SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Ministério da Saúde retomou o programa Mais Médicos com dois editais abandonados pela gestão Jair Bolsonaro (PL) por deficiência de orçamento.
O lançamento dos ciclos 26 e 27 do programa, de julho e outubro de 2022, foi possível em razão da recomposição da verba de programas da saúde.
No caso do Mais Médicos, o orçamento enviado pelo governo passado ao Congresso para sua manutenção em 2023 foi de R$ 647,1 milhões, valor insuficiente para as ações. Durante a votação do Ploa (Projeto de Lei Orçamentária Anual) e as negociações envolvendo a PEC da Transição, o montante solicitado pelo governo Lula (PT), de R$ 1,7 bilhão, foi restabelecido.
O 26º ciclo disponibilizou 152 vagas para 31 dos 34 DSEISs (Distritos Sanitários Especiais Indígenas). Destas, 23 foram ocupadas por médicos brasileiros com registros nos Conselhos Regionais de Medicina do país.
Até o final de fevereiro, segundo o Ministério da Saúde, sete haviam assumido os postos.
Na recomposição do orçamento, 129 vagas foram ofertadas a intercambistas (brasileiros formados no exterior).
Conforme a ministra Nísia Trindade havia anunciado, o território yanomami, nos estados de Roraima e do Amazonas, receberá 19 profissionais do Mais Médicos. O início das atividades está previsto para 14 de março.
O edital do 27º ciclo, relançado em janeiro, prevê 1.022 vagas em 722 municípios, apenas para médicos formados no Brasil. Até o momento, 658 vagas foram preenchidas (64%) e 484 profissionais já estão em atividade. Os demais têm até 15 de março para se apresentarem.
As vagas ociosas serão ofertadas a médicos estrangeiros formados no exterior, sem a necessidade do Revalida (exame de revalidação de diploma estrangeiro), segundo afirmou à Folha de S.Paulo o diretor de Programa da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Felipe Proenço. Ele coordenou o Mais Médicos desde a implantação, em 2013, até abril de 2016.
Em 2014, o programa alcançou a marca de 18.240 profissionais em 4.058 municípios e 34 DSEIs. O ano de 2022 teve a maior desassistência, com 12.132 profissionais, considerando a soma dos dois principais programas de provimento -Mais Médicos e Médicos pelo Brasil, que foi anunciado em 2019, mas iniciou as atividades em 2022.
O Mais Médicos leva profissionais para atuarem na atenção primária, em áreas vulneráveis, de extrema pobreza e com dificuldade de atração e fixação de médicos, além das periferias das grandes cidades.
Nas regiões contempladas pelo programa, atenuará o impacto na população de um velho problema: o déficit de médicos de família e comunidade, estimado entre 45 mil e 65 mil no país pela SBMFC (Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade) -dado corroborado por Proenço.
"Existe um déficit importante de médicos de família e comunidade no SUS, pelo papel que esse profissional tem para a Estratégia Saúde da Família e as iniciativas de atenção primária à saúde. Entendemos que são necessárias estratégias diversificadas, seja na formação, no campo da regulação, do ponto de vista de incentivos e formação de redes", explica Proenço.
O governo Lula diz que pretende fortalecer o Mais Médicos, tornando-o mais atraente aos profissionais formados no Brasil, com incentivo, formação e qualificação.
"O Mais Médicos chegou a ter um investimento importante no campo da construção, reforma e ampliação das UBS. Observamos no orçamento ao longo dos anos que isso deixou de ser prioridade, ao mesmo tempo em que vimos que os nossos trabalhadores da saúde enfrentaram períodos mais críticos da pandemia e a atenção primária foi fundamental para dar uma resposta ao cuidado das pessoas", ressalta Proenço.
Para o médico sanitarista Adriano Massuda, professor da Escola de Administração do Estado de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, há dois problemas que envolvem a falta de médicos: a má distribuição e a descentralização do SUS.
"O SUS é descentralizado por nível dos municípios. São eles os responsáveis por contratar médicos e precisam fazer isso em condições desiguais. Essa característica do SUS agrava o problema do provimento médico, crônico", explica.
Para o especialista, o retorno do programa Mais Médicos é necessário para que o Ministério da Saúde possa intervir sobre problemas estruturais do SUS. "Você não faz saúde sem médicos e precisa desses incentivos federais para conseguir alocar esses profissionais. A política mais efetiva que houve na história do país para o provimento de médicos foi o Mais Médicos", afirma.
Na visão do especialista, a política de provimento deve ser de longo prazo, com incentivos para que o médico brasileiro possa se inscrever, bônus para residência e perspectiva de uma carreira no SUS.
Massuda ressalta que a atual crise sanitária exige um chamamento rápido e de grande quantidade de médicos. "A saúde não pode esperar ter uma geração nova de médicos formados para resolver a crise yanomami, por exemplo".
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