SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos) divulgou nesta quarta-feira (19) nota pública na qual manifesta "extrema preocupação" com novas suspeitas de tortura do Ceará e pede às autoridades a adoção de medidas "para colocar fim a esse estado de coisas violador da dignidade da pessoa humana".

A publicação ocorre dias após a Folha de S.Paulo revelar os indícios de novas técnicas tortura encontrados por uma equipe da Defensoria Pública durante inspeção em unidade prisional de Itaitinga, na região metropolitana de Fortaleza. Entre as técnicas encontradas estão a torção de testículos e a chamada posição taturana.

Essa posição consiste em colocar o detento, escolhido aleatoriamente dentro de uma cela, de cabeça para baixo, em um ângulo de 45 graus, e obrigá-lo a sustentar o peso do corpo com a força do abdômen -sob o risco de agressão. A Justiça também apontou suspeitas de tortura na mesma unidade.

Procurada, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) disse que "considera as acusações infundadas e repudia a tentativa de ataque coordenado contra as políticas de ressocialização em larga escala da população privada de liberdade do Ceará, bem como a forte valorização que a polícia penal cearense tem recebido do Governo do Estado nos últimos anos".

A nota do CNDH lembra que, desde o início de 2019, diversos órgãos de fiscalização, entre eles o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o próprio CNDH, identificaram indícios de torturas no sistema cearense, entre elas a técnica de quebra-dedos.

"Apesar de todas as recomendações do MNPCT, CNDH e CNJ, recentemente a Defensoria Pública do Estado do Ceará identificou em suas inspeções novas técnicas de torturas contra as pessoas presas, conforme amplamente divulgado na mídia nacional", diz trecho da nota.

A imagem que ilustra a nota é fotografia da mão de um detento que teve ficou com dedo machucado em suposta sessão de tortura de quebra-dedos. Essa técnica, como a Folha revelou, foi detectada em presídios de ao menos cinco estados brasileiros e coincide com os locais de atuação de força federal.

Para o presidente do conselho, André Carneiro Leão, as graves notícias vindas do Ceará não podem ser ignoradas pelas autoridades e todos os esforços devem ser adotados para combatê-las. "Enfim, são situações que enojam efetivamente, que causam uma revolta, uma indignação e que não podem ser admitidas no estado de direito", afirmou ele à reportagem.

Sobre a manifestação do governo cearense, que aponta para uma suposta "tentativa de ataque coordenado" contra a política de ressocialização implementada no estado, Leão disse que ver nessa manifestação uma tentativa de negar fatos apontados por tantos órgãos diferentes.

"Esse me parece o grande problema: quando, simplesmente, se opta por negar, ou fechar os olhos para uma situação, uma realidade. Porque o CNDH é uma instituição que trabalha com fatos. Nós não dialogamos com aspectos subjetivos ou políticos. Não é possível é imaginar que essas instituições estejam todas elas envolvidas ou com interesses políticos nas suas manifestações", disse.

Por fim, Leão disse que, para ele, o mais importante seria o estado do Ceará demonstrar "que está cumprindo efetivamente as convenções internacionais que o Brasil faz parte e que está obedecendo e respeitando os direitos humanos de quem atrás das grades e não é praticando os atos ilícitos de tortura."

Também na tarde desta quinta (20), a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Ceará organizou uma audiência pública para debater "a crítica situação do sistema penitenciário do Ceará". Em uma de suas falas, o presidente da Comissão de Direito Penitenciário, Márcio Vitor Meyer de Albuquerque, criticou o discurso de suposto complô contra a política de ressocialização do estado.

"Eu vi algumas situações, que foram ventiladas nos jornais, de que quem está de alguma forma criticando a Administração Penitenciária estaria acobertando a organização criminosa [PCC], ou crime organizado, com queiram chamar. Eu não! E acredito que vocês todos não. Nós não admitimos esse tipo de levantamento, de acusação leviana e criminosa", afirmou ele.

De acordo com nota da OAB, a audiência tinha como pauta "questões delicadas como torturas, maus-tratos, superlotação das unidades e o respeito às prerrogativas dos advogados e advogadas".

O evento contou, entre outros participantes, com representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Penitenciário, os juízes da execução penal e as comissões de direitos humanos da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal, entre outros. "Além disso, familiares de presos também estão convidados a participar e compartilhar suas experiências e perspectivas."

Na nota enviada à reportagem, a secretaria da gestão Elmano Freitas (PT) repetiu as notas anteriores, declarando que "reafirma seu compromisso prático de valorização da pessoa humana em números transparentes e incontestáveis".

"Informa que recebe visitas regulares de instituições fiscalizadoras, como Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, além de entidades de controle social. Além das instituições fiscalizadoras, a pasta mantém uma Ouvidoria própria, com reconhecimento nacional", diz trecho da nota.

O documento cita uma série de melhorias no sistema, como a redução de mortes de presos e aumento de educação e trabalho nas unidades prisionais do estado.


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