ROCA SALES, RS (FOLHAPRESS) - Caminhando em meio aos escombros da casa em que morou por 25 anos, Cláudio José Schaefer se pergunta: "Quando acontece um incêndio, o desabamento de uma casa, o município todo se une e aquela família se reergue. Mas e quando é a cidade inteira? O que a gente faz?"

A população de Roca Sales (RS), no Vale do Taquari, parece ter essa pergunta estampada no rosto: "o que a gente faz?". O município é um dos mais afetados pelas fortes chuvas que atingem o estado desde segunda-feira (4).

As pessoas da cidade caminham sem saber o que fazer entre postes caídos, casas e carros destruídos e cenas algo surreais, como cadeiras, roupas e eletrodomésticos pendurados em árvores e cabos de luz.

As residências que ficaram em pé acumulam cada uma, à frente, uma pilha de escombros e mobília comprometida pela invasão da água.

Há um misto de incredulidade com o cenário e alívio por encontrar um vizinho com vida, já que a cidade está praticamente incomunicável, sem energia ou sinal de telefonia e internet.

Alguns circulam com o carro cheio de sanduíches e garrafas de água mineral, oferecendo ajuda na rua. Jacir Bazanello, 74, recebe um dos lanches enquanto avalia a casa destruída na avenida 31 de Março, no centro da cidade.

"Caiu um poste de 7 metros em cima dela. Com R$ 300 mil eu não construo outra igual. Quem vai me pagar?", questiona.

Marcos Saldanha, 42, protagoniza mais uma dessas cenas surreais. Sobre os destroços da casa em que morava com os pais, ele prepara um churrasco, em um tonel de ferro, com a carne que certamente estragaria com a falta de refrigeração.

Ele então aponta para uma árvore de uns 6 metros onde há um colchão e roupas espetadas nos galhos. "Eu passei a noite ali com o mano. Fui resgatado às 7h da manhã pelos bombeiros", conta.

Dos fundos de casa, os irmãos Marcos e Dionatan Saldanha, 32, assistiram ao rio Taquari subir lentamente um metro em quase 3 horas, até que em questão se minutos o nível da água subiu 3 metros e encobriu a casa.

Eles salvaram os pais com um "caíco" --nome pelo qual os ribeirinhos do Taquari chamam pequenos barcos--, mas não conseguiram vencer a correnteza. O barco virou e jogou os irmãos nos galhos da árvore.

Ali, passaram a noite assistindo ao rio subir mais um metro, em pânico, enquanto casas destruídas desciam rua abaixo. Sobre os telhados de imóveis vizinhos, no escuro, viam mais gente em desespero sofrendo com o frio e a tragédia a olhos vistos.

"Depois de uma enchente como essa, a enchente não sai da gente. Um trovão e a gente vai entrar em pânico", afirma Schaefer.

Até as 18h40 desta quarta o governo do RS havia confirmado 36 mortes pelas chuvas no estado, 7 delas em Roca Sales. Por volta das 16h, o governador Eduardo Leite (PSDB) e equipe faziam parte das pessoas que caminhavam atônitas pela cidade.

Outras cidades do Vale do Taquari foram atingidas pela tragédia, mas os números ainda estão sendo contabilizados. Em Muçum, para onde não há acesso por via terrestre, já se sabe que há ao menos 15 mortos.

DESTRUIÇÃO EM COLINAS (RS)

A devastação também é visível no município de Colinas, com tratores revirados e o asfalto da RS-129 como se em erupção. Árvores gigantes impedem a chegada a Roca Sales pela via, restando um desvio por estrada de chão, hoje revirada em lama.

Às margens da RS-129, ainda em Colinas, ficava a loja de artesanato Colibri, que só pode ser reconhecida por um Papai Noel ou outro, cheios de barro. O estoque de produtos para o Natal se foi, assim como o restante da loja.

Os donos, Pedro Eckel, 65, e Roseli, 62, se salvaram fazendo um buraco no teto da casa ao lado do estabelecimento para aguardar socorro enquanto o rio Taquari destroçava a loja e entrava pelas janelas de casa.

Ao chegar pela manhã para ajudar na limpeza, a filha Gisele, 43, encontrou o pai escorado na parede em estado de choque. Depois foi às lágrimas, em desespero.

Com a lama já acima da cintura e muito trabalho pela frente, Gisele vive a mesma confusão de sentimentos de outros gaúchos. Devastada, atônita, mas ainda assim feliz por encontrar os pais vivos.

Também houve alteração no número de desabrigados e de desalojados, que agora são 2319 e 3575, respectivamente.

São 79 municípios no estado com registros de destruição causada pelas chuvas.

Segundo a Defesa Civil do Rio Grande do Sul, 79 municípios foram afetados pelas chuvas. Há no estado 2.319 desabrigados e 3.575 desalojados.


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