RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Sem dinheiro para pagar as contas em casa e permanecer na faculdade, o estudante de engenharia ambiental Samuel de Carvalho da Silva, 24, teme ter que largar a graduação na UFRJ, no Rio, após o Ministério da Educação retomar os bloqueios de verbas para instituições federais.
Ele recebe uma bolsa-permanência de R$ 400, além de alimentação e auxílio transporte. "Minha família não tem nenhuma condição de me manter na universidade. A faculdade de engenharia é integral, então não há qualquer chance de conciliar com trabalho fora. Eu não sei se mês que vem vou ter que abandonar tudo. Sem auxílio eu não conseguiria nem entrar, imagina permanecer. A perspectiva que eu tenho agora é de sair da faculdade pra voltar a trabalhar", relatou.
Atualmente, o universitário mora com o pai e a mãe em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio. As despesas da casa são sustentadas apenas pelo pai que trabalha como estoquista em um supermercado.
Antes de entrar na faculdade, Samuel trabalhava como recepcionista em uma ótica para ajudar com as contas. Os pais resolveram se apertar para que ele fosse para a faculdade.
"Sempre foi meu sonho. Foi uma alegria muito grande pra mim e pra minha família conseguir ingressar na faculdade porque eu me preparei estudando sozinho. Agora, eu fico dividido entre me sustentar e realizar meu sonho de me formar", disse.
Ele não é o único aluno que está com dificuldades financeiras. Estudante de letras, Vitória Coutinho, 21, não recebeu a bolsa de monitoria e não sabe como vai pagar o aluguel no alojamento da UFRJ, no Fundão.
"Minha permanência na universidade vai ser diretamente prejudicada porque sem moradia e sem bandejão eu não vou conseguir me manter estudando. Como se não bastasse o baixo valor das bolsas, a gente não tem garantia nenhuma. A sensação é de desespero", disse.
Vitória destaca ainda que os cortes ocorrem em meio do período de avaliações: "A gente está em período de prova, tendo que estudar com ansiedade, no desespero. Alguns professores cancelaram, mas outros mantiveram mesmo com muitos estudantes não conseguindo ir já por conta dos cortes".
Já o Guilherme de Rocamora, 26, depende da bolsa da Capes para o mestrado em serviço social na UFRJ e está tendo dificuldade para finalizar a pós-graduação.
Segundo ele, o pagamento já era para ter sido feito, mas ainda não caiu na conta e não há perspectiva de receber o valor.
"Eu preciso pagar aluguel, comida, luz. É o mínimo que consigo com os R$ 1.500 que recebo pelo meu trabalho como pesquisador. Essa bolsa funciona como espécie de salário porque precisamos nos dedicar integralmente. Não podemos ter vínculo empregatício, não tem como trabalhar fora", disse.
Para ele, isso desistimula quem quer dedicar a vida à pesquisa no Brasil. "Gera um sentimento de revolta porque isso é uma expressão da precarização da educação em geral, mas principalmente da ciência no país. O pós-graduando é uma figura central na área da pesquisa do país", complementou.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro ainda não realizou os pagamentos das bolsas e auxílios dos alunos referente ao mês de dezembro. De acordo com a reitoria, as contas da universidade estão com saldo negativo devido ao corte mais recente que a instituição sofreu, que representa mais de R$ 15 milhões.
As bolsas costumam ser pagas no primeiro dia útil do mês, mas os pagamentos de dezembro não foram feitos e, segundo a própria universidade, não há previsão de normalização já que a UFRJ não recebeu os repasses do Ministério da Educação.
No último dia 1º, mensagem do Tesouro Nacional encaminhada ao MEC e unidades anunciou que o governo "zerou o limite de pagamentos das despesas discricionárias" da pasta para o mês de dezembro. Esses recursos não incluem gastos obrigatórios, como salários.
Na segunda (5), após reunião com a equipe de transição do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o atual ministro Victor Godoy reconheceu os problemas orçamentários e afirmou que negocia com os ministros Paulo Guedes (Economia) e Ciro Nogueira (Casa Civil) para tentar garantir a execução das políticas públicas de Educação.
No dia seguinte, a Economia divulgou uma portaria que permite ao MEC utilizar cerca de R$ 300 milhões destinados inicialmente a despesas obrigatórias para as despesas discricionárias. Mesmo com a medida, o valor é insuficiente. A Folha teve acesso a uma nota técnica da Capes em que a coordenação afirma que, só para cumprir seus pagamentos de novembro, seriam necessário mais de R$ 398 milhões.
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