma bicicleta com uma caixa de som acoplada, que ele e sua equipe utilizavam, foi apreendida.
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