SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um caso de importunação sexual contra uma estudante em um ônibus na USP resultou em março deste ano na exoneração do analista de sistemas Fernando Faria, 40. Além disso, 14 funcionárias da universidade o acusam de tê-las assediado em 25 ocasiões.
Por meio do advogado Tiago Batista Abambres, Faria disse à Folha de S.Paulo que já respondeu por essa questão judicialmente e que está cumprindo a penalidade imposta. Em relação aos outros episódios, ele afirmou não ter conhecimento dos fatos e que, por isso, não se manifestou a respeito.
No fim de maio do ano passado, Faria foi preso em flagrante por policiais militares por importunação sexual contra uma jovem de 22 anos num ônibus no campus do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Porém, passado um mês, ele voltou a trabalhar, segundo funcionárias da universidade.
No boletim de ocorrência, Faria relatou que, no caso do ônibus, sua mão pode ter encostado na aluna, porém sem perceber. Ele negou que tenha feito isso intencionalmente.
A vítima, que prefere não ser identificada, afirmou à reportagem que estava no ônibus quando começou a sentir que algo raspava nas suas nádegas. Ela contou que sua primeira reação foi tentar se afastar, mas que Faria tentou alcançá-la com a mão.
A estudante disse ter tomado coragem para confrontá-lo ao perceber que outra pessoa testemunhava a cena. A polícia foi, então, acionada.
Segundo a diretoria da Feusp (Faculdade de Educação da USP), o analista foi demitido porque uma apuração interna o considerou culpado. Ele trabalhou por ao menos 15 anos na instituição.
Após esse caso, funcionárias da universidade se mobilizaram para denunciar Faria e criaram o Nuffe (Núcleo de Funcionárias da Feusp), para organizar um processo de escuta e acolhimento das vítimas.
O núcleo reuniu o histórico de 25 episódios de importunação sexual. No dossiê, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, 14 funcionárias disseram que foram vítimas do analista entre 2008 e 2022. A maioria delas o acusa de tocar seus seios ao cumprimentá-las ou ao se aproximar da mesa de trabalho delas. Ao menos oito mulheres afirmaram terem sido assediadas mais de uma vez.
Uma delas disse à Folha de S.Paulo, sob a condição de não ter seu nome revelado, que ele foi cumprimentá-la e passou as mãos nos seus seios. A funcionária afirmou que reagiu, mas que Faria continuou conversando com ela como se nada tivesse acontecido.
Ainda de acordo com ela, após Faria ser solto, ela passou a trabalhar de porta fechada, enquanto o analista circulava livremente pelo corredor. A situação, acrescentou, fazia com que sentisse uma espécie de inversão de papéis, em que a vítima ficava presa e o agressor, solto.
Com base nas denúncias colhidas por meio de um formulário, o núcleo elaborou e encaminhou à direção da Feusp um dossiê para ser somado ao processo administrativo instaurado contra o funcionário devido ao episódio no ônibus.
No entanto, segundo as funcionárias, a Procuradoria-Geral da USP não aceitou que a denúncia coletiva das trabalhadoras se juntasse à da estudante em um mesmo processo. A instituição teria definido que, para os casos das trabalhadoras, deveria ser aberto primeiramente um Processo de Averiguação Preliminar.
Procurada, a direção da Feusp afirmou, por meio de email, que "essas denúncias ficaram prejudicadas pois, considerando-se que o funcionário já foi demitido, salvo engano, elas perdem o objeto".
Em um boletim divulgado na mesma semana em que houve a exoneração, a Sindusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP) reforçou a necessidade de que abusos sejam reconhecidos formalmente pela USP com uma resposta à denúncia coletiva encaminhada pelo Nuffe.
Além disso, o sindicato pediu à USP que disponha de mecanismos que protejam mulheres "em casos de violência de gênero e protocolos específicos para a condução de processos administrativos nesses casos".
Após a exoneração, o núcleo colocou cartazes pela Feusp com frases que remetem aos episódios de importunação relatados pelas funcionárias. Nas escadas, há frases como "a vitória contra a violência de gênero é de todas", "nossos corpos não estão à disposição" e "não vamos mais nos calar".
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