SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A poucas semanas dos principais vestibulares do país, estudantes do 3º ano do ensino médio e de cursinhos têm sido diagnosticados com burnout e tido crises de ansiedade por excesso de estudo.

Com receio de não terem aprendido o que deveriam durante o período de suspensão das aulas presenciais na pandemia, eles têm aumentado a carga horária de estudos na tentativa de compensar as possíveis perdas. O resultado, no entanto, tem sido o aumento do estresse e da sensação de esgotamento.

Diretores e coordenadores de quatro cursinhos e escolas particulares de São Paulo relataram à Folha de S.Paulo que a ansiedade dos alunos com a proximidade dos vestibulares está maior que em anos anteriores. Também contam ter tido até mesmo o afastamento de jovens com sintomas de esgotamento mental.

Diretor do Laboratório de Redação, Adriano Chan, tem seu curso procurado principalmente por estudantes que querem entrar nos cursos mais concorridos das principais universidades públicas do país. Acostumado a ajudar os alunos a lidar com a ansiedade desse período, ele conta ter se surpreendido com os afastamentos por problemas de saúde mental.

Dos 350 alunos matriculados em seu curso neste ano, 12 se afastaram das aulas nos últimos meses por recomendação médica.

"Tem alunos que começam a ter crises de choro em sala de aula por causa do cansaço. Eles estão exaustos, mas não conseguem parar para descansar porque sentem que precisam correr atrás do prejuízo de dois anos", diz.

Chan avalia que a sobrecarga dos estudantes não é causada só pela autocobrança, mas resultado também do excesso de aulas e conteúdos que as escolas passaram a dar neste ano.

Além dos programas de reforço para repor o conteúdo, os colégios tiveram que aumentar a carga horária para se adequar ao novo ensino médio -a lei prevê o aumento de 25% do tempo de aula.

"As escolas aumentaram o número de aulas, porque são obrigadas pela lei e também aumentaram o conteúdo porque tiveram que voltar em pontos que os alunos não aprenderam durante a pandemia. O resultado foi excesso e exaustão. O aluno fica sem tempo para assimilar o que está sendo ensinado", diz.

Uma aluna de 17 anos contou à Folha de S.Paulo que se afastou por uma semana do colégio por recomendação do psicólogo. Além das nove horas que passava na escola, ela estudava mais cinco horas ao chegar em casa por achar que não estava conseguindo acompanhar os colegas. Ela quer fazer medicina em uma universidade pública.

Os pais começaram a se preocupar com a situação quando ela passou a se recusar a jantar com a família para "não perder tempo de estudo". Nos últimos três meses, ela perdeu seis quilos e começou a ter dores de cabeça e insônia.

Quando começou a fazer terapia, o psicólogo disse que ela tinha sintomas de burnout e pediu para reduzir o tempo de estudo e tentar fazer outras atividades. A jovem, no entanto, diz que a tentativa a deixou ainda mais ansiosa por estar "desperdiçando o pouco tempo antes do vestibular".

Com os sintomas ainda mais agravados, a psicóloga recomendou à família que a menina se afastasse da escola por um período para que pudesse se recuperar.

A psicóloga Mara Rossi, que há 15 anos trabalha com adolescentes em fase pré-vestibular, diz que uma certa ansiedade e angústia são características dessa fase da vida, mas avalia que o contexto atual agravou a situação.

"Depois da pandemia, parece que eles estão o tempo todo se cobrando para recuperar o que perderam nesses dois anos, sem poder descansar ou curtir outras experiências dessa fase da vida. Seria natural se o foco não estivesse só nos estudos, na preocupação com alcançar metas", avalia.

Ela conta que tem recebido muitos pacientes com sintomas de burnout por estarem sobrecarregados com as atividades que fazem para se preparar para os vestibulares.

"São alunos de escolas tradicionais de São Paulo, que têm aula quase em período integral, ainda fazem reforço, aula extra. Eles não estão vivendo a adolescência, não chegaram nem à vida adulta e já estão estafados, exaustos de tanta cobrança e expectativa."

Uma adolescente de 17 anos contou que está fazendo acompanhamento psicológico desde abril depois de ter tido crises de ansiedade. Mesmo em tratamento, ela segue estudando 14 horas por dia e na última semana teve uma crise de choro na escola por não conseguir resolver um exercício.

Ela está no 3º ano do ensino médio e conta que sempre foi bem em química, inclusive é do time da escola que compete nas olimpíadas nacionais da disciplina. A menina disse que sempre acerta ao menos 80% das questões, mas, ao começar os exercícios e ver que tinha errado a primeira pergunta, sentiu como se não soubesse nada.

Maria Luiza Guimarães, diretora do Colégio Objetivo, na região central de São Paulo, diz que desde o início do ano os alunos estão mais apreensivos e ansiosos do que costumava acontecer em turmas anteriores.

"Dos três anos do ensino médio, eles passaram quase dois anos em casa, com o convívio social limitado. É natural que tenham mais dificuldade, mais preocupações. A maioria foi se habituando ao longo do ano, mas alguns ainda sofrem para lidar com a pressão que é inerente dessa fase."

Renata Lourenço, orientadora das turmas de 3º ano do colégio Bandeirantes, também avalia que o período de afastamento da escola fez com que os alunos tivessem menos maturidade para lidar com essa fase da vida.

"Não é só sobre o vestibular, mas o que ele representa. É a transição da juventude para a vida adulta, é um processo seletivo altamente competitivo. Então, eles se cobram muito como se a aprovação fosse definir todo o seu futuro. Sempre foi difícil, mas agora eles estão mais fragilizados por tudo o que aconteceu nos últimos dois anos", avalia.

Ainda que reconheça a pressão das famílias pelo desempenho dos filhos na escola e no vestibular, Lourenço diz que a principal cobrança parte dos próprios jovens. Ela conta que a escola tem feito um trabalho para que os alunos tentem repensar o que é prioridade.

Uma aluna, de 17 anos, do colégio contou que desistiu de estudar para Enem e Fuvest depois de ter tido várias crises de pânico e ansiedade. A adolescente diz que, com o excesso de aulas e trabalhos, estava sempre com a sensação de não conseguir acompanhar o conteúdo.

Ela começou a ter insônia, dor de cabeça e perda de apetite. A situação se agravou tanto que ela teve esofagite e passou a se automutilar. Para não prejudicar ainda mais sua saúde, ela conversou com os pais e disse que não manteria mais o mesmo ritmo de estudos de antes e eles a apoiaram. Agora, ela estuda para concluir o ensino médio, sem a pressão de ser aprovada em uma universidade pública.


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