SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso reconheceu nesta quinta-feira (17) o trânsito em julgado de duas decisões que mantiveram a sentença que reestabeleceu as condenações dos policiais militares envolvidos no massacre do Carandiru. O caso aconteceu há 30 anos, em 2 de outubro de 1992, e resultou na execução de 111 pessoas no Pavilhão 9 da antiga Casa de Detenção, em São Paulo.
"Decorrido o prazo legal para a impugnação da decisão que negou seguimento ao presente recurso, à Secretaria para que certifique o trânsito em julgado e providencie a baixa dos autos ao Tribunal de Justiça de São Paulo", diz a decisão assinada por Barroso. O termo "trânsito em julgado" significa o fim do processo e que nenhum recurso será mais acatado. Agora, o processo irá para a PGR (Procuradoria-Geral da República).
A decisão ocorre após a morte do ex-governador de São Paulo Luiz Antônio Fleury Filho, na última terça-feira (15). O massacre ocorreu durante a gestão dele, em 1992 na Zona Norte da capital paulista, e começou quando a Polícia Militar interveio em uma rebelião no pavilhão 9 do centro de detenção.
O caso foi classificado como a maior violação de direitos humanos no período democrático brasileiro por movimentos sociais e por agências da ONU (Organização das Nações Unidas).
Fleury, no entanto, nunca foi arrolado como réu e, até hoje, ninguém foi condenado pelo crime. O coronel Ubiratan Guimarães, assassinado em 2006, chegou a ser sentenciado, em 2001, a 632 anos de prisão pela responsabilidade direta em 102 mortes. Mas, cinco anos depois, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) aceitou um recurso e o absolveu.
Em setembro de 2016, a 4ª Câmara Criminal do TJ-SP tornou sem efeito os julgamentos de um júri popular que condenou 74 policiais militares envolvidos na operação. O desembargador Ivan Sartori, relator do processo, votou não só pela anulação, mas também pela absolvição dos réus porque, segundo ele, "não houve massacre", mas "legítima defesa". Cinco anos depois, porém, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) restabeleceu as condenações.
Em agosto deste ano, Barroso manteve uma decisão do STJ que resgata as sentenças aos policiais militares que participaram do massacre no centro de detenção.
Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro (PL) havia prometido conceder indulto, uma espécie de perdão presidencial, aos policiais que participaram dos massacres do Carandiru e de Eldorado do Carajás, no Pará, além dos PMs envolvidos no caso do ônibus 174, no Rio. Mas o CPB (Código Penal Brasileiro) vetaria o decreto nos três casos e a intenção nunca foi cumprida.
O MASSACRE DO CARANDIRU
Por volta das 11h do dia 2 de outubro de 1992, o então diretor da Casa de Detenção, José Ismael Pedrosa, foi avisado por funcionários do local que havia começado um conflito entre presos do Pavilhão 9, que era o local onde ficavam os réus primários, sendo que alguns ainda aguardavam julgamento. A briga envolveu os detentos Luiz Tavares de Azevedo, vulgo "Coelho", e Antonio Luiz Nascimento, vulgo "Barba".
De acordo com o desembargador Ivan Sartori, a briga "gerou um acirramento de ânimos, verificando-se tumulto generalizado entre os grupos de presos, quando se alinharam, de um lado, os partidários de "Barba" e, de outro, os de "Coelho". Agentes penitenciários foram acionados, tendo sido, contudo, expulsos do 1º andar, onde se aglomeravam os rixosos", afirmou.
Assim, o diretor acionou a PM. O coronel Ubiratan Guimarães determinou a mobilização de batalhões especiais da corporação. Após reunião em frente à penitenciária e conversa telefônica com o então secretário da Segurança Pública, Pedro Franco de Campos, Guimarães determinou a entrada de 330 PMs no complexo.
Durante julgamento ocorrido em 2013, Campos confirmou a autorização dada a Guimarães. No entanto, afirmou não ter conversado com o então governador, Luiz Antonio Fleury Filho. Fleury chegou a afirmar que a ação do Carandiru foi "necessária" e "legítima".
Ainda segundo Sartori, os PMs envolvidos afirmaram que, ao entrar na prisão, já viram detentos mortos no chão. E que a "escuridão, fumaça, chão úmido e escorregadio dificultavam a ação policial". De acordo com os policiais, o barulho era ensurdecedor e alguns presos, portadores de HIV, "praticavam atos para infectá-los com sangue".
As vítimas sobreviventes, no entanto, sempre negaram a versão apresentada em juízo pelos policiais. A versão dos detentos é de que os PMs entraram no pavilhão atirando. Alguns chegaram a relatar que tiveram de se fingir de mortos, em meio aos corpos, para não serem baleados.
No total, 111 presos foram mortos durante a ação da polícia de São Paulo que durou 30 minutos -outros 34 detentos teriam sido mortos pelos próprios colegas durante a rebelião.
O massacre do Carandiru já foi retratado em um livro escrito pelo médico Drauzio Varella, e também foi contado nos cinemas. Desde o episódio, pelo menos 58 dos 74 agentes envolvidos receberam promoções dentro da polícia paulista, de acordo com levantamento feito pelo site UOL.
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