SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Marcado por declarações vistas como um incentivo à letalidade policial, o novo secretário da Segurança Pública de São Paulo, capitão Guilherme Derrite (PL), 38, afirma ter errado em manifestações feitas no passado. Segundo ele, seu compromisso à frente da pasta é exatamente o oposto dessa imagem.

"Eu estive na Rota [a tropa de elite da PM] na semana passada conversando com os oficiais, e isso era uma coisa informal, que ninguém sabe, mas fui lá justamente para passar o recado: 'Senhores, nosso compromisso é de não estimular o confronto", disse em entrevista à Folha de S.Paulo, nesta segunda (23).

A visita aos oficiais ocorreu após dois confrontos letais envolvendo equipes da Rota. Os casos acenderam o alerta para uma possível política de maior confrontos.

"O que deve estar acontecendo, é que o pessoal está com vontade de trabalhar", afirmou ele, que é oficial da reserva da própria PM e deputado federal licenciado.

Ainda segundo Derrite, ele recebeu uma centena de tentativas de indicação política para nomear delegados a cargos de chefia, mas, que barrou essas ações. Delegados ouvidos pela Folha de S.Paulo, afirmam que, ao contrário, nunca ocorreram tantas indicações políticos quanto agora.



PERGUNTA - O senhor chegou a dizer ser vergonhoso um PM não matar três criminosos em cinco anos. Qual Derrite assume a secretaria? Aquele que tinha um discurso tão forte ou alguém mais alinhado à política de redução de letalidade da PM?

GUILHERME DERRITE - Aliás, quantas pessoas o senhor matou na carreira? Essa palavra matar é pesada. Tive alguns confrontos, mas não sei quantas pessoas que acabaram falecendo nos confrontos que participei. Porque é algo que a gente, sinceramente, não carrega com orgulho. Se eu pudesse, ao longo da minha vida, nunca teria participado de uma troca de tiro. Para mim, seria o ideal.

P.- Mas foram mais de três?

GD- Acho que sim, né?

P.- Voltando, qual Derrite assume a secretaria?

GD- A fala foi realmente um erro da minha parte. Equivocadamente, eu falei isso em um áudio, quando alguns policiais foram transferidos da Rota, principalmente porque alguns amigos foram transferidos. Tomado por uma emoção momentânea, acabei mandando áudio criticando o comando da PM da época, anos atrás, pela transferência de bons policiais.

Na época, me retratei, dizendo que foi um equívoco, que eu tava errado, que não era isso que eu pensava, só que isso não vem à toa. Aí, em 2023, quase 10 anos depois, querem associar dizendo: "o secretário da segurança pública pensa dessa maneira". Não penso. Muito pelo contrário, se eu pudesse passar todo o período da gestão sem nenhum confronto, para mim seria o cenário ideal. Por quê? Porque uma das vítimas sempre é o policial.

Da minha parte, não há estímulo para o confronto, muito pelo contrário. Eu estive na Rota na semana passada conversando com os oficiais, e isso era uma coisa informal, que ninguém sabe, mas fui lá justamente para passar o recado: "Senhores, nosso compromisso é de não estimular o confronto."

P.- O senhor esteve na Rota por conta dos confrontos deste ano?

GD- Da minha parte, eu tenho falado isso publicamente, da nossa parte não há estímulo ao confronto, pelo contrário. A gente sabe que é perigoso para o policial, é perigoso para a sociedade agora. O que deve estar acontecendo, é que o pessoal está com vontade de trabalhar.

P.- Os policiais estão trabalhando mais porque tem um policial no comando pasta?

GD- Não, eles sabem que na Justiça independe de quem está na secretaria. É um processo crime, é o Poder Judiciário, Ministério Público oferecendo denúncia. E a conversa com a Rota foi justamente nesse sentido, para falar: "senhores, não vamos retirar as câmeras." Ela é uma realidade.

P.- O senhor teme críticas de eleitores por, agora, defender as câmeras?

GD- Olha, o eleitor ele tem que entender que... Não estou falando que eu sou duas pessoas, sou exatamente a mesma pessoa, tá? Mas enquanto parlamentar, na campanha, e depois como secretário, são situações diferentes. Até, porque, eu tomei conhecimento realmente dos dados, dos resultados do programa das câmeras depois que eu sentei aqui como secretário. E muita coisa boa o programa apresentou. O programa coíbe o desvio de conduta, por exemplo.

P.- Se o senhor teve conhecimento dos dados das câmeras só depois das eleições, e era o senhor quem abastecia [o governador] Tarcísio de Freitas sobre a questões de segurança pública, então as críticas dele às câmeras foram feitas com base em informações equivocadas?

GD- Acho que não. A gente tomou conhecimento do estudo na transição, tanto o Tarcísio quanto eu, a gente acabou colhendo informações. Primeiro, coloque-se na nossa situação. Todo o comando da PM sabia que eu estava ajudando o governador, o candidato Tarcísio na elaboração do plano de segurança. Como você acha que o comanda da PM me via? Você acha que passava informações a respeito de estudos, de estatística? Não. E com quem que a gente conversava? Conversava e conversa até hoje. Com a insatisfação de boa parte dos policiais. Uma das coisas que a tropa mais pedia era: 'pô, governador, tem que tirar as câmeras'. E, governador: "ah, vamos ver, vamos analisar."

P.- Delegados ouvidos pela Folha afirmam que nunca houve tanta influência política na indicação de cargos de chefia na Polícia Civil. Houve isso?

GD- Todas as trocas foram realizadas pelas instituições. Eu não tive ingerência nenhuma, da minha parte, eu ajudei os comandantes, o delegado-geral e o comandante-geral, a evitar que houvesse influência política em indicações. Confesso que não sabia que eram tantas.

P.- Muitas tentativas?

GD- Tentativas foram centenas.

P.- Como isso aconteceu?

GD- Os caras chegavam e diziam: 'olha, eu queria indicar um delegado para tal lugar.'. Eu falava: 'Não perca tempo porque...."

P.- Caras quem? Quem o senhor diz?

GD- Políticos de todas as formas. "Ah, eu queria indicar o fulano para exercer...'. As vezes, eram pessoas muito bem intencionadas, que quer indicar uma amigo com competência profissional. E outras, a gente não sabe. Eu cortava o problema na raiz.

P.- Os delegados dizem que o deputado [estadual] Delegado Olim (PP), até pela proximidade, fez muitas indicações. Isso ocorreu?

GD- Se indicou alguém, não foi para mim. Nunca conversamos sobre qualquer indicação por parte do Olim em delegacia. Até porque eu pedi ajuda para ele. Eu disse: "Olha, Olim, você tem que me ajudar a conter os ânimos dentro da Polícia Civil porque eu não vou aceitar nenhum tipo de indicação." Ele até disse: "Não, pode deixar, e tal."

P.- Por que aceitou o convite para ser secretário? Tem pretensão de ser governador?

GD- Primeiro, o fato de ter sido um pedido do governador. De uma pessoa que eu incentivei a sair candidato. Não tenho como falar não para o governador. Eu participei de todo do processo de elaboração do programa de segurança pública. Eu não pedi para ser. Eu digo que fiquei parado.

P.- Sua indicação causou mais reclamação na PM do que na Polícia Civil. Em especial, por parte de alguns coronéis. Sabe disse?

GD- De alguns. E quero ver um cara que tenha pisado no chão de fábrica mais do que eu. É difícil. Alguém que tenha trabalho de verdade no serviço operacional. Então, às vezes, isso pode incomodar. O que pode incomodar também, é achar que faço questão de ... "Ah, ele faz questão de continência." Imagina. Eu quero resultado. O comandante da PM é o Cássio. Eu estou aqui para ajudar os coronéis.

P.- Durante os atos antidemocráticos em Brasília, da invasão dos prédios dos Três Poderes, aqui em SP a PM esteve na Assembleia para acompanhar a situação. GD- Em determinado momento, um oficial disse que a tropa estava lá para proteger os manifestantes. O senhor deu essa orientação para a PM?

Não. Não houve isso da minha parte.

P.- E o que acha dessa atitude?

GD- Equivocada. Completamente equivocada. O policial não tem que proteger ninguém com base na opinião política dele. O que nós temos que fazer é garantir que os direitos, principalmente os que estão previstos na Constituição Federal, aliás como direitos fundamentais, nesse caso direito à manifestação, liberdade de expressão, cláusulas pétreas, que eles sejam garantidos. Tanto é que houve uma manifestação na Paulista, de um grupo ideológico contrário, e a PM garantiu o direito constitucional que ele se manifestasse. E é isso que as polícias tem que fazer.

Nesse caso específico, quando houve aqueles atos, que eu declarei criminosos, lá em Brasília, e foram criminosos, as pessoas que cometeram esse abuso tem que ser responsabilizadas de imediato.


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