RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - A Prefeitura do Rio de Janeiro decidiu acatar a recomendação do MPF (Ministério Público Federal) e desistiu de concluir a instalação de material de concreto no fundo da areia da praia da Barra da Tijuca, na zona oeste.
O município também determinou que a empresa responsável pela intervenção retire o material já instalado e coloque de volta o volume de areia escavado.
A decisão foi comunicada ao MPF no último dia 13, após a gestão Eduardo Paes (PSD) ser informada pela Procuradoria sobre a existência de indícios de crime ambiental na obra. Entre as irregularidades apontadas está a emissão de uma licença ambiental um mês após o início das intervenções. De acordo com o MPF, a autorização dada pela prefeitura era, também, insuficiente.
No comunicado, a prefeitura afirma que a retirada do material e a recolocação da areia terá acompanhamento de "equipe técnica destinada a verificar e evitar eventual impacto ambiental".
Procurada, a Secretaria Municipal de Infraestrutura afirmou que "está em tratativas administrativas para a desmobilização da obra".
Iniciada no fim do ano passado, a obra tinha como objetivo reduzir os efeitos das ressacas, principalmente no calçadão e em quiosques da orla. Especialistas de universidades como UFRJ, Uerj, UFF e PUC-Rio organizaram um abaixo-assinado apontando o risco de que a movimentação poderia, na verdade, ampliar danos futuros. A instalação do material estava suspensa desde fevereiro, após notificação do MPF.
Ao comunicar o cancelamento do projeto à Procuradoria, o município afirmou que "iniciou a realização desta obra em razão de aquele espaço público ter sofrido degradação em especial no passeio público, que poderia evoluir para um colapso de tal magnitude que impediria o ir e vir das pessoas na ciclovia e na pista de rolamento".
"A obra não pretendia modificar a faixa de areia, ao contrário, reestabelecer o passeio em seu limite original nos trechos onde já havia sido derrubado. Ou seja, tratava-se de intervenções de pequeno porte e localizadas, dimensionadas e embasadas tecnicamente de acordo com o projeto executivo contratado."
A trabalho previa, segundo a prefeitura, a instalação de colchões articulados feitos de concreto e uma manta geotêxtil preenchida com areia da própria praia para estabilizar o local.
O contrato de R$ 10,6 milhões também incluía a implantação de vegetação de restinga e a reestruturação de passeios e pavimentos danificados. A secretaria não esclareceu se a execução desses serviços será mantida.
A instalação do material na faixa de areia estava prevista para sete pontos da Barra da Tijuca -um trecho de 1,2 km entre os postos 3 e 8- e tinha prazo de conclusão de seis meses. Apenas um dos pontos havia sido de fato executado antes da suspensão em fevereiro.
De acordo com o MPF, a licença prévia de instalação, feita pela Subsecretaria de Controle e Licenciamento Ambiental, só foi expedida em 19 de janeiro deste ano, dia seguinte à notificação feita pela Procuradoria ao município para que apresentasse o licenciamento ambiental da obra.
O MPF questionou a ausência de estudo de impacto ambiental para a realização da obra. O procurador Sérgio Suiama afirma que as praias são áreas de preservação permanente, motivo pelo qual exigem relatório detalhado dos possíveis impactos.
A Procuradoria afirma, contudo, que não havia qualquer análise sobre o possível impacto das intervenções na fauna, nas dunas e na permeabilidade da areia. Aponta, também, que o local foi ponto de desova de tartarugas marinhas.
Para os procuradores, os estudos apresentados pelo município também não explicavam a razão da técnica adotada. Laudo da Procuradoria afirma que a obra está "em dessintonia com o que dispõem a literatura técnica e as normativas pertinentes ao ordenamento costeiro".
A ausência também foi notada pelo Tribunal de Contas do Município, que questionou a prefeitura sobre a "aparente inconsistência em se licitar conjuntamente os estudos necessários à definição de soluções técnicas e os serviços de execução de solução já fixada e definida".
"A observação parece confirmar a percepção de que a 'solução' de se instalar mantas e sacos de 'geobag' preenchidos com cimento sob grandes trechos da areia da praia da Barra da Tijuca já estava
predefinida antes mesmo de qualquer estudo tecnicamente fundamentado", escreveu Suiama na recomendação à prefeitura.
O procedimento criminal aberto apura a execução de obras sem autorização, entrega de informação falsa ou sonegação de dados para o licenciamento ambiental, concessão de licença em desacordo com as normas e elaboração de laudo falso. O cancelamento da obra não encerra essa apuração.
Foi o uso de concreto e a movimentação de maquinário pesado na praia que assustou oceanógrafos e engenheiros e os levou a organizar um abaixo-assinado.
Parecer técnico assinado por 26 professores e especialistas na área apontava que os colchões de concreto poderiam agravar os danos provocados pelas ressacas. O principal problema, na avaliação do grupo, era a possível redução na infiltração da água do mar na areia durante as ressacas, ampliando o impacto das ondas e a redução da orla.
"Estruturas rígidas fazem refletir a energia das ondas que retornam ao mar com mais energia retirando a areia da praia e aumentando sua declividade. Esse fenômeno leva à diminuição progressiva da largura da praia (perda da área recreativa) e aumento de sua declividade, fazendo com que as ondas de alta energia em eventos de ressaca do mar quebrem mais próximas da orla onde estão localizados o calçadão, a ciclovia e quiosques", afirma o texto.
O grupo questionava, inclusive, a necessidade da obra. Estudo de professores da Uerj e da UFRJ indica que a praia da Barra está em "equilíbrio dinâmico", com redução da faixa de areia em períodos de ressaca e recuperação natural posterior.
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