SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O médico imunologista Anthony Fauci ficou conhecido durante a pandemia por sua atuação como conselheiro principal de saúde na Casa Branca durante a pandemia.
Aos 81 anos, o diretor do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas (Niaid, na sigla em inglês), ligado ao Instituto Nacional de Saúde norte-americano, não passou um dia dos últimos quase três anos sem ter que combater informações falsas sobre a Covid-19.
Desde a origem do coronavírus, até as possíveis formas de infecção e os efeitos das vacinas, o imunologista foi uma voz contundente no combate à desinformação e inclusive foi atacado por apoiadores do ex-presidente republicano, Donald Trump, que era contrário às medidas de proteção contra a doença.
Depois de 54 anos atuando como diretor no órgão federal, Fauci vai deixar o cargo em 31 de dezembro. Em entrevista ao editor-chefe da revista científica Science, Holden Thorp, ele afirma que o melhor jeito de combater fake news é com uma "inundação de informações verdadeiras".
Quando houve a epidemia de Aids durante a década de 1980, Fauci já estava à frente do Niaid e havia muitos negacionistas da emergência global de saúde. O pesquisador, porém, considera as dificuldades de hoje para a comunicação em saúde muito maiores.
"A diferença agora é o impacto das mídias sociais como veículo de desinformação. Muitas pessoas gastam energia e esforço para criar conteúdos de desinformação, quase como se elas não tivessem uma outra atividade, enquanto aqueles que precisam combater as fake news estão atolados de outras atividades no seu dia a dia", disse.
Apesar dos esforços, a luta pode parecer, às vezes, desequilibrada. Isso porque episódios do programa de podcast de grande audiência, como o de Joe Rogan, quando convidam um médico que atua para a desinformação, têm 100 milhões de ouvintes, enquanto o alcance de um texto informativo na Science é raramente acima de um milhão de leitores.
Sobre isso, Thorp afirma que o esforço de comunicadores de ciência é equivalente a subir uma montanha bem íngreme. "Nós temos um pico para escalar, mas ele começa quando reconhecemos que o erro não é como comunicamos ciência, mas sim que as pessoas aprendem apenas o que querem. Precisamos de um novo jeito de comunicar para puxar o interesse daqueles que não tem conhecimento científico", disse por email à reportagem.
Apesar de a Covid ter popularizado muitas ideias e conceitos antes restritos à ciência, o ensino é um fator crucial para ambos. Para Fauci, compreender como funciona o processo científico, de elaboração da hipótese, experimentação, análise dos dados, apresentação dos resultados e revisão por pares (o chamado peer review) já indica que a ciência precisa ser colocada à prova sempre.
"As pessoas não cientistas acham que a ciência é algo imutável. Então se você diz algo hoje e, um mês depois, as evidências mudam, então você também muda o seu pensamento. E com a evolução do pensamento você tem a mudança nas recomendações, das diretrizes e nas escolhas individuais", afirmou Fauci.
"Nós precisamos sempre deixar a porta aberta --não para mudar de ideia empiricamente, mas para mudar frente às novas evidências", completou.
Essa mudança de evidências, inclusive, foi uma constante durante a pandemia. Se antes, nos primeiros meses de pandemia, muitas previsões imaginavam que o coronavírus era um vírus com baixa taxa de mutação e que iria atingir principalmente indivíduos mais velhos e imunocomprometidos, dois anos e nove meses após o início oficial da situação pandêmica sabemos como isso tudo mudou.
As reinfecções, as variantes do Sars-CoV-2 que surgiram, a eficácia das vacinas que se comportou de maneira diferente frente às novas cepas, a própria Covid longa, tudo isso colocou à prova o conhecimento científico de vírus respiratórios até então.
Além disso, a proliferação de especialistas comentando o tema, muitas vezes com visões distintas sobre o que constitui ou não evidência científica, atrapalhou ainda mais o debate.
Fauci lembra da carta de Great Barrington, documento que ficou conhecido por conter a assinatura de mais de 6.000 cientistas defendendo o fim das restrições pela Covid, e que depois foi demonstrado que muitos deles tinham conflitos de interesse não declarados.
A própria posição de Fauci contra a declaração -por motivos médico-sanitários, e não político-partidários- gerou críticas e comentários de que ele seria arrogante e se oporia a outros cientistas. "Muitos dos cientistas que assinaram não tinham nenhum conhecimento sobre virologia ou epidemiologia. Você não quer ser a disputa de ninguém, mas quando há coisas que não são verdades sendo faladas, é difícil [ficar parado]", disse.
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