SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Polícia Civil investiga o paradeiro de um homem de 36 anos que teria desaparecido após embolsar quase R$ 1,2 milhão de pessoas que frequentavam uma mesma paróquia em São José do Rio Preto (SP).
Entre as possíveis vítimas está o próprio padre responsável pela igreja, que teria transferido R$ 300 mil ao suspeito, motivado pela promessa de receber um rendimento mensal de 3% ao mês.
O homem conhece o padre há mais de dez anos. Foi o religioso, inclusive, quem celebrou o casamento dele e batizou duas filhas do suspeito.
Em 2020, o suspeito convidou o padre para realizar um treinamento em seu escritório, a Bora Trader Intermediação e Promoção de Vendas LTDA, no interior paulista, com o objetivo de aprender a operar no mercado financeiro. No site, que ainda está ativo, há planos de mentoria que chegam a custar R$ 9.990.
Após três meses de curso, o padre informou ao instrutor que não teria tempo para as operações, nem habilidade. O suspeito, então, se ofereceu para operar com o dinheiro do padre, que em junho de 2020 fez o primeiro depósito, no valor de R$ 200 mil. Por um ano, o padre recebeu, mensalmente, R$ 6.000.
Satisfeito com a rentabilidade, o padre investiu mais R$ 189 mil, entre março e abril de 2021, mas desde então ficou sem obter qualquer retorno, e desde o dia 18 de outubro perdeu o contato com o suspeito.
O sacerdote, que pediu à reportagem para ter a sua identidade preservada, conta que perdeu a economia de toda a sua vida. Abalado, ele organizou um grupo no WhatsApp no qual reúne quase 20 pessoas que vivem o mesmo drama com o sumiço do suspeito.
Num caso mais recente, um casal informou à polícia que entregou ao homem a quantia de R$ 300 mil, em setembro deste ano. O casal contou que conhecia o suspeito desde 2005, que trabalharam e participaram de festas juntos.
O dinheiro é fruto da venda do único imóvel do casal, que mudou de cidade neste ano, e teria sido convencido pelo operador de que, se aplicasse o valor na Bora Trader, alcançaria uma rentabilidade mensal de 10%.
O casal também teria direito a receber R$ 40 mil, de imediato, por ter negociado o imóvel por um preço abaixo do mercado. O homem, por sua vez, devolveu apenas R$ 20 mil e, desde o dia 20 de outubro, não atendeu mais aos telefonemas nem respondeu mensagens do casal.
Em conversa com a Folha, a ex-dona do imóvel pediu para não ser identificada alegando vergonha diante de familiares e pessoas próximas. O apartamento vendido pelo casal havia sido um presente da família dela.
Aos prantos, ela disse à reportagem que tem dificuldades para dormir e tenta se recompor após o desfalque. A Folha teve acesso ao boletim de ocorrência registrado por seis vítimas, em São José do Rio Preto. Todas elas tiveram algum vínculo religioso ou de amizade ou religioso com o suspeito.
É o caso de outro amigo, que também pediu para não ser identificado. À reportagem, ele disse que conheceu o suposto investidor em um acampamento da igreja, em 2016. Desde então, se tornaram amigos, um frequentava a casa do outro e eles viajavam juntos.
Como considerava o suspeito uma pessoa confiável e próxima a ele, decidiu investir com o então amigo, mesmo sem nenhum contrato. No fim de 2019, transferiu R$ 215 mil -os pagamentos da suposta rentabilidade aconteceram durante cerca de um ano e meio e, depois disso, pararam.
Em meio ao golpe que sofreu, ele também enfrentou crises no casamento, pois a mulher não se conformava com o montante perdido. Quando indagava o investidor, ele dizia que havia sofrido um ataque de hackers, que teriam roubado toda a sua carteira de investimentos.
O homem relata que ainda tem esperança de recuperar o valor e disse que o dinheiro faz falta pois teve uma filha recentemente e o orçamento está cada vez mais apertado.
Além disso, ele conta que indicou a empresa do investidor para colegas próximos, que decidiram investir altas quantias e também perderam tudo.
Um dos amigos, que falou à reportagem e também pediu anonimato, disse que investiu R$ 200 mil em 2020 e recebia R$ 8.000 por mês do investimento. Em junho de 2021, porém, os pagamentos pararam. Ele tentou contato, e o suspeito relatou que havia sido vítima de um ataque hacker. A vítima ainda emprestou mais R$ 10 mil para ele, em março de 2022, pois o investidor alegou que os filhos estavam passando necessidade. Depois percebeu que havia caído em um golpe.
Delegado do 3º DP de São José do Rio Preto e responsável pela ocorrência, Marcelo Ferrari disse que o suspeito "captou dinheiro, fez com que essas pessoas abrissem contas para transações de dinheiro via moeda [digital]. Isso vem perdurando há dois anos. Algumas pessoas tiveram os rendimentos prometidos, só que ele começou a não pagar os rendimentos."
Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) disse que o caso é investigado pelo 5° DP de São José do Rio Preto, que realiza diligências para a elucidação do caso. "Detalhes serão preservados para garantir autonomia ao trabalho policial", diz a nota.
A reportagem não localizou o suspeito -o número de telefone está desligado desde a primeira tentativa, no dia 24 de outubro. A reportagem também enviou email à Bora Trader na sexta (4), mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
No site da empresa é possível entrar em um grupo de WhatsApp para saber mais sobre um treinamento oferecido por R$ 499 ao mês.
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