BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) manterá o julgamento sobre o marco temporal para o próximo dia 7, mesmo com a pressão da Câmara dos Deputados, que aprovou o projeto de lei que trata do tema, segundo informações do tribunal desta terça-feira (30).

O texto ainda precisa do aval do Senado. Se houver mudanças, retorna para a Câmara.

Ministros do STF viram como normal o movimento da Câmara de querer antecipar sua posição em temas polêmicos pautados pelo tribunal. Eles avaliam, porém, que uma decisão acelerada do Parlamento não impediria o julgamento da questão na corte.

Além disso, caso o marco temporal seja aprovado pelo Legislativo, a nova norma também poderá ter sua constitucionalidade questionada no Supremo.

Outra parte da corte avalia que, no Estado democrático de Direito, "o Judiciário deve deferência ao Congresso" e defende que análises do tipo devem ser feitas pelos parlamentares.

Por isso, não se descarta a possibilidade de que algum desses ministros peça vista (mais tempo de análise do processo) e adie o julgamento do caso.

Ao assumir a presidência do Supremo, Rosa Weber se comprometeu com líderes indígenas a pôr o marco temporal em pauta ainda no primeiro semestre do ano. Ela tem dito que pretende "resolver logo" esta questão e manteve a data do julgamento.

A norma limita demarcações de terras indígenas no país aos territórios ocupados até a promulgação da Constituição de 1988. Pelo critério, indígenas que não estivessem em suas terras até a data não teriam direito de reivindicá-las --o que ignoraria o histórico de expulsões e violência contra diferentes povos.

A ação do Supremo trata especificamente do caso da Terra Indígena Ibirama-Laklanõ, em Santa Catarina. A decisão, porém, terá caráter de "repercussão geral" --quando uma decisão da corte serve de referência para o entendimento de todos os casos sobre o tema.

O projeto aprovado pela Câmara está em tramitação na Casa desde 2007, mas sua análise foi acelerada diante da proximidade do julgamento pelo STF.

Integrantes do governo Lula (PT) tentam adiar a votação do projeto, sem sucesso. A tese do marco temporal tem aval de ruralistas, que defendem que a regra traria segurança jurídica e limitaria desapropriações.

A estratégia é se antecipar ao julgamento do STF para que a aprovação de uma norma possa fazer com que a análise da corte perca seu objeto. Também argumentam que uma legislação, hierarquicamente, poderia se sobrepor a uma jurisprudência criada pelo Judiciário.

O caso só começou a ser julgado pelo tribunal em 2021, inicialmente na plataforma virtual, mas o ministro Alexandre de Moraes pediu para ir ao plenário físico.

Na época, cerca de 6.000 indígenas de 170 povos acamparam em Brasília, em uma área da Esplanada dos Ministérios, para protestar por seus direitos e contra o marco temporal.

O julgamento está suspenso desde então. Até o momento, foram proferidos dois votos: o do relator, ministro Edson Fachin, que se manifestou contra o marco temporal, e o do ministro Nunes Marques, a favor.

Fachin defendeu que uma interpretação restritiva sobre os direitos fundamentais dos povos indígenas atenta contra a Constituição e contra o Estado democrático de Direito.

Kassio Nunes Marques, o segundo a votar, reafirmou o marco temporal, em um posicionamento que se alinhava aos interesses do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Moraes, então, pediu vista.

O então presidente da corte, Luiz Fux, chegou a pôr o processo novamente em pauta, mas semanas antes da votação o retirou da previsão de julgamento.

À época, Bolsonaro vinha fazendo diversos ataques à corte afirmando que, se o voto de Fachin prosperasse, "seria o fim do agronegócio".

A falta de conclusão no julgamento do STF é usada em diversos casos pelo país para contestar as áreas ocupadas por comunidades, o que aumenta a tensão e a possibilidade de conflitos.

Na Câmara, a proposta de lei estabelece que, para serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente, é preciso comprovar "objetivamente" que elas, na data de promulgação da Constituição, eram habitadas em caráter permanente e usadas para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais e à reproducao fisica e cultural.

O texto prevê, entre outros pontos, a proibição da ampliação de terras indígenas já demarcadas, e que os processos administrativos que ainda não tenham sido concluídos sejam adequados à nova regra.

Caso o texto passe pela Câmara, ele ainda precisará ser apreciado pelo Senado. Se houver mudanças, volta para a Câmara, antes de seguir à sanção do presidente Lula (PT).

Ambientalistas e o movimento indígena criticam o projeto e veem brechas para permitir garimpo, atividade agropecuária, abertura de rodovias, linhas de transmissão de energia ou instalação de hidrelétricas, além de contratos com a iniciativa privada e não indígena para empreendimentos.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirma que a adoção do marco temporal limitaria o acesso dos indígenas ao seu direito originário sobre suas terras e que há casos de povos que foram expulsos delas algumas décadas antes da entrada em vigor da Constituição.


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