SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A transferência de dois coronéis da Polícia Militar de São Paulo, publicada na última terça (29) no Diário Oficial do Estado, agravou a crise entre o secretário da Segurança, Guilherme Derrite, e integrantes da cúpula da corporação.
De acordo com oficiais ouvidos pela reportagem, o clima é considerado tão tenso que não está descartada uma inédita debandada de nomes do coronelato, entre eles o próprio comandante-geral da PM, Cássio Araújo de Freitas.
O motivo da irritação dos oficiais não é, segundo eles, pela transferência, algo inerente da função. O problema estaria na forma como ela teria ocorrido, que classificam como desrespeitosa, e também por indicar uma possível perseguição pessoal de Derrite.
O descontentamento dos oficiais é amplificado, segundo eles, pelo perfil dos coronéis transferidos, Hudson Covolan e Marcos de Paula Barreto. Ambos são considerados por colegas como profissionais exemplares, e assim não haveria justificativa técnica para mudanças por "conveniência do serviço".
Em nota, o governo afirma que reconhece e valoriza o trabalho dos policiais e que vem realizando "movimentações de rotina" a partir de critérios técnicos.
O posto de coronel é o mais alto entre os oficiais superiores da PM. Todas as transferências de coronéis costumam ser precedidas de conversas com explicações da necessidade de eventuais trocas. Na PM de SP existem 64 coronéis na ativa, entre os cerca de 80 mil policiais militares.
Segundo oficiais, os coronéis Hudson e de Paula teriam ficado sabendo das mudanças pelo Diário Oficial. O primeiro, que comandava a região de Bauru, foi enviado para comandar região de Osasco, a 300 km de distância. De Paula, que comandava a academia do Barro Branco, foi transferido para região de Bauru.
Como comandante de um CPI (Comando de Policiamento do Interior), Hudson fazia parte do alto comando da corporação. Por isso, a forma como dizem que foi tratado é considerada inadmissível, até porque, na visão deles, coloca todos os outros oficiais como possíveis alvos.
O motivo para tal decisão da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), segundo oficiais, seriam supostas críticas feitas por esses coronéis. Ambos teriam manifestado, em reuniões internas, certa decepção com a falta de preparo de Derrite para dirigir a pasta da Segurança.
Essas críticas teriam chegado ao conhecido do secretário, que, irritado, teria determinado a transferência de ambos. O comandante-geral, coronel Cássio, teria defendido a permanência dos dois colegas, pelo bom trabalho e pela possibilidade de crise.
Para oficiais ouvidos pela reportagem, Cássio fica enfraquecido. Eles lembraram que, em março de 2020, o então comandante-geral Marcelo Vieira Salles deixou o comando da instituição descontente com a ordem do então governador João Doria de afastar os PMs (praças, em sua maioria) envolvidos na ação que terminou com nove mortes em um baile funk em Paraisópolis.
Por ser uma suposta questão pessoal do secretário, essas transferências estão sendo atribuídas pelo oficialato a Derrite, e não a Tarcísio, embora tenham sido assinadas pelo governador, que tem competência legal para transferir coronéis.
Procurado, o Governo de São Paulo não explicou se a decisão partiu de Tarcísio ou de Derrite nem quais foram os critérios para a transferência. Em nota, afirmou que "a atual gestão da Secretaria da Segurança Pública reconhece e valoriza o trabalho dos policiais paulistas".
"Desde o início do ano, uma série de promoções por mérito e movimentações de rotina foi efetivada junto às polícias Civil, Militar e Técnico-Científica do Estado. Tais medidas são planejadas e executadas a partir de critérios estritamente técnicos com o objetivo de aprimorar constantemente a atuação policial e reforçar a segurança de toda população", diz a nota.
Críticas a Derrite entre tenentes-coronéis e coronéis da PM paulista têm sido frequentes e aumentaram com a Operação Escudo, na Baixada Santista, considerada, ao menos por parte desses oficiais, um desastre para a imagem da instituição e para a política de redução da letalidade policial.
Oficiais superiores da PM têm manifestado insatisfação com Derrite desde o anúncio de que ele fora escolhido para a pasta, no final do ano passado. Primeiro porque o secretário é visto como um tenente (uma das classes mais baixas do oficialato) e, por isso, não chegou a realizar os cursos necessários para entender as funções de comando e da própria PM, como o CSP (Curso Superior de Polícia).
Segundo porque, de acordo com coronéis, Derrite nunca foi um oficial exemplar, em razão do grande número de mortes em serviço e da quantidade de punições no currículo, e eles temiam um espírito de vingança do futuro chefe.
Hudson está na Polícia Militar desde 1988. Já trabalhou por três anos na Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) e liderou a Força Tática na região do Capão Redondo, zona sul da capital.
A mudança de comando teve repercussão negativa entre a população e políticos de Bauru. Em novembro do ano passado, Hudson foi homenageado na Câmara Municipal pelo trabalho realizado.
Natural de Bauru, Hudson estava à frente do Comando de Policiamento da região desde 2021. No mês de julho deste ano, a região de Bauru registrou queda de 46% no número de homicídios dolosos (intencionais), de 27% no número de roubos em geral e de 14,7% no número de furtos em geral, na comparação com o mesmo período do ano passado.
Procurados pela reportagem, nem Hudson Covolan nem Marcos de Paula Barreto se manifestaram.
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