SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em um momento em que enfrentam um aumento de conflitos entre alunos, as escolas estaduais de São Paulo convivem ainda com a falta de funcionários responsáveis por auxiliar na convivência dos estudantes.
O déficit generalizado de agentes de organização escolar --conhecidos também como inspetores de alunos-- levou a Secretaria de Educação a abrir um processo seletivo para a contratação de novos profissionais. A medida só ocorreu após o retorno das aulas. Além disso, o número previsto de contratados (7.771) é considerado insuficiente pelo sindicato da categoria.
Atualmente, o estado reúne 24,5 mil agentes na ativa, de acordo com a pasta. Isto representa menos de 1% dos quase 3,5 milhões de alunos matriculados na rede estadual.
Proporcionalmente, há um agente para cada 143 alunos, ou 4,6 agentes para cada uma das cerca de 5.300 unidades no estado.
Com diversas atribuições, esses profissionais são fundamentais para manter a rotina da escola. Como consequência da falta desses agentes, professores relatam que não podem ter intervalo entre as aulas para acompanhar os alunos no pátio. E até mesmo pais têm se oferecido para acompanhar a entrada e saída das aulas para garantir a segurança.
É o que tem feito Ana Paula Marcondes Cozzolino Rabelo, mãe de dois alunos da escola estadual Rui Bloem, na zona sul de São Paulo. Ela conta já ter ficado no portão da unidade para vigiar a entrada e a saída dos adolescentes. Afirma que fez isso diante da sensação de insegurança com a falta de agentes de organização escolar.
"Durante a entrada e saída dos alunos é um momento sério, numa distração algum estranho tem acesso à escola, e um agente escolar não consegue dar conta de tudo", diz.
A diretora de uma escola de Mauá, com mais de 1.100 alunos, diz contar com nove agentes de organização escolar. A unidade ainda tem uma das maiores ofertas desses profissionais, mas ela conta que o número está longe de ser suficiente já que as aulas acontecem nos três períodos.
Ela, que pediu para não ser identificada por medo de represália, conta que os professores precisam ficar no pátio com os alunos na hora do intervalo para evitar brigas e conflitos, que se tornaram cada vez mais comuns desde o retorno das aulas presenciais.
Segundo ela, o déficit torna o trabalho dos professores ainda mais exaustivo, já que eles não podem ter nenhum período para intervalo durante a jornada de trabalho. Os docentes acabam se revezando apenas para conseguir ir ao banheiro ou tomar água entre as aulas.
João Marcos de Lima, presidente da Afuse (Sindicato dos Funcionários e Servidores da Educação), diz que há anos a categoria reivindica mudança na regra que define o número de agentes de organização escolar. "O número sempre foi insuficiente, mas se tornou ainda pior nos últimos anos por falta de contratação e porque muitos abandonam o cargo pelas más condições."
Um decreto de 2017 estabeleceu que o número varia de acordo com o número de turmas e turnos. Por exemplo, uma escola que tenha entre 16 e 25 turmas pode ter 4 agentes se funcionar em apenas um período. Ou 5, se trabalhar em dois turnos.
Ou seja, a regra prevê que a escola pode ter uma média de um agente que pode variar de 120 para até 185 alunos --considerando que, em geral, as turmas têm cerca de 30 estudantes.
Segundo funcionários ouvidos pela Folha de S.Paulo, as escolas com mais turmas de ensino médio são as que mais sofrem com o déficit. Essa etapa é considerada mais desafiadora por ter mais conflitos entre os alunos.
"A secretaria fica com um discurso de que está preocupada com a saúde mental dos alunos e professores, mas não garante que as escolas tenham minimamente um ambiente saudável. Ter funcionários em número adequado é o mínimo para evitar a sobrecarga de trabalho e o cuidado com os alunos", diz Lima.
Em nota, a secretaria disse que a atual gestão, agora sob comando do secretário Renato Feder, trabalha para ampliar o quadro.
"Na semana passada, foi autorizado processo seletivo simplificado para contratação de 7.771 agentes, cerca de 3.000 a mais do que em 2022", afirmou a pasta. Não foi informado quando os profissionais devem ser chamados nem quais escolas devem ter prioridade para recebê-los.
Além da alta demanda para poucos profissionais, o salário inicial do agente escolar é tido como desestimulante entre os servidores. O governo paga R$ 1.320,00, e a carga horária é de 40 horas semanais.
"Fico muito chateada porque a gente sabe que é um salário miserável, e nem todos [profissionais] aguentam porque é um serviço pesado e compromisso muito grande lidar com crianças e adolescentes", disse Ana Paula. Ela faz parte do quadro de apoio de pais, que se propõe ajudar na administração da escola.
Alguns pais, segundo ela, cogitaram contratar agentes por conta própria, mas isto não é permitido.
Na ausência dos profissionais, uma servidora que atua em um colégio na zona leste disse que professores e inclusive a diretora auxiliam os agentes durante o horário do recreio e a entrada/saída dos alunos.
A Folha de S.Paulo também questionou se professores e diretores têm desempenhado a tarefa de organização escolar e se o governo entende que o salário condiz com a função e a pasta.
Em nota, a pasta respondeu que "em 2021, a carreira dos AOE [agentes de organização escolar] foi revisada, com a inclusão de vantagens, como a previsão para a evolução com cursos de nível técnico e pós-graduação e a redução do tempo mínimo para a promoção dos profissionais. Todas as atribuições dos profissionais do quadro de apoio escolar estão previstas em legislação vigente. A secretaria mantém o diálogo aberto com a categoria e seus representantes."
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