SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) alterou uma regra para que alunos tenham a matrícula cancelada nas escolas estaduais de São Paulo se registrarem faltas por 15 dias consecutivos sem justificativa.
A resolução, assinada pelo secretário Renato Feder e publicada em 7 de julho no Diário Oficial do Estado, muda a regra anterior. Antes, a matrícula só era cancelada do sistema caso o aluno não frequentasse a escola nos primeiros 15 dias letivos. Com a nova regra, o cancelamento pode ocorrer em qualquer período do ano.
Em nota, a Secretaria da Educação disse que a resolução "tem como objetivo identificar a ausência dos alunos com mais agilidade e possibilitar providências antes que o estudante abandone a escola de vez".
A pasta afirmou que a resolução complementa a "série de ações da pasta para que o aluno ausente volte para a sala de aula". "É importante destacar que a Seduc garante que, a qualquer momento, todo aluno pode ingressar ou voltar à rede de ensino estadual", declarou.
Ainda segundo a pasta, o cancelamento da matrícula só ocorre após esgotados todos os procedimentos de busca ativa, que seriam "contato telefônico, presencial, carta e email".
"No modelo anterior, o abandono só era conhecido no final do ano letivo e o Não Comparecimento poderia ser registrado sem justificativas sobre a não frequência dos estudantes. Agora, é obrigatório que em todo o registro de "Não Comparecimento" a escola informe se fez ou não a busca ativa", disse a secretaria.
Para especialistas, a medida restringe o direito básico à educação, assegurado pela Constituição e pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases). Além de deixar estudantes em situação de vulnerabilidade ainda mais desamparados, já que, ao deixarem de constar no sistema, ficam "invisíveis" ao sistema de proteção. A resolução não diz se as escolas devem acionar o Conselho Tutelar antes de cancelar a matrícula.
Eles afirmam ainda que a mudança pode melhorar artificialmente o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), que é calculado com a combinação do desempenho dos estudantes em uma prova e as taxas de aprovação escolar.
Com os estudantes com mais chances de reprovação ou evasão fora do sistema, a rede estadual paulista tende a ter um indicador mais alto. A medida faz com que a secretaria "esconda" os alunos que seriam contabilizados como alunos que repetiram por falta, ou seja abandonaram a escola, e que fariam com que o resultado do indicador fosse menor.
A mudança na regra vale para estudantes do ensino fundamental, médio e EJA (Educação de Jovens e Adultos) de toda a rede pública de ensino do estado. Segundo a resolução, durante todo o ano poderá ser lançado o registro de NCOM (não comparecimento) aos alunos que "não obtiveram registro de frequência nos últimos 15 dias letivos consecutivos, sem justificativas, esgotados os procedimentos de busca ativa".
O texto diz ainda que a escola deve apresentar os "documentos comprobatórios das ações de Busca Ativa" no prontuário do aluno que for desligado do sistema. A resolução, no entanto, não define quais devem ser essas ações e quando pode ser considerado que elas "se esgotaram".
A nova regra também difere do que determina a LDB, que diz ser necessário o aval do Conselho Tutelar para o desligamento de um estudante quando a evasão ultrapassar 10% dos dias letivos, ou seja 20 dias. A permissão de cancelamento da matrícula após 15 dias representa apenas 7,5% do ano escolar.
Para Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP, a medida pode ser considerada ilegal, já que é dever das escolas e do sistema de ensino garantir que toda criança e adolescente, dos 4 aos 17 anos, frequentem a escola.
"É uma medida drástica e equivocada, porque a Secretaria de Educação se ausenta da sua obrigação de fazer a busca ativa dos alunos. Se esse aluno não está na escola, a obrigação de ir atrás dele não é só da unidade escolar, mas de todo o sistema", diz.
"Se as ações da escola não foram suficientes para trazer de volta o aluno, é obrigação da secretaria encontrar meios para que essa busca seja exitosa. A secretaria não pode simplesmente excluir o aluno do sistema", conclui.
O Ministério Público Estadual investiga a mudança na regra para apurar "eventual lesão ao direito educacional".
O secretário de Educação de Tarcísio, Renato Feder, desde que assumiu o cargo, tem anunciado uma série de ações sob o argumento de melhorar a frequência escolar no estado. Além de ter determinado o uso de um aplicativo para o registro da presença dos alunos, ele anunciou que a taxa de frequência será usada para o cálculo do bônus aos professores.
Ele assumiu o comando da secretaria com a promessa de que a rede estadual de São Paulo vai alcançar o maior Ideb do país. O primeiro lugar do indicador para o ensino médio é hoje ocupado pelo Paraná, onde Feder era secretário e no qual também adotou uma série de medidas para melhorar a frequência escolar, inclusive, tendo instituindo regra que permitia o afastamento de diretores de unidades com muitas faltas.
"A preocupação com a frequência escolar é importante, mas as ações devem ser para garantir a presença de fato dos estudantes na escola. Não pode ser só preocupação com o indicador de frequência", diz Salomão Ximenes, professor de políticas públicas da UFABC.
"Uma criança ou jovem deixam a escola porque estão em situação de vulnerabilidade. Ao apenas cancelar a matrícula, a secretaria deixa esse estudante em risco social."
Os especialistas lembram ainda que a taxa de aprovação escolar é um componente importante no cálculo do Ideb e é usada exatamente para evitar distorções na avaliação das redes de ensino. Além de ser usada para aferir se o direito de acesso à educação está sendo garantido.
"Com a exclusão desse aluno do sistema, o indicador não vai contabilizar que esse aluno abandonou a escola ou foi reprovado. Ou seja, pode ter um aumento artificial do indicador", diz Alavarse, que é especialista em avaliação educacional.
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