SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Câmara Municipal de São Paulo aprovou nesta segunda-feira (26), em votação definitiva, a revisão do Plano Diretor, lei que orienta o crescimento da cidade e estabelece regras gerais para a construção de edifícios. Foram 44 votos a favor e 11 contrários.
A expansão das áreas onde é permitido construir os prédios mais altos da cidade tornou-se a principal polêmica da revisão ao longo das últimas semanas.
Essa questão deverá ser levada para a revisão da lei de zoneamento, próxima regra urbanística a ser analisada pela Câmara.
O Plano Diretor de 2014 já prevê maior verticalização no entorno dos corredores de ônibus e das estações de metrô e trem. Essas áreas são chamadas de EETUs (Eixos de Estruturação e Transformação Urbana).
A revisão aprovada nesta segunda amplia esses eixos. Hoje eles atingem as quadras dentro do raio de 600 metros do metrô e nos 300 metros do entorno de corredores de ônibus. A nova redação libera espigões em todas as quadras tocadas por um perímetro de 700 metros do transporte sobre trilhos e de 400 metros dos corredores.
Além disso, nos eixos de transporte, a regra vigente permite que prédios residenciais construam quatro vezes o tamanho do terreno. Mas se o edifício for majoritariamente destinado à habitação social, a liberação sobe para seis.
No texto aprovado pela Câmara, esse aproveitamento de prédios residenciais pode chegar a até nove vezes se forem combinados diferentes tipos de moradia. A condição para isso é que mais da metade das unidades seja voltada para a população de renda mais baixa.
Se consideradas outras regras já vigentes no Plano Diretor, que permitem incluir lojas na fachada do prédio e salas comerciais, o potencial construtivo sobe para perto de 12 vezes o tamanho do terreno.
Defensores da verticalização afirmam que mesclar empregos e moradores de diferentes faixas de renda no mesmo espaço justifica a liberação dos espigões. A tese é que isso pode aproximar trabalhadores dos postos do trabalho, beneficiando a economia e reduzindo o trânsito de veículos.
Mas urbanistas consideram que, na prática, isso não ocorreu na vigência do atual plano. Os eixos que receberam a maioria dos prédios novos estão em bairros valorizados, e os empreendimentos geralmente são de alto padrão.
Acrescenta-se aos argumentos contrários o fato de que houve manutenção da ausência de limite de altura para edifícios nos eixos de transporte. A regra é especialmente criticada por movimentos de bairros que temem viver à sombra de prédios enormes, além de conviverem em áreas com mais trânsito e poluição.
A mudança na lei ainda facilita a oferta de mais vagas de garagem para apartamentos mais amplos ao lado do transporte público.
Relator do texto na Câmara, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) disse o que o novo texto é o resultado de um processo democrático. "Eu estive aberto a todo momento para que a gente fizesse todo tipo de discussão", disse ele, sobre reuniões que teve com vereadores da oposição. "Tiveram a possibilidade, em mais de 50 audiências públicas, de participar do processo."
O novo regramento também permite que parte do dinheiro do Fundurb (Fundo de Desenvolvimento Urbano) seja destinado ao recapeamento de vias. Movimentos sociais que pedem investimento em moradia popular reclamam a destinação integral dos recursos do fundo municipal para programas de habitação. Além disso, dá benefícios a templos religiosos.
Um dos poucos pontos que não sofreu contestações está a criação de normas para fiscalizar a destinação da moradia popular às famílias mais pobres. Hoje, não há controle sobre a venda de unidades habitacionais nessa categoria por construtoras que recebem benefícios fiscais da prefeitura.
Uma vez aprovado o Plano Diretor, o Legislativo deve começar a analisar mudanças na lei do zoneamento, quando a aplicação das regras do Plano Diretor será discutida, quadra a quadra. É o caso das áreas onde há restrição à verticalização sem limite, como a no entorno de vilas, cuja altura dos prédios não pode passar de 28 metros.
A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) já apresentou a minuta com a sua proposta para a revisão do zoneamento. Ainda tendo como exemplo as vilas, o texto inicial da prefeitura abre a possibilidade para que esses conjuntos de casas tenham sua área incorporada a outros terrenos para a construção de empreendimentos imobiliários.
Isso poderia facilitar a compra desses terrenos e, assim, acabar com o empecilho à verticalização. Essa é uma das questões que deverá ser discutida na Câmara nos próximos meses.
Contrária ao projeto, a vereadora Silvia Ferraro, da Bancada Feminista do PSOL e integrante da Comissão de Política Urbana, afirma que as disputas serão ainda mais intensas na discussão do zoneamento.
"O zoneamento será uma nova batalha, ainda mais acirrada, porque entrarão interesses mais particulares, sobre em quais quadras e ruas poderão construir mais. Este Plano Diretor é permissivo e é por isso que nós que votamos contra ele vamos batalhar para impedir a construção de prédios gigantescos de forma desenfreada nos miolos de bairros."
ENTENDA POR QUE PRÉDIOS PODEM FICAR MAIS ALTOS
Uma questão que fará diferença para as construtoras após a revisão do Plano Diretor é a permissão para o aproveitamento de proporção maior do terreno. O aumento da área construída torna a construção dos imóveis mais barata.
Essa relação entre custo e benefício é representada pela sigla CA (coeficiente de aproveitamento). Quando a construção pode aproveitar apenas uma vez a área do terreno, diz-se que o coeficiente de aproveitamento é igual a um ou, simplesmente, CA1. Se a área aproveitada é de seis vezes, como está na regra vigente, o que significa que há CA6. A revisão libera o CA9 para imóveis residenciais nos eixos.
PRINCIPAIS MUDANÇAS DO PLANO DIRETOR
1. EIXOS DE TRANSPORTE
**Como é hoje** É permitido construir prédios mais altos em um raio de 600 metros ao redor das estações de metrô e trem; a mesma regra vale a uma distância de 150 metros para cada lado dos corredores de ônibus
**Como fica** Áreas que toquem um raio de até 700 metros das estações e 400 metros dos corredores de ônibus podem ganhar permissão para verticalizar; a permissão, quadra a quadra, só poderia discutida com a mudança na lei de zoneamento
2. VAGAS DE GARAGEM
**Como é hoje** Ao redor dos eixos de transporte, é permitido construir até uma vaga de garagem para cada apartamento sem pagar taxa --não importa o tamanho. A construtora pode construir mais vagas, desde que pague por isso
**Como fica** Haverá cálculos para decidir o número vagas de garagem grátis. Apartamentos com menos de 30 metros quadrados não terão o benefício, mas aqueles com 120 metros podem ter duas vagas
3. FISCALIZAÇÃO DA MORADIA POPULAR
**Como é hoje** Governos dão incentivos fiscais para quem constrói moradia popular, mas não há controle sobre a destinação para famílias mais pobres; pessoas mais ricas compram as unidades por falta de fiscalização
**Como fica** A obrigação de destinar o imóvel para o perfil correto de renda ficará gravada na matrícula do imóvel e a prefeitura deve editar um decreto com as regras de fiscalização; bancos que financiem a obra devem emitir certificação que comprove a renda do comprador
4. ALUGUEL DE HIS E HMP
**Como é hoje** Empreendimentos de HIS (Habitação de Interesse Social) e HMP (Habitação do Mercado Popular) só podem ser vendidas para famílias que ganhem até dez salários mínimos; não há a modalidade do aluguel na lei
**Como fica** Proprietários poderão alugar apartamentos dessas modalidades, o que será regulamentado pela prefeitura; a cobrança será limitada a 25% da faixa salarial do locatário
5. TEMPLOS
**Como é hoje** Em ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) toda vez que um terreno com mais de 500 m² é demolido ou passa por reforma com mudança de uso, é preciso destinar parte do terreno à habitação social; as exceções são para repartições públicas, áreas verdes e imóveis tombados
**Como fica** Locais de culto receberão os mesmos benefícios, e quando um grande terreno usado como igreja for vendido, o comprador não será obrigado a construir moradia; além disso, locais de culto não poderão ser considerados subutilizados, o que poderia levar a uma desapropriação
7. ARCO TIETÊ
**Como é hoje** Vários bairros no entorno do rio Tietê não têm incentivo para construir prédios mais altos ao redor dos eixos de transporte.
**Como fica** As áreas ao redor de estações de trem, metrô e corredores de ônibus ficam autorizadas a verticalizar; Lapa, Freguesia do Ó, Perdizes e Santana estão entre as regiões mais impactadas
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