DUBAI, EMIRADOS ÁRABES UNIDOS (FOLHAPRESS) - O Brasil tenta emplacar na COP28, conferência da ONU sobre mudanças climáticas, a decisão de zerar o desmatamento ilegal no mundo até 2030. A meta já compõe o compromisso brasileiro no Acordo de Paris, mas o Itamaraty mantinha posição histórica contrária a intervenções internacionais sobre a conservação do território.

A proposta consta no rascunho do texto em negociação, divulgado nesta sexta-feira (8) pela presidência da COP28, que acontece em Dubai até o próximo dia 12. Há três opções de texto para o compromisso.

A primeira coloca 2030 como prazo para combater e reverter o desmatamento, citando também a necessidade de alinhamento com o novo marco global de biodiversidade, aprovado pelos países no final do ano passado em um processo paralelo às negociações climáticas, a Convenção de Diversidade Biológica da ONU.

A segunda opção vai direto ao ponto dos recursos financeiros, enfatizando sua importância para a implementação de medidas como o combate ao desmatamento, enquanto a terceira linguagem proposta pelos países é ainda mais genérica e se limita a "convocar a comunidade internacional a apoiar a restauração de ecossistemas".

A diversidade de alternativas reflete a falta de consenso em torno do tema. Segundo observadores das negociações, o Brasil tem encontrado resistência à proposta entre os vizinhos amazônicos e outros países detentores de grandes florestas, que, assim como o Brasil no passado, resistem a aderir a um compromisso que gerará cobranças internacionais sobre a gestão do território nacional.

Em agosto, em Belém, ao conduzir a Cúpula da Amazônia, o Brasil ensaiou a proposta com os países florestais, mas não teve sucesso e os dois compromissos assinados durante o evento -um com os vizinhos amazônicos e o outro com os gigantes florestais do Congo, da República do Congo e da Indonésia- evitaram se comprometer com o desmatamento zero, citando de forma mais vaga o compromisso com o combate ao desmate e a conservação dos ecossistemas.

A reportagem apurou que a virada de posicionamento acontece por conta da nova conjuntura criada pelo governo Lula (PT), que mudou o cenário climático para o país.

Historicamente, o Itamaraty vinha defendendo em conferências ambientais que uma determinação internacional sobre a gestão dos territórios feriria a soberania nacional. A conservação dos ecossistemas naturais, portanto, deveria ser decidida por cada país.

Nas conferências do clima, a diplomacia brasileira ficava confortável em apontar o setor energético como o principal causador da crise do clima, já que, diferentemente da maior parte do mundo, o Brasil tem um matriz energética altamente renovável e pouco dependente de combustíveis fósseis.

O Itamaraty repetiu nos últimos 30 anos que o problema do clima é energia, não florestas. Sob Lula, o jogo virou.

Lula passou a usar o mote do desmatamento zero dentro e fora de casa, como forma de conquistar apoios desde a campanha eleitoral, marcando oposição ao governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL), justamente em um dos temas que mais lhe custou escândalos internacionais.

O compromisso também buscou reagir aos movimentos da União Europeia, em um contexto de negociação do acordo comercial UE-Mercosul, da legislação contra importação de desmatamento e também à taxa de carbono na fronteira. O recado que Lula tentou passar aos países ricos é que eles não precisariam se valer de medidas mais duras, pois o Brasil já garantiria a conservação da amazônia, maior floresta tropical do mundo.

Por outro lado, o Brasil de Lula passou a apostar na abertura de novas fontes de exploração de petróleo, como na Foz do Amazonas, criando uma nova frente de disputa com ambientalistas e cientistas dentro e fora do país.

Embora ainda não seja parte do problema, por não depender dos combustíveis fósseis, o Brasil propõe nas negociações da COP28 que o abandono da matriz fóssil seja iniciada pelos países desenvolvidos, de modo que os países em desenvolvimento possam apostar nas fontes fósseis por um período maior.

O calendário diferenciado é sinérgico aos planos do governo atual de estender a exploração petrolífera, de modo que o país esteja entre os últimos da fila a abandonar as fontes fósseis -embora já seja um dos primeiros da fila das renováveis.


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