SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, precisou rever e recuar em duas de suas principais apostas para melhorar o ensino do estado após resistência e descontentamento de alunos e professores.

Feder foi escolhido pelo governador eleito Tarcísio de Freitas (Republicanos) para comandar a educação paulista a partir de 2023. O empresário é visto como um nome com experiência na gestão de grandes redes de ensino e também por defender e ter adotado políticas alinhadas aos interesses do setor privado da área.

Uma das principais políticas de privatização adotadas por Feder, no entanto, será descontinuada no próximo ano letivo. O secretário contratou uma faculdade particular por R$ 38,4 milhões no início de 2021 para transmitir aulas pela televisão para os alunos nas escolas.

As teleaulas eram lecionadas nas disciplinas que compõem o itinerário profissionalizante do novo ensino médio. Pelo contrato, as aulas nesse formato podiam ser transmitidas simultaneamente para até 20 turmas de diferentes escolas -ou seja um professor dava aula a distância para cerca de 800 alunos.

A medida foi adotada sem consulta aos professores, famílias e alunos. Em abril, estudantes de diversas escolas passaram a se recusar a acompanhar as aulas nesse formato em protesto.

A justificativa de Feder para aderir ao modelo é de que o Paraná conseguiria dessa forma duplicar a oferta de vagas em ensino técnico, passando de 15 mil matrículas, em 2021, para cerca de 37 mil neste ano.

Apesar de, na época dos protestos estudantis, Feder ter afirmado à Folha de S.Paulo que a insatisfação era de uma minoria, sua gestão decidiu não seguir com o modelo em 2023.

A partir do próximo ano, a secretaria vai recolocar professores da rede estadual para ministrar as aulas dos itinerários formativos. Os conteúdos feitos pela faculdade particular Unicesumar só serão transmitidos nas turmas em que não houver docente.

"A secretaria é pragmática. Após diálogo com a comunidade escolar e avaliação dos resultados do projeto em diferentes municípios ao longo de 2022, a secretaria optou por realizar adaptações no modelo, de acordo com as demandas de cada colégio", disse a pasta ao ser questionada sobre o recuo.

Também disse que foram abertos dois processos seletivos para a contratação de professores habilitados para ministrar essas aulas.

"Sem ter apresentado nenhum estudo sobre as vantagens do projeto ou ter consultado os alunos, o secretário fez um experimento com as teleaulas. Gastou dinheiro público, colocou em jogo um ano da vida escolar dos jovens para agora recuar", disse Walkiria Mazeto, presidente da APP (Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná).

Outra mudança importante em uma política que foi aposta de Feder é no formato de gestão das escolas cívico-militares. O empresário promoveu uma das maiores expansões do país nesse modelo, aplicando-o em 195 unidades estaduais.

No formato desenhado originalmente, policiais militares eram designados pela Secretaria da Segurança Pública para serem diretores das escolas.

Mas, no início de novembro, o governo do estado enviou à Assembleia Legislativa uma proposta, em regime de urgência, para alterar essa regra e passar a tarefa de designar os diretores para a Secretaria da Educação, como ocorre nas demais unidades. Com a alteração, os militares passam a ter o cargo de "monitores educacionais".

A proposta também prevê que os militares não usem mais farda nem andem armados dentro das escolas, como é permitido atualmente.

"Eles perceberam que não é qualquer um que pode ser diretor de uma escola, que o ensino não pode ser conduzido por militares só porque alguns defendem que jovens devem ser disciplinados. Também perceberam que a conduta militar, que prevê o uso de armas, não cabe dentro da escola", disse Cássia Domiciano, professora de pedagogia da UFPR.

Em nota, a Secretaria da Educação do Paraná disse que as mudanças no programa ocorrem para "reforçar o caráter preponderantemente pedagógico do projeto". A pasta diz que nenhum incidente provocou as mudanças e que a proibição ao uso da farda e armas pelos policiais já acontecia na prática.

Domiciano, que é também integrante do Greppe (Grupo de Estudos e Pesquisa em Política Educacional) da Unicamp, destaca que os recuos nas políticas poderiam ser evitados se as decisões tivessem sido embasadas em estudos e na opinião da comunidade escolar.

"Quem vai implementar a política em sala de aula precisa ser consultado e aderir ao projeto, do contrário quem sai prejudicado são os alunos que a cada ano encontram um programa diferente, uma política diferente", diz a especialista.

Antes de deixar a secretaria do Paraná, Feder tenta ainda implementar uma nova política que tem sofrido resistência de professores. No início de outubro, ele publicou um edital para contratar empresas para gerir 27 escolas estaduais consideradas mais vulneráveis.

Segundo a pasta, a resistência é fruto de "informações falsas" que foram divulgadas sobre o projeto e diz que modelos assim não são uma novidade e que "existem em diversas partes do mundo".

"Não foi apresentada nenhuma análise do impacto positivo desse tipo de gestão privada. O programa parte unicamente do pressuposto de que a iniciativa privada faz uma gestão melhor do que o Estado", diz Domiciano.

A equipe de Tarcísio vê a educação como uma das áreas mais sensíveis no início de mandato. Como o ano letivo começa em 6 de fevereiro, a nova gestão terá pouco tempo para fazer os ajustes necessários e assim evitar os problemas que hoje afetam as escolas. A falta de professores nas escolas estaduais paulistas é vista como um dos principais desafios.


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