SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os candidatos eleitos em 2 de outubro somam R$ 23,8 milhões em multas ambientais, mostra levantamento da Folha com base em dados do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

O PL, sigla pela qual o presidente Jair Bolsonaro concorre à reeleição, o PSD e o União Brasil lideram em número de vencedores da corrida eleitoral que foram multados nos últimos anos. Os três partidos elegeram, cada um, cinco candidatos com infrações ambientais.

Ao todo, foram eleitas 34 pessoas que receberam 75 multas do Ibama nos últimos 20 anos. O número ainda pode aumentar, considerando a disputa do segundo turno.

As maiores fatias dessas multas estão entre os deputados estaduais (21) e federais (10), que são, ao mesmo tempo, os cargos com as maiores quantidades de candidaturas.

A reportagem cruzou dados de autuações ambientais desde 2003 (atualizados no banco de dados do Ibama até agosto) com os de candidatos que disputaram os cargos de deputado (estadual, distrital e federal), senador, governador, vice-governador, presidente e vice-presidente na atual eleição. Os valores das multas aplicadas foram corrigidos pela inflação.

Para evitar erro na contagem, foram descartadas multas múltiplas registradas exatamente no mesmo horário. Nesses casos, somente uma delas foi contabilizada.

Concorreram aos cargos eletivos 163 candidatos que acumulam 277 autuações --uma soma de R$ 81,6 milhões. O PL liderou no número de candidaturas com multas, com 18 nomes. Em seguida, no ranking, aparecem União Brasil (15), PSD (14), MDB (13) e PP (13).

Os partidos foram procurados pela Folha. Somente PSD e MDB se manifestaram.

O PSD disse, em nota, que "todas as candidaturas são responsáveis por apresentar as informações exigidas para o cumprimento da legislação eleitoral vigente". Multas ambientais não impedem a candidatura.

O MDB, também em nota, citou a criação do Ministério do Meio Ambiente, estruturado com o nome de Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, durante o governo de José Sarney, que pertencia ao PMDB.

"Essa postura histórica explica por que apenas 0,9% dos atuais candidatos [do partido] têm antecedentes nesse sentido no período de quase duas décadas. Ainda assim, todos precisam ser responsabilizados individualmente dentro da lei", afirma o partido.

Ilegalidades na Amazônia Legal dominam a lista das autuações, tanto entre eleitos quanto entre todos os candidatos multados que disputaram o pleito. Os maiores valores de infrações encontradas pela Folha são de casos ocorridos no Pará, em Mato Grosso e no Amazonas.

Entre os eleitos multados, há um senador e dois governadores. Ainda em disputa no segundo turno, há também um candidato ao governo estadual e o próprio presidente Bolsonaro, que foi autuado em cerca de R$ 18 mil por pesca ilegal em 2012.

A multa de Bolsonaro prescreveu em 2018, "em razão da superficialidade da descrição dos fatos ocorridos", segundo manifestação técnica do Ibama.

O senador multado eleito é Jaime Bagattoli (PL-RO), autuado em 2003 e 2004 por desmatamento e transporte de madeira sem a documentação necessária. Ele não retornou às tentativas de contato da reportagem até a publicação.

Já os dois governadores em questão são Helder Barbalho (MDB-PA) e Antonio Denarium (PP-RR), reeleitos em seus estados.

Barbalho foi multado pelo Ibama em 2012, quando era prefeito de Ananindeua (PA), por lançamento indevido de resíduos urbanos. Tratava-se de um caso associado ao lixão do Aurá, no qual o prefeito de Belém à época também foi autuado.

Procurada, a assessoria de Barbalho afirmou que a autuação foi equivocada e que o Ibama teria determinado a retirada do nome da multa e reconhecido a prescrição.

"O auto de infração foi instaurado sem observar as formalidades necessárias, pois foi lavrado em nome e CPF de Helder Barbalho, quando na verdade seria de responsabilidade do órgão, qual seja, a Prefeitura de Ananindeua", diz a nota.

Denarium, por sua vez, foi multado em 2018 por desmatamento. Ele não retornou aos contatos da reportagem.

Já no segundo turno para o governo de Alagoas, encontra-se Paulo Dantas (MDB), multado, em 2019, por desmatamento de caatinga sem autorização e, em 2020, pela ausência de informações ambientais em uma fazenda.

Dantas, recentemente, foi afastado do cargo de governador por causa da Operação Edema. Investigadores afirmam que o governador fez uso de funcionários fantasmas em seu gabinete.

Procurada pela Folha, a assessoria de Dantas afirmou que "as multas ambientais referidas possuem nulidades, inconsistências e, inclusive, discussão de minha ilegitimidade [de Dantas], todas já demonstradas nas respectivas defesas apresentadas ao órgão ambiental, estando, nesta data, pendentes de julgamento".

Entre os eleitos, o maior valor em multas pertence a Affonso Cândido (PL-RO), que se elegeu deputado estadual e é ex-prefeito de Ji-Paraná (RO). Ele tem quatro autuações, de 2016 e 2019, por desmatamento e por desrespeitar área embargada pelo Ibama. Elas somam pouco mais de R$ 9,1 milhões.

Um processo que corre na Justiça Federal do Amazonas contém documento que mostra a venda da área envolvida nas autuações por desmatamento, datado de novembro de 2015 --anterior, portanto, às multas. À Folha o advogado do novo dono da propriedade confirmou a venda. Também procurado, Cândido não respondeu.

No processo, o novo dono, em interrogatório, afirma que arrendava a terra para criação de gado de outras pessoas.

O segundo lugar no ranking é de Ondanir Bortolini, o Nininho (PSD-MT), que soma R$ 3,1 milhões em multas. Ele foi reeleito deputado estadual por Mato Grosso.

Em 2007, Nininho recebeu multas por desmatamento de mais de 400 hectares de Amazônia em fazenda em Novo Progresso (PA), e queimada, além de destruição de APP (área de preservação permanente), às margens de um rio. Foi autuado ainda por construção de barragem sem autorização.

A Folha procurou o candidato por telefones associados a sua campanha e por rede social, mas não houve retorno.

Na terceira colocação, está Thiago Araújo (Cidadania-PA), eleito deputado estadual, com R$ 2,4 milhões em multas. Ele recebeu autuações em 2021 e 2022 por danificar APP e destruir vegetação na Reserva Extrativista Marinha Cuinarana (PA).

Procurado, Araújo respondeu por meio de advogados. "Em momento algum reconheço a existência de qualquer dano", diz em nota.

Os representantes afirmam ainda existir uma "discussão técnica de georreferenciamento, delimitação da APP e processual envolvendo o ICMBio e o MPF". Eles entendem que a área está fora da APP.

Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas no Observatório do Clima, rede de organizações que tratam de questões climáticas, destaca que o Congresso tem feito tentativas de flexibilizar as regras de proteção do meio ambiente e dos direitos socioambientais.

"A narrativa geral no Congresso é de flexibilização e de apoio a propostas legislativas que desconstroem tudo aquilo que temos de normas protetivas. É a proposta da lei da grilagem, o projeto do governo que libera o garimpo em terras indígenas, o projeto de lei sobre licenciamento ambiental que implode a legislação atual, a proposta da lei dos agrotóxicos", exemplifica.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.


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