RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Um ato na praia de Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, marcou, nesta quinta-feira (13), os dez anos do desaparecimento e morte do pedreiro Amarildo Dias de Souza. Ele sumiu no dia 14 de julho de 2013 após ser detido por policiais militares da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha à sede da unidade. O corpo nunca foi encontrado.
A ONG Rio de Paz estendeu um tecido transparente na praia de Copacabana e colocou na areia dez manequins, representando os anos do caso. Familiares de Amarildo sentaram sobre o tecido e seguraram máscaras com o rosto do pedreiro.
De acordo com a investigação, Amarildo foi conduzido da porta de casa até a UPP. Ao todo, 12 PMs foram condenados por crimes de tortura seguida de morte, ocultação de cadáver e fraude processual.
Segundo a sentença, por ordem dos comandantes, Amarildo foi submetido a tortura por cerca de 40 minutos. Ele foi agredido com descargas elétricas, saco plástico na cabeça na boca e afogamento em balde com água, o que causou sua morte.
Durante julgamento, a defesa de parte dos réus sustentou a tese de que Amarildo teria sido vítima de traficantes de drogas depois de supostamente liberado pelos policiais que o capturaram e levaram à sede da UPP.
Apesar da condenação dos policiais, o corpo de Amarildo até hoje não foi encontrado. O caso se tornou símbolo de casos de abuso de autoridade, violência policial e deu origem a diversos protestos.
Dois PMs continuam ativos na corporação. O major Edson Raimundo dos Santos, à época comandante da UPP, foi condenado a 13 anos e 7 meses. Atualmente, Santos é lotado na DPG (Diretoria Geral de Pessoal). Em entrevista à Folha de S.Paulo, em 2015, o major negou o crime. O segundo tenente Luiz Felipe de Medeiros é lotado no CABis (Centro de Abastecimento de Insumos de Saúde).
Em agosto do ano passado, a Segunda Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) confirmou que o estado do Rio de Janeiro deveria pagar R$ 500 mil aos familiares de Amarildo. Os ministros também decidiram manter a decisão do Judiciário de pagamento de pensão de dois terços de salário mínimo aos seis filhos do pedreiro.
A família, no entanto, ainda não recebeu. O estado precisa ser intimado a pagar o valor e pode tentar impugnar a conta apresentada. Após essa etapa, o processo ainda precisa voltar ao juiz para homologação do valor.
"O estado comete dois crimes: além de tirar a coluna da casa, a pessoa que trazia o alimento para dentro, ainda não paga a família. Não quer saber se a família está comendo, passando fome, morando de aluguel", afirma Anderson Souza, 31, filho mais velho de Amarildo.
"Se a indenização saísse poderíamos comprar uma casa, dar um lar porque agora temos filhos, sobrinhos. Seria importante especialmente para a minha mãe. Onde ela mora infiltra direto. O dinheiro não traria a vida do meu pai de volta nem felicidade. Mas ajudaria para, ao menos, confortar", completa o filho mais velho de Amarildo.
João Tancredo, advogado da família de Amarildo, prevê que a esposa, irmã e filhos do pedreiro só comecem a receber em 2026.
"A morosidade da Justiça chega a ser perversa", afirma o advogado João Tancredo. "Os filhos de Amarildo, todos muitos jovens, além da convivência com o pai que lhes foi suprimida, foram também privados do auxílio que Amarildo lhes prestava. Nenhum se formou ou conseguiu trabalho regular que lhes garantisse a subsistência."
A ONG Rio de Paz lança, também nesta quinta, o documentário "Cadê Você?", sobre desaparecimentos de repercussão no Rio de Janeiro, como os casos de Amarildo e de Priscila Belford, irmã do ex-lutador Vitor Belford, desaparecida há 19 anos.
"A ideia do documentário surgiu a partir da percepção de que os casos de pessoas desaparecidas no Rio de Janeiro são muito extensos,e que, entre esses 5.000 desaparecidos por ano em nosso estado, uma fração significativa não vai reaparecer nunca porque foi morta e teve seu corpo lançado em cemitério clandestino, incinerado e até mesmo devorado por animais", disse o fundador da ONG Rio de Paz, Antonio Carlos Costa.
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