SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A demora para a finalização de um tratado de extradição entre Brasil e os Emirados Árabes Unidos pode atrasar a extradição do empresário Thiago Brennand, 42, preso nesta quinta (13) em Abu Dhabi. Ele era considerado foragido das autoridades brasileiras após ter a prisão preventiva decretada no mês passado.
O tratado de extradição entre os dois países foi assinado pelos governos do Brasil e dos Emirados Árabes em março de 2019, mas, desde então, tramita pela Câmara dos Deputados. Só quando passar pelo Legislativo é que será sancionado pela Presidência da República.
Assim, segundo especialistas, o Brasil deverá recorrer a vias diplomáticas ou a um acordo de princípio de reciprocidade com os Emirados Árabes --neste caso, o governo brasileiro teria de fazer o mesmo se houver um pedido de extradição do outro país.
"Observando, por óbvio, o que foi negociado no tratado, mas que ainda não está em vigor no Brasil", afirma o advogado Rui Aurélio de Lacerda Badaró, integrante da Comissão de Relações Internacionais da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil) em São Paulo, sobre um acordo.
No texto assinado pelo governo e que tramita no Legislativo, há o compromisso, por exemplo, de não sujeitar a pessoa extraditada à pena de morte.
Segundo Badaró, se não houver entraves, o processo de extradição poderá exigir de 3 a 6 meses para ser concluído. Porém, se surgirem dificuldades pelo caminho, esse tempo poderá passar de um ano.
Evandro Menezes de Carvalho, professor de direito internacional da FGV Direito Rio, é mais otimista. Como é uma questão que não envolve crimes políticos, há um pedido de prisão preventiva de caso ocorrido no Brasil, e com um brasileiro, o processo de extradição pode até ser concluído até o fim deste ano. "São elementos muito fortes", diz.
Pelo fato de os países já terem um tratado assinado em vias de ser concluído, o professor da Fundação Getulio Vargas diz acreditar que ocorra um acordo diplomático.
Brennand viajou para Dubai em 4 de setembro, horas antes de ser denunciado pelo Ministério Público de São Paulo sob a suspeita de lesão corporal e corrupção de menores --ele teria incentivado o filho adolescente a ofender uma modelo, segundo os promotores.
Procurada nesta sexta (14), a defesa dele, que nega os crimes, disse que não tem nada a declarar.
De acordo com os advogados Badaró e Carvalho, a Justiça paulista deverá mandar toda a documentação --mandado de prisão preventiva e as denúncias do Ministério Público-- traduzida para o Ministério da Justiça e Segurança Pública.
A partir daí, cabe ao DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), da Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania, analisar a admissibilidade da documentação. Na sequência, o governo brasileiro pede a extradição aos Emirados Árabes.
Questionado sobre o processo de extradição de Brennand, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse não comentar processos em andamento.
O pedido de extradição deve ser formalizado pelas autoridades brasileiras no prazo previsto em tratado ou em convenção, ou ainda no prazo concedido pela autoridade local. Em regra, segundo Badaró, a partir da efetivação da custódia ou da data de notificação da embaixada brasileira no local requerido
"Caso o pedido não seja formalizado, o indivíduo poderá ser colocado em liberdade no país requerido e outra solicitação de prisão preventiva somente será aceita após a formalização do pedido extradicional", afirma.
Segundo o advogado paulista, se for autorizada a extradição, as autoridades brasileiras deverão retirar o preso do território estrangeiro no prazo previsto na data estipulada pelo governo local.
"Caso não se promova a sua retirada, no prazo estabelecido, o indivíduo poderá ser colocado em liberdade no país requerido, não sendo possível solicitar novamente a extradição dessa pessoa fundamentada nos mesmos motivos apresentados na extradição que foi perdida", explica.
OS CRIMES
Brennand ficou conhecido em setembro após agredir a modelo Alliny Helena Gomes, 37, durante discussão em uma academia de ginástica na zona oeste de São Paulo.
Além disso, entre os supostos ataques investigados pela Promotoria estão de estupros a rituais para tatuar as vítimas com as iniciais do próprio nome, o mesmo acrônimo usado pelo empresário para marcar objetos.
A maior parte da lista de vítimas foi encaminhada ao Ministério Público pelo escritório de advocacia Janjacomo e por representantes do projeto Justiceiras, que trabalham juntos neste caso.
Segundo as entidades, as supostas vítimas relatam situações parecidas envolvendo o empresário, cárcere privado, sexo sem camisinha, agressões físicas e verbais, "stalking" (perseguição), além da marcação nas vítimas das iniciais TFV, de Thiago Fernandes Vieira.
Nesta sexta, o Ministério Público paulista formalizou uma segunda denúncia contra Brennand, agora relacionada a esses novos relatos. A Promotoria de Porto Feliz (a 118 km de São Paulo), que pediu a decretação de nova prisão preventiva, afirma que ele cometeu em uma mesma vítima cinco crimes: estupro, cárcere privado, tortura, lesão corporal de natureza gravíssima e coação no curso do processo.
No mesmo caso, ele também foi denunciado por suspeita de cometer três constrangimentos ilegais, quatro ameaças, registro não autorizado da intimidade sexual e oito divulgações de cena de estupro ou sexo.
A defesa do empresário sempre negou as acusações. Em vídeo publicado na internet, Brennand negou que estivesse fugindo. "Eu tô tranquilíssimo. Tinha algumas opções de países para onde ir", diz, sem especificar em qual país está. "Estou tranquilo onde estou. Não estou fugindo. Prisão ilegal? Quem que vai se submeter a um Estado de exceção?"
"Vocês mexeram com a pessoa errada. [...] Vocês morrem de inveja. Branco, heterossexual inegociável. Armamentista, óbvio. Conservador, sempre", completa.
O empresário afirma que as acusações fazem parte de uma conspiração contra ele e que a maioria das denúncias de crimes de estupro no Brasil é falsa.
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