SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Utilizando materiais improvisados como uma câmera de papelão e um drone de bambu, funciona desde 2017 a TV Quilombo. O veículo de comunicação foi criado no quilombo Rampa, localizado a 27 km da cidade de Vargem Grande, no Maranhão.
A proposta é dar visibilidade à cultura quilombola através de conteúdo audiovisual. Atualmente, a iniciativa já conta com a participação de cerca de 30 pessoas na equipe, que atua em diferentes formatos de comunicação.
Um dos idealizadores do projeto é Raimundo José, 29. Em abril deste ano, ele foi um dos 30 representantes de comunidades selecionados para participar do curso de podcast "Minha Vida Quilombola".
O programa é patrocinado pela Embaixada e Consulados dos Estados Unidos no Brasil, em parceria com Far Away Projects -organização sem fins lucrativos que apoia projetos de impacto social.
As aulas são online, duram até setembro e envolvem comunidades de 13 estados brasileiros. Raimundo já faz planos para o período após a formação. Pretende abrir plataformas digitais para começar a divulgar com mais força os seus trabalhos em áudio.
"Está sendo incrível. Muito importante aprender técnicas novas sobre gravação de áudio e poder contribuir compartilhando esses conhecimentos com mais pessoas da minha comunidade e região", diz.
Segundo ele, o programa ainda proporciona a conexão com outras comunidades quilombolas espalhadas pelo Brasil.
"Esse tipo de iniciativa é muito importante porque oportuniza intensificar as produções e possibilita que as organizações tenham um engajamento melhor nas redes sociais, além de direcionar o conteúdo."
Além do Rampa, participam representantes dos quilombos Carrasco (AL), Barranco de São Benedito (AM), Ilha da Maré (BA), Quixada (CE), Kalunga (GO), Mesquita (GO), Canelatiua (MA), Arturos (MG), Cachoeira Porteira (PA), Sussarana (PI), Pedra do Sal (RJ), Vidal Martins (SC), Porto Velho (SP) e Galvão (SP).
Entre as atividades, o curso oferece treinamento para criação de conteúdo de áudio profissional usando podcasting, formato de produção, seleção de pauta e de fonte e distribuição de mídia independente. No final, os participantes irão a Brasília para aulas de edição e finalização dos podcasts.
"A escassez de informações sobre suas comunidades no Brasil e em outros países pode ser atenuada com o incentivo à criação de podcasts de alta qualidade, para divulgar suas vozes em outras partes", afirma o porta-voz e adido de imprensa da Embaixada dos EUA no Brasil, Luke Ortega.
Segundo ele, o plano de promover um projeto relacionado com comunidades quilombolas no Brasil ocorreu porque trabalhar com comunidades sub-representadas é uma das prioridades dos Estados Unidos no governo Biden.
"O fato de ser uma mídia que precisa de pouca internet para o consumo e disseminação, baixo custo de equipamento e de produção e a possibilidade de ser desenvolvida por qualquer pessoa e em qualquer lugar do mundo foram fundamentais para a escolha do modelo", afirma.
A psicóloga Rosemary Amanda Lima Alves, 35, do quilombo urbano Barranco de São Benedito, em Manaus, pretende propagar os conhecimentos obtidos na comunidade, principalmente com os jovens e mulheres, para ajudar que a ancestralidade do local seja mantida.
Segundo ela, os encontros virtuais ocorrem duas vezes por semana, em horários diferentes para que todos possam participar. Os quilombolas têm acesso a uma plataforma com conteúdos e atividades e podem tirar dúvidas pelo WhatsApp.
"Iniciativas como essas são importantes, dando visibilidade a populações que foram marginalizadas pela história e que sofrem discriminações até hoje", diz.
"O ato de falar suas vivências traz o mesmo efeito metodológico das escrevivências [termo criado por Conceição Evaristo e que traz a junção das palavras escrever e vivência], para um novo pacto racial e de gênero."
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