WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Até a semana passada, o que agitava o grupo do condado de Chester no Facebook era divulgação de eventos, como testes para entrar na orquestra jovem, fotos do pôr do sol e pedidos de indicação de times infantis de futebol americano.

Desde a última quinta (31), no entanto, há praticamente um único tema: a busca pelo brasileiro Danilo Souza Cavalcante, 34, que fugiu da prisão após ser condenado à pena perpétua pelo assassinato a facadas da ex-namorada, Deborah Brandão, na frente dos filhos.

São diversos posts públicos em que moradores manifestam medo, se atualizam sobre a rota dos helicópteros e carros policiais que fazem as buscas, brigam sobre a presença de imigrantes no país e filiação partidária -e, claro, fazem memes.

Chester, na Pensilvânia, tem cerca de 540 mil habitantes. É o condado mais rico da região, com uma renda familiar anual média de US$ 130 mil (R$ 650 mil), muito acima da cifra estadual, de US$ 87.500. É o segundo mais branco (77,1% da população se encaixa na categoria) e o segundo mais escolarizado (22,7% têm pós-graduação ou um MBA).

Até segunda, as autoridades locais haviam delimitado uma área de cerca de 4 km² em Pocopson em que acreditavam que o brasileiro estava escondido. No entanto, nesta terça, a Polícia Estadual da Pensilvânia ampliou o raio de buscas após ter recebido novas imagens de Cavalcante, captadas por uma câmera de segurança de Longwood Gardens, um jardim turístico da região.

É a quinta vez que o fugitivo é avistado. Nas imagens, ele está carregando uma mala, que a polícia acredita ter sido roubada. Duas escolas suspenderam as aulas nesta terça tremendo pela segurança dos alunos.

A operação de busca envolve centenas de policiais, helicópteros, drones e cães. No grupo no Facebook, os moradores compartilham vídeos da patrulha sobrevoando suas casas, traçam rotas dos veículos e tentam entender em que área os policiais desconfiam que Cavalcante pode estar.

Alguns relatam medo de sair de casa e temem pela segurança de familiares. As autoridades americanas descrevem o brasileiro como extremamente perigoso, e caso ele não se renda pacificamente, foi autorizado o uso de força letal.

O fato de Cavalcante ser um imigrante não passa despercebido. Muitos dos membros da comunidade usam o caso como exemplo de por que os EUA precisam "fechar a fronteira" e pedem a execução do fugitivo assim que ele for encontrado.

Os mais exaltados culpam conterrâneos por votarem no Partido Democrata, e pedem a volta de Donald Trump -o ex-presidente que prometia construir um muro na divisa com o México.

Rapidamente, a discussão evolui para acusações de racismo e leniência.

Nesta tarde, por exemplo, um homem grisalho chamado Jim Salvas postou um vídeo no grupo em que um helicóptero reproduz a mensagem em português gravada pela mãe de Cavalcante, em que ela pede ao filho que se renda.

Em resposta, um homem chamado Ronnie Peterson respondeu: "por que eles não contratam um grupo de Mariachis de uma vez".

Outros membros apontam que Cavalcante é brasileiro e que, por isso, a referência a mariachis mexicanos não faz sentido.

Em sua defesa, ele reforma o comentário: que a polícia toque, então, Legião Urbana ou Antonio Carlos "Jabim" e ofereça ao fugitivo um cartão-presente da rede de churrascarias Fogo de Chão. Ele, por sua vez, recebeu apoio de outros membros.

"Esse grupo me fez entender como linchamentos começavam", escreveu um homem chamado Jonathan Steitzer.

Já o fato de Cavalcante ter cerca de 1,52 m de altura e pesar 54 kg, segundo a polícia, é alvo de piada. Muitos se perguntam como a polícia vai ser capaz de encontrá-lo considerando o terreno densamente arborizado.

"Eu aposto que o assassino fugitivo está se escondendo na plantação de Cannabis perto de Logwood. Essas plantas são o dobro do tamanho dele", escreveu uma jovem chamada Beverly Gravina.

Há ainda uma imagem em que o rosto de Cavalcante foi substituído pelo personagem de "Onde está Wally?" e outra em que ele aparece do lado da frase "campeão de esconde-esconde 2023".

Há também muitas críticas à atuação da promotora Deborah Ryan -especialmente porque essa é a segunda vez no ano em que alguém escapa da prisão do condado. Ela vinha liderando as buscas, mas esse papel passou para a polícia estadual na última segunda.

Condenado é réu por outro homicídio no Brasil

Cavalcante foi preso em 19 de abril de 2021 na Virginia pelo assassinato da ex-namorada Deborah Brandão, então com 33 anos, um dia após o crime.

De acordo com a Promotoria, ela foi esfaqueada na frente da filha de 7 anos e do filho de 3 anos em Schuylkill, na Pensilvânia. No dia 22 de agosto, ele foi condenado à prisão perpétua por homicídio em primeiro grau.

O brasileiro responde a outra ação penal por acusação de homicídio na Justiça brasileira desde 2017, por ter matado um homem com seis tiros de arma de fogo, em Figueirópolis (TO).

O processo no Brasil, aberto em novembro de 2017, só foi retomado quando a Justiça brasileira soube da prisão nos EUA, em meados de 2021. Mas o caso segue sem desfecho até hoje. A ação penal está na Vara Especializada no Combate à Violência contra a Mulher e Crimes Dolosos contra a Vida, da Comarca de Gurupi (TO).

Ele é réu em uma acusação de homicídio duplamente qualificado. Em 5 de novembro de 2017, Cavalcante teria dado seis tiros em Válter Júnior Moreira dos Reis, que morreu no local.

De acordo com o Ministério Público, o crime ocorreu por motivo torpe, em razão de uma suposta dívida que a vítima tinha com o réu, referente ao conserto de um veículo.

Depois do crime, ele fugiu e não foi mais visto pelas autoridades brasileiras. O defensor público Magnus Kelly Lourenço de Medeiros, designado para atuar no caso, disse à Folha nesta sexta (1º) que nunca conseguiu contato com Cavalcante após o crime de 2017.

Segundo ele, embora o processo tenha sido retomado em 2021, as videoconferências que seriam realizadas com apoio do presídio nos EUA nunca aconteceram.


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